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segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

AMÉM OU ASSIM SEJA

AMÉM OU ASSIM SEJA
(republicação)

Em 10.04.2014 o Respeitável Irmão Antonio Raia, GOB, REAA, Oriente de Recife, Estado de Pernambuco, apresenta a questão seguinte:
antonio_raia@hotmail.com

Em resposta em uma das visitas a uma Loja do Oriente do Recife onde apresentou explicações sobre o Ritual de Aprendiz, e a Loja tem o costume de "ASSIM SEJA" ou “AMÉM", onde aleguei que tanto o Ritual de Aprendiz como a DINÂMICA RITUALÍSTICA DO 1º Grau, editado em 2004, não pede o referido fechamento. Um Irmão questionou e disse-me que mandaria uma prancha para tentar tirar a duvida. Segue a prancha: 
Estou enviando esta prancha devido a uma conversa anterior com o Irmão sobre o meu questionamento da inexistência da palavra "AMEM" ou “ASSIM SEJA" logo após a leitura do Salmo 133 na abertura do Grau de Aprendiz em Lojas simbólicas. Inicialmente gostaria de colocar algo sobre a natureza de ritual. 

Um ritual acontece em concomitância de sujeitos, tempo e espaço. Necessita, também de objetivos, procedimentos, técnicas, instrumentos, objetos... (Man and his works: the science of cultural antropology, Melville HersKovits), ele nos adverte para a necessidade de atermo-nos para os aspectos que dão sentido às praticas sociais. A música, a dança, as festas, as produções estéticas, roupas, comidas, como exemplos, fazem parte de um universo cuja ordenação social, cultural e política amplia o conceito de ritual. Nesse sentido, os espaços ritualísticos não são apenas os ligados à religião ou misticismo. Até mesmo o espaço do jogo de cartas entre homens maduros, por exemplo, obedece a regras, apresenta padrões e procedimentos típicos. 

Os propósitos dos rituais são variados. Eles podem incluir a concordância com obrigações religiosas ou ideais, satisfação de necessidades espirituais ou emocionais dos praticantes, fortalecimento de laços sociais, demonstração de respeito ou submissão, estabelecendo afiliação, obtenção de aceitação social ou aprovação para certo evento- ou, às vezes, apenas o prazer do ritual em si. Varia ações comuns como aperto de mão ou cumprimentos pode ser entendido como pequenos rituais. Eu creio que esta definição de ritual enquadra muito bem o da Ordem Maçônica. Algumas pessoas dizem que é por questões religiosas. Eu também já ouvi dizer que para não confundir Maçonaria com Religião, daí a supressão desta fala ao final da leitura do Salmo 133. 

Agora sobre esta afirmação precisamos entender o que Liturgia que um vocábulo "Liturgia" em Grego, formado pelas raízes leit - (de "laos", povo) e –urgia (trabalho, ofício) significa serviço ou trabalho público. Por extensão de sentido, passou a significar também, no mundo grego o ofício religioso, na medida em que a religião no mundo antigo tinha um carácter eminentemente público. 

Na Bíblia dos Setenta (LXX), tradução grega da Bíblia, o vocábulo! “liturgia” é utilizado para designar somente os ofícios religiosos realizados pelos sacerdotes levíticos no Templo de Jerusalém. No princípio, a palavra não era utilizada para designar as celebrações dos cristãos, que entendiam que Cristo inaugurara um tempo inteiramente distinto do culto do templo. Mais tarde, o vocábulo foi adaptado, com um sentido cristão. E que coincidentemente ou não a última palavra da Bíblia é “AMEM". "a graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós, Amem” (Apocalipse 22:21). 

Na definição de José Castellani que esta de acordo com as afirmações acima lemos as seguintes definições: Rito é o cerimonial próprio de um culto, ou de uma sociedade, determinado pela autoridade competente; é a ordenação de qualquer cerimonia; por extensão, designa culto, religião, seita. 

Ritual é tudo que é relativo a rito, ou que contem ritos; é também, o livro que contem a ordem e a forma das cerimônias, religiosas ou não, com as palavras (ou, também, orações) que devem acompanhá-las; mais extensamente, refere-se a qualquer cerimonial ou a um conjunto de regras a seguir. 

Ritualística é tudo aquilo que é relativo ao ritual, ao rito, ou ao ritualista. Não pode ser confundido com ritualismo, que é o sistema dos que se apegam a ritos,( como ritualista é aquele que é apegado a ritos).

Liturgia é termo mais aplicado à religião e designa a forma e a ordem, aprovadas pela autoridade eclesiástica, para celebrar os ofícios divinos, especialmente o da missa. Todavia, pela própria etimologia da palavra (originada do grego leitourgia = função pública), qualquer sociedade que realize um cerimonial, seja público, ou apenas reservado aos seus adeptos, em que exista uma ordenação e uma determinada forma de desenvolvimento da cerimônia, estará exercitando uma função litúrgica. 

O cerimonial do rito maçônico é o seu ritual, que, na atualidade designa, realmente, o livro que contém a ordem e a forma das cerimonias. No nosso Ritual do 1º grau- Aprendiz Maçom- Rito Escocês Antigo e Aceito- 2009 tem na página 50 a fala do Venerável Mestre "Achando a Loja regularmente constituída, procedamos à abertura de seus trabalhos, invocando o auxílio do GADU. - Ir∴ Mestre de CCer∴, conduzi o Ir∴ Orad.'. ao Altar dos Juramentos... (o Ir∴ Orad∴ abre o Livro da Lei e lê o Salmo 133); 

A natureza do Salmo 133 é de FRATERNIDADE, pois este salmo refere-se à concórdia entre os irmãos. A palavra AMÉM é empregada no fim de várias orações não apenas no Cristianismo, mas também no Islamismo e Judaísmo. Sua origem é bem controversa, mas o seu sentido é de "ASSIM SEJA" e na maioria dos rituais de cada religião, a expressão é dita diversas vezes, como forma de confirmar que os fieis acreditam ou reiteram tudo que foi falado ou lido. Ela tornou-se uma expressão popular, quando um individuo fala para a outra pessoa que aquilo que ela almeja vai acontecer, como forma de dar esperança e fazer com que a pessoa tenha fé, é bastante usual que a outra pessoa diga AMÉM ou ASSIM SEJA. A disposição da palavra AMEM no começo de uma frase tem como objetivo de tomara significação que algo "será assim" ou que "que seja assim". 

Confesso Irmão Raia que estando escrito ou não, irei pronuncia-la em silêncio, já que não consigo aceitar a exclusão da expressão "ASSIM SEJA", COM UM ARGUMENTO PRECONCEITUOSO SOBRE QUALQUER RELIGIÃO, QUE COMO LHE MOSTREI A RELIGIÃO APENAS APODEROU-SE DA EXPRESSÃO SEM SER EM MOMENTO ALGUM DONO DELA. No aguardo de sua comunicação, fraternalmente.

Eminente Irmão, não conseguindo a aceitação do Irmão (...), prometi que iria enviar a sua prancha para o Eminente Irmão, que acredito tenha uma melhor explicação, fico no aguardo da sua resposta.

Considerações: 

“Assim Seja” é expressão oriunda da tradução do hebraico “amém” e que é o fecho de orações, tanto no judaísmo como no cristianismo. Há então que se considerar que a leitura de um versículo não é uma oração propiciatória, ou invocatória. Desse modo caberia o temo da expressão somente se fosse usado naquilo que concerne a uma prece que, em linhas gerais, invocasse o auxílio do “Grande Arquiteto do Universo”. No que concerne à leitura de um Salmo, que é uma simples narração ou a exposição de um pensamento e não uma prece, o uso do termo é completamente desnecessário, o que o faz de uso incorreto nessa oportunidade. Daí a sua exclusão dos rituais na narrativa do Salmo 133, ou 132 conforme a versão bíblica.

Penso ser oportuno salientar que a Maçonaria não é exclusivamente um Rito, senão um sistema velado por símbolos e alegorias composto por vários Ritos e Trabalhos, daí não há como se generalizar procedimentos no campo da ritualística e da liturgia maçônica. Assim a abertura do Livro da Lei, ou o Livro das Sagradas Escrituras na Maçonaria tem variado através dos tempos abordando costumes tais como o de se apenas abrir o Livro da Lei, outros no ato de abri-lo ainda leem um determinado trecho e outros ainda que nem mesmo abrem-no, apenas o expõe e indicam a sua presença. Exemplos: Rito Escocês Antigo e Aceito - após a sua abertura há leitura; Trabalho de Emulação - o Livro das Sagradas Escrituras é apenas aberto; Rito Schröeder - expõe o Livro sem nenhuma leitura. 

No caso do Rito Escocês Antigo e Aceito que é divisa desse assunto, é filho espiritual da França e somente se caracterizaria como Rito a partir de 31 de maio de 1.801 na cidade de Charleston, Carolina do Sul, Estados Unidos da América do Norte, sobre o paralelo trinta e três da Terra, oportunidade aquela em que fora criado o Primeiro Supremo Conselho, dito “Mãe do Mundo”. 

O Rito então, na sequência do seu desenvolvimento e a criação dos seus três Graus Simbólicos próprios - isso a partir do Segundo Supremo Conselho – agora em solo francês - ao longo do percurso histórico adotaria a tradicional e antiga abertura no Evangelho de São João, capítulo I, versículos 1 a 5, já que pela essência doutrinária geral e em particular do Rito, alude ao triunfo da Luz sobre as trevas – morte do Grau de Aprendiz. Todavia, consecutivamente alguns países da América do Sul com o Brasil à frente, sob a influência da Maçonaria norte-americana passaria adotar em algumas Obediências o Salmo 133, na abertura do Livro, o que está em total desacordo com as origens e a tradição do Rito Escocês no seu simbolismo. 

Salmo 133 – Salmo da Concórdia ou da Fraternidade onde David enaltece a fraternidade citando Aarão no contexto dos Montes Sião e Hermon e se refere também à gênese da vida – o derretimento da neve do Hermon e o oásis que se forma – ordena as bênçãos e a vida para todo o sempre. 

Como já proferido, o costume da leitura na abertura do Livro das Sagradas Escrituras e as suas variações são dignas de apreciação. Por exemplo, em 1.762 em um catecismo inglês – não havia Rito Escocês na época, evidentemente – aparece a leitura em Pedro II no Grau de Aprendiz, Juízes 12 no de Companheiro e Reis 17 no Grau de Mestre. Na época a Moderna Maçonaria inglesa se dividia em duas Grandes Lojas: a primeira do mundo, ou a Premier Grand Lodge de Londres, criada em 1.717 apelidada de “os Modernos”, e a Grande Loja criada em 1.751 autointitulada de “os Antigos”. 

Conforme outro ritual da mesma época, esse usado pelos “Modernos”, a bíblia era aberta no Evangelho de São João, na oportunidade em que era prestada a obrigação do Aprendiz. Já no final do mesmo século (XVIII) pode-se observar a abertura em Crônicas II 2.

Em seguida na edição do Gilkes Ritual na Inglaterra no Emulação não era prevista nenhuma leitura em lugar específico, fato que acabaria por persistir na Maçonaria inglesa desde então até o presente, embora tenham até persistido algumas tentativas, já no século XX, de se incluir a abertura em Crônicas II sob a alegação de que o modo seria mais apropriado para o sistema Inglês. 

Em relação ao Salmo 133 e a Maçonaria inglesa, o hábito de se abrir o Livro nesse Salmo no Primeiro Grau, em Amós 7 no Segundo Grau e em Eclesiastes 12 no Terceiro Grau, surgiria na mesma Inglaterra, no Yorkshire. Esse costume posteriormente seria abandonado pelo Craft inglês, porém deixaria influência nos trabalhos do Craft norte-americano (raiz inglesa), cujo simbolismo é também por nós conhecido como Rito Americano, ou Rito de York, mais precisamente através da Grande Loja de Nova York. Não há como se confundir com o Rito Escocês Antigo e Aceito. 

A guisa de esclarecimento, a Grande Loja de Nova York, por seu ritual de admissão de Aprendizes, profere a leitura do Salmo 133 em uma passagem ritualística específica e não propriamente na abertura indiscriminada do Livro da Lei. Saliente-se que as Grandes Lojas norte-americanas trabalham nos seus três primeiros graus no que é conhecido como Lojas Azuis e não no Rito Escocês Antigo e Aceito (veja meus esclarecimentos prestados através do JB NEWS, edição nº 1.342 in Perguntas e Respostas). 

A busca de reconhecimento a parir de 1.927 pelas recém-fundadas Grandes Lojas brasileiras na Maçonaria norte-americana traria esse equivoco (leitura do Salmo, dentre outros) para o Rito Escocês no Brasil, que ao longo dos tempos acabaria o costume também se enraizando nos inúmeros rituais escoceses oriundos de algumas Obediências brasileiras. 

Finalizado. Como pode notar o Irmão, o molho às vezes assume maior importância que a carne e acaba por levantar discussões ineficazes como é o caso, ou “causo”, de se proferir ou não o termo “amém” ou “assim seja”, já que verdadeiramente o Salmo nem mesmo faz parte da verdadeira tradição do Rito Escocês. Penso que para essas discussões, primeiro seria melhor se aventar a legitimidade que possa explicar inclusive a prevalência da Luz sobre as trevas, como mote principal do Grau 01 no arcabouço doutrinário do Rito em questão. 

E.T. – Os comentários aqui proferidos não têm a intenção de desrespeitar rituais em vigência e legalmente aprovados. A questão aqui é a de se apontar a Verdade, nunca o desrespeito. Assim, cumpra-se o que está escrito.

T.F.A. 
PEDRO JUK – jukirm@hotmail.com
Fonte: JB News – Informativo nr. 1.424 Florianópolis(SC) sexta-feira, 8 de agosto de 2014.

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