Páginas
▼
quarta-feira, 31 de maio de 2017
HERANÇA EDUCACIONAL ILUMINISTA
HERANÇA EDUCACIONAL ILUMINISTA
C. E. Boller
Foram significativas as mudanças
que se manifestaram na Europa durante o século XVIII, e entre estas surgiu a
Maçonaria Especulativa (1717), como parte ativa do processo de gradativa migração
do poder para a burguesia, concentrado até então na nobreza e no clero. O
Teocentrismo Medieval, Deus como centro de tudo, há muito instigava ao
lançamento de idéias que fortaleciam o poder do cidadão. Aos poucos o poder
absoluto sobre o cidadão foi desaparecendo e definiram-se os contornos da
Democracia. Na época, por herança de práticas e costumes medievais, os nobres
viviam à custa dos esforços de outros cidadãos da sociedade, o que prejudicou o
nascimento da indústria e dificultava o livre comércio.
Com a invenção e desenvolvimento
da máquina a vapor entre 1765 e 1790, por James Watt (1736-1819), se estabelece
o início da Revolução Industrial, marca do fim do poder de imperadores e papas,
e nascimento do poder do povo. Os burgueses, na Revolução Francesa (1789-1799),
usaram de palavras cunhadas por Rousseau (1712-1778) que estabeleceram
princípios de liberdade, igualdade e fraternidade através das luzes, divisa
usada até hoje pela Maçonaria. Onde a Luz dos iluministas significava o poder
da razão humana de interpretar e reorganizar o Universo. O Movimento Iluminista
visava inicialmente à liberdade de pesquisa científica, ação que através de
Rousseau estendeu-se depois para a educação natural com ênfase no
condicionamento moral e cívico.
O Século das Luzes teve inúmeros
mentores, cuja ampla maioria concordava que, em resumo, apenas a educação
poderia proporcionar os meios para livrar os homens das garras do poder
absoluto que embotava o desenvolvimento. Qualquer poder estabelecido sabe, e a
Maçonaria promove, que um povo instruído e educado é mais difícil de conduzir
com dogmas e crendices, mas é mais feliz porque assume o controle da sua
convivência pacífica na sociedade.
O Liberalismo foi outra forte
movimentação da burguesia. Atuando na economia, François Quesnay (1694-1774) e
Adam Smith (1723-1790) representam as aspirações do cidadão em gerenciar seus
próprios negócios sem a interferência do Estado. Defendia-se a economia
perseguindo caminhos ditados por leis naturais, onde a figura de um Estado intervencionista
não existe. Na política, os mesmos ideais liberais lutavam de todas as formas
contra o absolutismo. Na moral buscavam-se formas laicas de tornar naturais as
ações do comportamento humano.
Por conta de abusos clericais e
da inquisição, que durou mais de seiscentos anos, de 1183 até 1821, o
Iluminismo rejeitava a adesão à religião. Principalmente às filosofias
religiosas povoadas de fantasias e alegorias ilógicas e impostas como verdades,
que pelo aspecto verossímil são colocadas como fatos verdadeiros ao invés de
declaradas de origem ficcional, apenas para fins de ilustração de verdades e
filosofias.
Os iluministas combatiam os
dogmas que em religião estabelecem invenções forçadas, inverossímeis,
determinadas por decreto pela autoridade religiosa como verdade divina revelada
e que o adepto tem por obrigação acatar; são imutáveis; verdades absolutas que
sequer permitem discussão, nem mesmo pensar em contestação; imposição que
determina como o adepto deve pensar e até sentir. Foi contra as religiões que
impõem dogmas e fantasias, que os iluministas se rebelaram; não eram ateus,
muito ao contrário! - Isto, mesmo hoje, não passa de acusação leviana, falsa e
insidiosa de parte dos detratores do Iluminismo. Defendiam o aporte de uma
religião natural, com orientação mais racional de fé, ou crença naquilo que não
é visto e ser apenas sentido ou intuído. Bastava-lhes a fé num princípio
criador - semelhante ao que era percebido pelo pensamento lógico do homem da
natureza, o qual percebia a impossibilidade de sua existência ser obra do
acaso; para o qual é aceitável a existência de uma mente criadora lógica e
orientadora da exuberante e diversificada natureza que o cercava e servia; e com a qual vivia em
dependência. Hoje se reconhece a simbiose evolutiva como obra criativa, onde a
criação é resultado da cooperação e co-evolução das células em processos
evolutivos cada vez mais intrincados e complexos orientados por leis definidas
por uma mente orientadora, conceito ao qual o maçom denomina Grande Arquiteto
do Universo.
O Iluminismo influenciou o
Deísmo, doutrina que considera a razão como a única maneira de assegurar a
existência de Deus. Principalmente por isto, os detratores do Iluminismo
acusaram o movimento de introdutor do ateísmo na sociedade moderna, entretanto,
aquele movimento defendia a religião natural, sem dogmas e fanatismo. Para o
iluminista, Deus é o Primeiro Motor, o Supremo Criador. Desta magnífica idéia a
Maçonaria, que não é religião, herdou o conceito Grande Arquiteto do Universo,
o que possibilita a reunião de diversas linhas filosóficas e religiosas num
mesmo foro de debate, que de forma proativa discute os problemas da sociedade e
do homem; ato impossível para outras instituições, mormente religiões que nunca
se entendem e provavelmente nunca chegarão a acordos fraternos na solução de
qualquer problema devido ao ódio que nutrem entre si e aos que não concordam
com seus dogmas.
Na prática maçônica, as proibições
de discussões religiosas nada têm de incentivo ao ateísmo, mas têm por
finalidade afastar o maçom de discussões vazias dentro do pântano do
fundamentalismo religioso e o conduzir para uma espiritualidade natural,
respeitando crenças e a religião de seus irmãos, independente de qual seja. O
ateu não é recebido pela Ordem Maçônica; para entrar é exigida crença num
Princípio Criador. Para o maçom a espiritualidade é parte do corpo, é sentida
como a plenitude da mente e do corpo; mente e corpo vivos, formando uma
unidade. Os momentos de consciência espiritual são observados como unidade, uma
percepção de pertencer ao Universo como um todo. A Loja estabelecida é
representação deste Universo, o útero da criação, de onde o homem é parte
integrante do todo. Quando o maçom contempla a Loja como representação do
Universo, percebe que não está lançado em meio ao caos. "Ordo ab
Caos", ordem no caos, é sua divisa e inspiração de que é parte de um
projeto maior, de uma ordem mais elevada, parte integrante de uma imensa
sinfonia da vida conduzida pelo Grande Geômetra, o Maestro da Criação e Grande
Arquiteto do Universo. A sua projeção de vida futura é construída no fato de
que o seu corpo nunca morrerá e remanescerá vivo, mesmo depois que seu corpo se
desfizer em seus elementos moleculares a vida continua. E não apenas o sopro da
vida, que é comum a todos os seres viventes, continua vivo, mas também os
princípios da organização vital dos seres viventes da biosfera. É esta
consciência de ser parte do Universo, de ser esta a sua casa, é desta sensação
de pertencer, de ser parte do todo que desperta no maçom o mais respeitoso e
profundo sentido para a vida.
Quando na Maçonaria a Bíblia
Judaico-cristã é utilizada na construção de parábolas e alegorias, na
representação de pensamentos e ideias de forma figurada, os textos são
utilizados apenas como referência para a criação de estórias. As alegorias
copiadas e depois adaptadas são pura ficção! Verossimilhança que serve apenas
de suporte para a criação de parábolas que auxiliam na educação natural; esta
utilização é deixada bem clara para todos; é a educação da Maçonaria voltada
para a liberdade; educação natural criada por Rousseau (1712-1778) e
complementada por Kant (1724-1804). Por outro lado, a mesma Bíblia é utilizada
nas atividades litúrgicas das lojas cristãs como Livro da Lei, a mais alta e
sagrada representação do grupo, sobre a qual se fazem juramentos e promessas, e
da qual se extraem pensamentos e sabedoria; o maçom cristão é constantemente
instigado a usá-la como fonte de inspiração no trabalho na pedra; na absoluta
maioria dos ritos, nenhuma sessão maçônica inicia sem que um trecho da mesma
seja lido no momento mais solene de abertura ritualística dos trabalhos.
A liturgia e instrução maçônica
constam de alegorias definidas em todos os aspectos como invenções,
historinhas, fantasias, de uso puramente pedagógico e com o único objetivo de
construir novas idéias pelos eternos ciclos de construção do pensamento. Estes
ciclos, que Hegel (1770-1893) definiu como Contradição Dialética, constituída
de: Tese, Antítese e Síntese, é base do desenvolvimento de todo o conhecimento
humano: Tese é a afirmação; Antítese a negação ou complementação da Tese; Síntese a
superação da contradição; é quando surge uma nova e inusitada idéia, diferente
da primeira e da segunda. Então se inicia um novo ciclo de Tese, Antítese e
Síntese. E o processo não tem fim. É o que ocorre nos debates da Maçonaria
aonde, através da educação natural, se constroem templos, templos vivos e
livres.
Estes são alguns dos aspectos do
movimento Iluminista que influenciaram a Maçonaria quando de sua fundação como
instituição especulativa. Mesmo bebendo de inúmeras outras fontes de inspiração
simbólica e alegórica foi esta a origem de que a Ordem Maçônica se utilizou para
promover a volta do homem natural perdido desde Atenas, Grécia antiga,
reportado por Platão em "A República". Na Maçonaria o homem moderno
tem a oportunidade de recuperar o que perdeu em virtude do desmonte da escola
hodierna, colocar os pés no chão, trabalhar um templo vivo, dentro de um templo
material, edificado pela Maçonaria praticamente só para a sublime finalidade do
homem se auto-construir. Mas é dentro do grande templo da sociedade, um templo
vivo feito por homens naturais que cada artífice trabalha na pedra, e com a
sabedoria da razão, a força da vontade, ele constrói a sua beleza interior para
honra e à glória do Grande Arquiteto do Universo!
Bibliografia:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda,
História da Educação e da Pedagogia, Geral e Brasil, ISBN 85-16-05020-3, 3a
edição, Editora Moderna Ltda., 384 páginas, São Paulo, 2006.
CAPRA, Fritjof, A Teia da Vida,
Uma Nova Compreensão Científica dos Sistemas Vivos, título original: The Web of
Life, a New Scientific Understandding Ofliving Systems, tradução: Newton
Roberval Eichemberg, ISBN 85-316-0556-3, 1a edição, Editora Pensamento Cultrix
Ltda., 256 páginas, São Paulo, 1996.
CAPRA, Fritjof, As Conexões
Ocultas, Ciência para a Vida Sustentável, título original: The Hidden
Connections, tradução: Marcelo Brandão Cipolla, 13a edição, Editora Pensamento
Cultrix Ltda., 296 páginas, São Paulo, 2002.
ROHDEN, Humberto, Educação do
Homem Integral, 1a edição, Martin Claret, 140 páginas, São Paulo, 2007.
Biografias:
Adam Smith, economista, filósofo
e político de nacionalidade escocesa. Nasceu em Kirkcaldy, Escócia em 5 de
junho de 1723. Faleceu em Edimburgo, em 17 de junho de 1790, com 67 anos de
idade. Considerado o fundador da economia liberal clássica.
François Quesnay, economista de
nacionalidade francesa. Nasceu em 4 de junho de 1694. Faleceu, em 1774, com 79
anos de idade.
Fritjof Capra, autor, físico e
teórico de sistemas. Nasceu em 1 de fevereiro de 1939, com 69 anos de idade.
Hegel ou Georg Wilhelm Friedrich
Hegel, filósofo de nacionalidade alemã. Nasceu em Stuttgart em 27 de agosto de 1770. Faleceu em Berlim, em 14
de novembro de 1831, com 61 anos de idade. Um dos criadores do idealismo.
Humberto Rohden, autor e
professor de nacionalidade brasileira. Autor de: O Processo de Sindicância.
James Watt, engenheiro e inventor
de nacionalidade escocesa. Também conhecido por Jacobo Watt. Nasceu em
Greenock, Escócia em 19 de janeiro de 1736. Faleceu em Heathfield, Inglaterra,
em 25 de agosto de 1819, com 83 anos de idade. Inventor do primeiro motor a
vapor.
Kant ou Immanuel Kant,
conferencista, filósofo, maçom, professor e teólogo de nacionalidade alemã.
Nasceu em Königsberg em 22 de abril de 1724. Faleceu em Königsberg, em 12 de
fevereiro de 1804, com 79 anos de idade. Geralmente considerado como o último grande
filósofo dos princípios da era moderna, indiscutivelmente um dos seus
pensadores mais influentes.
Maria Lúcia de Arruda Aranha,
autora e professora de nacionalidade brasileira. Licenciada em filosofia pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Platão ou Platão de Atenas,
filósofo grego. Também conhecido por Aristócles Platão de Atenas. Nasceu em
Atenas em 428 a. C. Faleceu em Atenas, em 347 a. C. Considerado um dos mais
importantes filósofos de todos os tempos.
Rousseau ou Jean-Jacques Rousseau,
ensaísta, escritor, filósofo, pedagogo e sociólogo de nacionalidade francesa.
Nasceu em Genebra, Suíça em 28 de junho de 1712. Faleceu, em 2 de julho de
1778, com 65 anos de idade. Foi de suma influência na Revolução Francesa e no
Romantismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário