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quinta-feira, 12 de maio de 2011

FUNDAMENTOS DA MAÇONARIA - SEUS MITOS E LENDAS

Ir∴ Joaquim Roberto Pinto Cortez - SP
Falar a respeito do que podemos conceituar como Fundamentos da Maçonaria, se torna tremendamente difícil. Em primeiro lugar porque a conceituação daquilo que seja fundamento pode variar de pessoa para pessoa e, em segundo lugar, o assunto é tão amplo e complexo que poderíamos ficar falando dias e dias a respeito, sem conseguirmos esgotar o assunto e sem chegarmos a um acordo total com a platéia que nos escuta.

Em 2.001, foi lançado através da Editora Madras, um livro de minha autoria (2ª Edição agora em 2004) que tem como título "Fundamentos da Maçonaria". Ali são englobados diversos temas que em determinadas circunstâncias podem ser encarados com fundamentais para o entendimento da Maçonaria e, em especial, da Maçonaria brasileira.

Se quisermos entender alguma coisa do que acontece hoje e do que já aconteceu em relação à nossa Maçonaria, teremos que, obrigatoriamente, fazer um estudo histórico do desenvolvimento da Arte Real no Brasil. É de fundamental importância que conheçamos os primórdios da Maçonaria no Brasil e o seu desenvolvimento até chegar aos nossos dias, passando por inúmeras crises. Este desenvolvimento, em rápidas pinceladas é tratado neste livro ao lado de outros temas históricos, mais bem desenvolvidos, como a "Proclamação da Independência", os "Manifestos de Agosto", o "20 de Agosto" e a "Proclamação da República".

Ao lado disto, outros temas que consideramos fundamentais para a Maçonaria, como o "Segredo e o Silêncio", os "Símbolos e Alegorias", a "Iniciação", "Ritos e Rituais", são colocados lado a lado com outras questões importantes e controversas ligadas à nossa simbologia e mesmo uma questão destinada à controvérsia relativa à presença da Mulher em nossas Lojas. Para termos algumas amenidades, são tratados temas importantes para nós, como o Sol, a Lua e o Calendário, além de dois ensaios biográficos a respeito de figuras muito pouco tratadas dentro de nossa bibliografia: o Barão do Rio Branco e Castro Alves. Na verdade, isto tudo pode formar uma primeira base para chegarmos a um melhor entendimento daquilo que conceituamos ser a Maçonaria.

Por outro lado, temos diversos outros problemas que nos são trazidos por uma série de inverdades que durante muito e muito tempo vem sendo impingida à Maçonaria. A criação de lendas a respeito dos mais diversos assuntos, tem sido um prato cheio para charlatões e mistificadores.

O estudo da Maçonaria, especialmente em sua parte histórica, sempre tem deixado muito a desejar. Entre todos aqueles que tratam da Maçonaria, podemos reconhecer, basicamente, quatro tipos altamente perniciosos: os detratores, os bajuladores, os mistificadores e os pseudoconhecedores. É muito difícil dizer qual destes tipos de comportamento tem causado mais mal para os estudos e conhecimentos sobre a Nobre Arte.

Detratores seriam aqueles que nada conhecem de nossas atividades ou de nossos objetivos e que acabam criando um tipo de literatura à parte: a Antimaçonaria. Especialmente a partir do Século XVII, um enorme conjunto de inimigos gratuitos, passou a executar ataques, cercados de maldades e perfídias, contra a Maçonaria, escrevendo coisas absurdas, tais como, pacto com o demônio, missas negras e outras tantas assemelhadas. As coisas chegaram tão longe que a própria Igreja Católica passou a condenar a Maçonaria. A primeira condenação é devida ao Papa Clemente XII, na Bula denominada "In Eminenti", de 1.738. Não vamos entrar em detalhes quanto às posições da Antimaçonaria ou da Igreja Católica, pois iríamos fugir inteiramente dos nossos objetivos.

Passando ao grupo dos bajuladores, podemos afirmar que sua ótica é voltada apenas em um sentido. Tudo aquilo que falam ou escrevem, visa unicamente a engrandecer a Sublime Ordem, criando, na maior parte das vezes, inverdades e mitos, sobre coisas das quais nossa Instituição nunca participou. Vamos lembrar o caso do jesuíta Agustín Barruel que em seu livro "Memorial para Servir à História do Jacobinismo", datado de 1.797, criou a farsa de que a Revolução Francesa foi tramada totalmente pela Maçonaria.

A partir daí, apesar das inúmeras refutações, o fato foi sendo agregado à Maçonaria, especialmente nos Séculos XVIII e XIX, chegando até a nossa época. Não é muito incomum ouvirmos que o lema - Liberdade – Fraternidade – Igualdade - foi criado pela Maçonaria para servir à Revolução Francesa. Na verdade, o belíssimo lema revolucionário, foi incorporado à Maçonaria Francesa muito depois.

Os mistificadores seriam aqueles que simplesmente inventam alguns fatos, quase sempre de difícil comprovação, colocando-os como verdades absolutas. São fatos que sempre tendem a engrandecer a Ordem e aos personagens mostrados. A finalidade dos mistificadores é sempre obter lucro através de suas invenções. Dentro da Maçonaria estrangeira, tivemos um caso impar, como o foi aquele do pseudoconde Cagliostro, que chegou a criar um manual de Maçonaria Egípcia. Dotado de grande poder de sedução, atraiu inúmeras pessoas da sociedade parisiense, causando um extenso mal à Maçonaria, no período final do Século XVIII. Dentre os brasileiros, também existiram mistificadores, como aqueles que criaram a lenda de Tiradentes – Maçom. Até hoje, não existe a menor prova documentando o fato de que Tiradentes tenha sido um Iniciado.

Por fim, temos os pseudoconhecedores. Estes se cercam de uma aura de grande saber e passam a desfiar enorme verborragia em discursos tão ocos quanto extensos, naquilo que pretendem ser conferências. Albert Lantoine, escritor francês, já dizia que estes conferencistas de pequena cultura, muito pedantismo e
extremamente enfadonhos, eram o grande flagelo das Lojas francesas. Entre nós, o mal também existe e não é muito menor.

A culpa, porém, cabe as Lojas. Inúmeras vezes, indivíduos que mal-e-mal freqüentam nossas Lojas, aparecem em dias festivos e ficam a desfilar, por grandes espaços de tempo, palavras inócuas, repetitivas, muitas vezes a guisa de conselhos para os demais Irmãos.

Acontece também, que muitas Lojas, convidam os chamados medalhões, para realizarem palestras em datas especais e sobre assuntos que quase nunca são de seu conhecimento profundo. Imaginemos o caso de um professor de Português, falando sobre Tiradentes. Provavelmente, iremos ouvir, mais uma vez, toda a farsa criada em torno da figura de nosso Alferes. Nada aqui contra os professores de Português que, na maioria das vezes, podem produzir palestras ótimas, pois levam a vantagem da escrita e da oratória! Nós não podemos compactuar com a figura do medalhão, no sentido figurado e depreciativo da palavra!

É comum, também, que estes chamados medalhões, sejam pessoas que fazem da Maçonaria apenas um suporte para suas vaidades pessoais, pouco se interessando pelas Lojas ou pelos destinos da Ordem. No dizer do Ir∴Castellani, são os eternos pavões que enchem nossos quadros.

A partir daqui, podemos entender que a maior parte daquilo que se escreve ou que se fala em relação à nossa Maçonaria, está eivada de falsidades, de invencionices e de ufanismo. Este fato é a verdadeira razão para o título deste ensaio. Por volta de 1.930, foram catalogados cerca de 60.000 títulos publicados em relação à Maçonaria. À proporção em que o tempo foi passando, a quantidade de obras deve ter crescido, em uma progressão aritmética, isto para não exagerarmos. Se conseguíssemos chegar, nos dias atuais, à totalidade dos títulos publicados no Mundo todo, certamente atingiríamos uma cifra acima de um milhão de títulos.

Diante deste fato, que é incontestável, como falarmos em segredo maçônico ou que a Maçonaria é uma sociedade secreta? Tudo o que fazemos ou pensamos, nossos princípios, nossas formas de encarar a vida ou de olharmos o Mundo, já foi, um dia, escrito e publicado! A conclusão lógica é a de que, hoje, a Maçonaria já caiu no domínio público! Hoje somos somente uma sociedade discreta! Apenas uma coisa pode manter a solidez e a integridade de nossa Ordem: ninguém pode chegar a ela sem ser escolhido, sem passar por um processo de seleção e sem ser Iniciado! Ou como dizemos nós: ser livre e de bons princípios!

Apesar destes fatos concretos e verdadeiros, existe uma pergunta que não quer se calar: de onde saem tantos inimigos e tantos detratores? A resposta cabe a cada um. Eu tenho a minha e cada um de nós deve buscar a sua própria verdade. A única coisa que posso incluir aqui, é o fato de que a pretensão de domínio sobre os diversos grupos humanos, nos trouxe ferrenhos inimigos. A nossa contínua busca pela Verdade e o constante combate às tiranias, sempre desagradou aqueles que tinham sede pelo poder absoluto.

Voltando à quantidade de títulos publicados, vamos fazer uma pergunta muito simples: quantas dessas obras são baseadas em fontes sérias ou então, quantas seriam fidedignas e mereceriam ser lidas? Trazendo a pergunta, para a situação brasileira, quantos autores realmente sérios, pesquisadores, honestos e verdadeiros teríamos? A esta última pergunta, sem muito pensar, eu responderia de primeira: apenas algumas dezenas!

A procura das origens da Maçonaria levou-nos a um emaranhado de opiniões absolutamente esdrúxulas e sempre pretendendo dar à nossa Ordem uma grande antiguidade. Sem contar os inúmeros autores que consideram a origem da Maçonaria "perdida na noite dos tempos", isto como se o tempo tivesse dia e noite, vamos encontrar uma infinidade de opiniões diferentes e disparatadas, inclusive algumas colocando uma Loja Maçônica no Paraíso Terrestre. Nesse caso, como já caricaturou a Revista Engenho e Arte, Adão seria o Venerável Mestre, Eva, o Primeiro Vigilante e a Serpente, o 2º Vigilante. Esta situação foi admiravelmente bem caracterizada pelo Ir∴ Castellani, em sua "Loja Paraíso" publicada pela Revista "A Trolha" de N° 90. Imaginem: o Orador da Loja era o Papagaio! As colocações ali feitas são, realmente, impagáveis e dignas do gênio do Ir∴ Castellani.

Trazemos aqui os dizeres do Dr. George Oliver, em meados do Século XIX, constante de sua obra "Antiguidade da Franco-Maçonaria": "A antiga tradição maçônica afirma – e eu concordo inteiramente com esta opinião – que a nossa sociedade existia antes da criação da terra, nos diversos sistemas solares" (sic).

Eu gostaria de poder dormir com um barulho destes. Hoje, com toda a tecnologia moderna, o homem busca a existência de vida e outros sistemas planetários nos mais profundos confins do Universo e ainda não conseguiu respostas definitivas. Então, como que, em meados do Século XIX, se poderia falar em outros sistemas solares? Só mesmo na farta imaginação de mistificadores!

Se formos procurar entre todos aqueles que já foram considerados Grão-Mestres de nossa Ordem, vamos encontrar figuras como o Rei Arthur da Távola Redonda, o Rei Ricardo Coração de Leão da época das Cruzadas, Alexandre Magno, o grande conquistador, os imperadores romanos César e Augusto, os profetas Moisés e Noé. Imaginem vocês: Moisés, com o malhete na mão e transmitindo esta ordem ao Mestre de Cerimônias: Ir∴ Mestre de Cerimônias, convidai as águas do Mar Vermelho a se separarem para abrir uma passagem para nós! Ou então, Noé pregando os pregos de sua arca com o malhete!

Para não irmos muito mais longe, até Jesus Cristo teria sido um Grão-Mestre. Durante o seu longo e obscuro período de vida, teria estado entre os Essênios e aonde viera a ser iniciado nos mistérios da Maçonaria, vindo a ser, posteriormente, seu Grão-Mestre. Nós concluímos: então a "Santa Ceia" foi uma Loja de Mesa! Aliás, o que mais ela poderia ter sido? Ainda mais, segundo o "Código da Vinci", de Dan Brown, quem está sentada à mão direita do Senhor, é Maria Madalena. Ora, se a "Santa Ceia" foi uma Loja de Mesa, então, desde aquela época já existiam mulheres iniciadas em nossos Sublimes Mistérios! Pergunta-se: então por que a atual proibição da Iniciação de pessoas do sexo feminino mantida pelas nossas Obediências? Pobre de nossa Ordem, com tantas baboseiras juntas!

Apenas para sermos fiéis à verdade, devemos lembrar que o primeiro documento que traz a expressão Franco-Maçonaria está datado de, aproximadamente, 1.376.

Para encerrar, vamos trazer um texto do Ir∴ Alec Mellor, um dos mais respeitados autores da moderna Maçonaria francesa: "Muitos séculos mais tarde, foram erguidas em direção ao céu, as catedrais, esses gigantescos atos de fé, de acordo com a expressão de Michelet. Havia arquitetos, talhadores e colocadores de pedras, para dar à "Arte Real" o seu destino mais elevado: a glória de Deus, o Grande Arquiteto do Universo. Esses homens, organizados em corporações e confrarias, conforme a hierarquia social da Idade Média – Mestres, Companheiros e Aprendizes – foram os primeiros Franco-Maçons".

Como sempre nós afirmamos, as origens da Maçonaria estão junto às Corporações de Ofício que se desenvolveram durante a Idade Média. Querermos buscar nossas origens muito além disso, não passa de um mero exercício fantasioso. Espero que nós possamos colocar um ponto final em todas estas fábulas e lendas que tiveram suas origens, principalmente, durante os Séculos XVIII e XIX.

Meus Irmãos, o nosso objetivo foi o de trazer alguma luz sobre aspectos fundamentais da Maçonaria e mostrar, por outro lado um sem numero de absurdos e fatos lendários que foram a ela incorporados no decorrer dos tempos. Jamais pretenderíamos criar qualquer polêmica em torno dos assuntos aqui tratados, pois todos eles estão colocados sob o meu enfoque, mas se conseguirmos cumprir uma pequena parcela deste grande objetivo, já nos damos por satisfeitos.

Por fim, gostaria de agradecer ao Venerável Mestre pela oportunidade que me deu hoje, para estar aqui falando para vocês e agradecer, de modo especial, toda a paciência dos Irmãos que se dispuseram a me ouvir.

Fonte: JBNews - Informativo nº 257 - 12.05.2011

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