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sábado, 2 de dezembro de 2017

AS OBRIGAÇÕES DOS MAÇONS: VI.1 - A CONDUTA NA LOJA ENQUANTO CONSTITUÍDA

AS OBRIGAÇÕES DOS MAÇONS: VI.1 - A CONDUTA NA LOJA ENQUANTO CONSTITUÍDA
Rui Bandeira

Não se deverão formar grupos particulares, ou ter conversas paralelas, sem permissão do Mestre, nem falar de coisas inoportunas ou inconvenientes, nem interromper o Mestre, os Vigilantes ou qualquer outro Irmão que esteja a falar com o Mestre; nem ter um comportamento jocoso ou ridículo enquanto a Loja estiver a tratar de coisas sérias e solenes, nem usar de linguagem imprópria para tratar do que quer que seja, antes devendo respeitar o Mestre, Vigilantes e Companheiros.

Se for formulada qualquer queixa, o Irmão considerado culpado deverá aceitar a sentença e determinação da Loja, que detém a competência para julgar todas as questões (a não ser que apele para a Grande Loja). É a ela que os Irmãos se devem dirigir, a não ser que o trabalho do Senhor esteja a ser prejudicado, situação em que tal deve ser comunicado à Grande Loja; mas nunca deverá dirigir-se à Lei Civil quando as questões se referem à Maçonaria, sem necessidade absoluta e aparente para a Loja.

Em Loja constituída cada um trabalha em grupo e no grupo. É a Loja, toda ela, que está em trabalho, devendo cada um contribuir para esse trabalho e estar atento ao que se passa. Só assim cada um beneficia do que os demais e o grupo como um todo lhe proporcionam, só assim cada um está em condições de proficuamente contribuir para o aperfeiçoamento dos demais.

Não deve, assim, haver lugar para conversas paralelas, conciliábulos particulares, a não ser que, no âmbito do que estiver a ser tratado, o Venerável Mestre solicite que alguma questão ou conjunto de questões seja analisada por um ou mais grupos formados na Loja, para seguidamente as conclusões extraídas serem fornecidas à Loja e os trabalhos prosseguirem normalmente.

Em sessão de Loja trabalha-se e está-se concentrado no que decorre, no que é dito, no que está em análise ou em discussão. As saudações entre os obreiros, o convívio, têm lugar antes e depois das sessões, nomeadamente nos ágapes. Aí podem formar-se os grupos que as afinidades ditarem, tecer-se conversas paralelas, enfim, conviver informal e fraternalmente. Aí e então brinca-se e contam-se piadas e comentam-se notícias e tece-se toda a teia que envolve as amizades que se forjam e mantêm entre as pessoas. Em sessão de Loja, trabalha-se, está-se atento, cada um deve esforçar-se por contribuir o melhor possível para o ambiente e o trabalho comum, para que todos beneficiem do que todos efetuam.

É conhecida a frase de que trabalho é trabalho, conhaque é conhaque. Em Maçonaria, a sessão de Loja é tempo de trabalho. Outros tempos e outros espaços estão reservados para o "conhaque".

Em Loja não se fala de coisas inoportunas ou inconvenientes. É inoportuno tudo o que esteja para além da agenda da sessão, exceto quando a palavra seja concedida para que qualquer um fale sobre qualquer tema ou assunto que considere conveniente (no período dos trabalhos que os maçons designam por "a bem da Loja ou da Ordem", ou seja, o período fora da Ordem do Dia). É inconveniente tudo aquilo que possa perturbar a harmonia da Loja e dos Irmãos, designadamente a polémica religiosa ou a controvérsia política.

Todas as intervenções em Loja são dirigidas ao Venerável Mestre e, por intermédio deste, a toda a Loja. Por regra, só o Venerável Mestre pode dirigir-se particularmente a um ou alguns dos obreiros, quando entender conveniente dirigir-lhes alguma instrução específica ou solicitar-lhe alguma tarefa ou ação concreta. Esta regra tem, que me recorde, apenas duas exceções: comunicações efetuadas em execução do ritual pelos Vigilantes ao Guarda Interno, no Rito Escocês Antigo e Aceite, e aos Diáconos, nos Ritos de Emulação e de York; e faculdade concedida ao Orador de interromper qualquer Obreiro, inclusivamente o Venerável Mestre, quando entender estar a ser violada alguma regra, em ordem a prevenir ou interromper essa violação. Com esta exceção do Orador, é formalmente interdito a qualquer Obreiro interromper outro no uso da palavra. Mesmo que aquele que dela use se esteja a alongar demasiado, mesmo que se discorde do que é dito, é uma simples questão de respeito pelo outro ouvi-lo até ao fim. E é uma simples questão de respeito e ordem cada um só falar na sua vez de intervir e após lhe ser concedida a palavra. Assim se consegue que as sessões de Loja decorram harmoniosa e frutuosamente, podendo cada um expor livremente os seus pontos de vista, perante a atenção de todos e, porque não há interrupções intempestivas, podendo aquele que fala expor inteiramente o seu entendimento e os que ouvem analisar os méritos do que é dito, sem falar antes de tempo e, sobretudo, a destempo.

Quando a Loja trabalha, todos e cada um dos obreiros mantêm um comportamento e postura concentrados e dignos. Palavras ou gestos jocosos podem ferir alguém que interprete mal a intenção ou se sinta ridicularizado e são, por isso, interditos. A melhor forma de garantir que cada um possa expor e exponha os seus pontos de vista é que o faça sem temor de ser ridicularizado por eles. Pode receber a discordância dos seus Irmãos, se entenderem que o que afirma merece discordância. Nunca - mas nunca! - o seu ponto de vista será jocosamente comentado, ou ridicularizado, antes será sempre respeitado. Porque, das duas, uma, ou a opinião expressa está errada e é o confronto de ideias que permitirá que o seu autor melhor reflita; ou, ainda que porventura haja discordâncias, a ideia afinal está certa, a razão está com quem a expôs (a maioria não tem necessariamente sempre razão...) e, mais uma vez, é dos confrontos de ideias diversas que será possível determinar a melhor decisão possível, naquele momento, para aquele grupo. E, se porventura a decisão que aquele grupo naquele momento tomar se vier a revelar errada, saber-se-á porquê, que argumentos não foram atendidos, e poder-se-á, com esse conhecimento, evitar novos erros futuros.

Em sessão de Loja, utiliza-se linguagem ponderada, até mesmo algo cerimoniosa. Não está em causa que se esteja entre amigos, entre pessoas que se dão como irmãos. Está sobretudo em causa a manifestação do respeito que todos têm por todos e pela individualidade de cada um. Ponderação de linguagem previne exposição abrupta de posições e manifestações de ira, pois se a pessoa tem de medir o que diz, tal mediação da Inteligência entre a Razão e a Emoção arrefece a cabeça que esteja demasiado quente... Ponderação de linguagem é adquirir o hábito de pensar no que se diz, para melhor se dizer o que efetivamente se pensa. Com o cultivo deste hábito, os maçons conseguem, sem esforço e com naturalidade, discutir os assuntos mais delicados com calma e racionalmente, sem perturbar a análise serena das situações com impropérios ou exageros de linguagem - e, assim, logram com mais facilidade determinar o denominador comum das posições divergentes, limar arestas, estabelecer pontes, privilegiar compreensões com as diferenças, tolerar e harmonizar divergências, enfim cooperar em empresas comuns sem que ninguém abdique de ou sacrifique entendimentos pessoais. A Fraternidade entre os maçons não lhes é dada de bandeja por qualquer intervenção divina: é cuidadosamente construída, laboriosamente conquistada, serenamente fruída. Também neste campo as lições são de que nada de útil se consegue sem trabalho e que cooperar é sempre mais frutuoso do que competir.

As divergências que surjam no grupo são resolvidas, sanadas ou sancionadas dentro do grupo e pelo grupo. O que se passa em Loja só à Loja diz respeito. Se e quando houver censuras a fazer, sanções a aplicar, é o grupo que trata do assunto internamente e fora dele ninguém tem nada com isso, ressalvadas as regulamentares salvaguardas de apelo para instâncias superiores, indispensáveis válvulas de segurança para prevenir eventuais injustiças. Este princípio possibilita a maximização da coesão do grupo, fundada na imensa liberdade de cada um dentro dele, conjugada com idêntica dimensão de responsabilidade e com não menor dose de sentido de cooperação.

Uma Loja maçónica é um microcosmo, uma amostra da sociedade, um cadinho de mistura das personalidades individuais dos que nela se agrupam. As regras de convivência, de linguagem, de comportamento, que os maçons desde há séculos adotam e cultivam têm-se mostrado adequadas à Maçonaria e às Lojas. A sua adoção e o seu cultivo pela sociedade em geral certamente redunda em benefício comum. Por isso os maçons têm o dever de constituir um exemplo, de procurar que o seu comportamento fora de Loja, na sua atividade social comum, perante a sua família, na sua atividade profissional, nos diversos grupos sociais com que interagem, emule o que adotam em Loja. Assim, pelo seu comportamento, pelo seu exemplo, cada um dos maçons pode contribuir um pouco para a melhoria, a harmonia e o progresso da sociedade em que se insere. Cada um poderá porventura apenas acrescentar um pouco, quase nada, uma gota de água no oceano - mas o exemplo de cada um pode porventura ser semente que germine em muitos frutos. E é da junção de muitos poucos que se faz muito!

Fonte: Constituição de Anderson, 1723, Introdução, Comentário e Notas de Cipriano de Oliveira, Edições Cosmos, 2011, páginas 133-134. 

Fonte: apartirapedra.blogspot.com.br

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