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domingo, 28 de julho de 2019

ARCA DA ALIANÇA, OU DO TESTEMUNHO

Em 02/04/2019 o Respeitável Irmão Renato Barreto Filho, Loja Vale do Tijucas, 2.817, e da Loja de Perfeição Marco Aurélio de Oliveira, REAA, GOB-SC, REAA, Oriente de Tijucas, Estado de Santa Cataria, solicita informações para o que segue:

ARCA DA ALIANÇA

Meu nome é Renato, sou obreiro da Loja Vale do Tijucas sou amigo do André Carpes, ele me passou o teu contato para tirar algumas dúvidas de alguns trabalhos que estou desenvolvendo na Loja de Perfeição.

Tenho que falar sobre a Arca da Aliança, mas notei que na internet e nos livros os temas sempre são os mesmos, ou seja, falam das origens bíblicas da mesma, do fato de ser uma arma e as questões enérgicas da mesma, e sobre os conteúdos da mesma. Queria uma abordagem diferente, ou alguma curiosidade diferente sabe?

Se puder me ajudar aonde pesquisar, agradeceria.

CONSIDERAÇÕES:

Introdução

Não especificamente só para a Loja de Perfeição, vou deixar alguns comentários sobre a presença da Arca da Aliança como um ícone simbólico utilizado na Maçonaria. 

Sobretudo pela influência hebraica na Maçonaria, notadamente a Arca da Aliança, ou do Testemunho, tem seu espaço na doutrina da Ordem, tanto como elemento individual, bem como um relicário simbólico que é parte de uma alegoria.

A despeito da sua presença, muitas vezes abstrata no simbolismo, a Arca possui uma relação direta com os Templos maçônicos da Moderna Maçonaria.

Em se tratando desses Templos (espaços onde se realizam os trabalhos maçônicos), os mesmos, como Salas da Loja, são relativamente novos, pois o primeiro Templo maçônico somente surgiria com o aparecimento da primeira Obediência maçônica, fundada em Londres a 24 de junho de 1.717 e que teve seu Templo inaugurado em 1.776.

É bom que se diga que antes do surgimento dos Templos específicos para os trabalhos maçônicos, era comum as Lojas se reunirem em Tabernas e Cervejarias e, muitas vezes, também nos espaços em torno das igrejas, conhecidos como adros. Entenda-se que não havia ainda na época os conhecidos ritos maçônicos e suas liturgias elaboradas. Isso só viria ocorrer, paulatinamente, a partir do primeiro quartel século XVIII. 

Não menos importante nessa história é se saber que a palavra “taberna”, na Europa do século XVII e XVIII não se resumia apenas num lugar para abrigo, repouso e alimentação, mas um espaço que possuía grande função social. Geralmente nelas também se reuniam grupos associativos, como o de artesãos do mesmo ofício, o que dava às tabernas condição de ser um local de concentração, onde os homens buscavam, pela troca de ideias, aprimoramento pessoal. 

Assim, descontraidamente as tabernas eram o ponto de encontro para essas reuniões informais, enquanto que de modo formal, como admissões no Ofício (iniciações), ensinamentos dos segredos da Arte, etc., as Lojas de artesãos construtores preferiam reunir-se nos adros das Igrejas, embora também usassem recintos que eram alugados nas Tabernas.

Essa relação da Moderna Maçonaria com as Igrejas nada tem de surpreendente, pois é sabido que a sua predecessora, a Maçonaria de Ofício, floresceu e se desenvolveu sob a sua proteção (da Igreja).

Foi com o aparecimento da Primeira Grande Loja em 1.717 que os maçons ingleses, organizados e prevendo expansão do sistema obediencial que acabara de nascer, construiriam, em 1.776, o primeiro Templo maçônico.

Relação Arca, Igreja e Templo Maçônico

Feitos esses comentários iniciais, é sobre eles que eu gostaria de inserir, nesse contexto, a Arca da Aliança - não como um marco do seu aparecimento na Maçonaria, mas como uma alegoria maçônica que possui estreita relação com o espaço e divisão de um Templo maçônico herdado de costumes eclesiásticos.

Por oportuno, cabe mencionar que já na Maçonaria de Ofício, muitas lendas que envolviam o Tabernáculo e a construção do Templo de Jerusalém eram contadas. Sob essa conotação mística vários elementos relacionados à fé e a história hebraica faziam parte do relicário dito e recitado em muitas old charges. Nesses conteúdos sustentados pela fé, a Arca da Aliança, a Urna do Maná e a Vara de Aarão, por exemplo, já eram mencionadas. 

Assim, segue um breve relato sobre a construção do primeiro Templo maçônico do mundo e a sua relação com a alegoria da Arca.

Os ingleses, para construir o primeiro espaço específico para os trabalhos maçônicos (a sala da Loja) buscaram inspiração em dois exemplares deles bem conhecidos: as Igrejas e o Parlamento britânico.

No que diz respeito às Igrejas, dela eles copiaram a orientação e a divisão, enquanto que do Parlamento, a sua disposição.

É preciso salientar entrementes que indisfarçavelmente as Igrejas foram inspiradas nas hipotéticas descrições bíblicas relativas ao Templo de Jerusalém. A sua orientação do Oriente para o Ocidente e a sua divisão em número de três demonstra perfeitamente esse comentário. 

Vide, por exemplo, o altar-mor, o presbitério e a nave das Igrejas. Nessa divisão, o altar-mor, onde se oficia a missa, corresponde ao Santo dos Santos do Templo de Jerusalém; o presbitério, onde se colocam os auxiliares para o ofício da missa, o Santo; e a nave, onde se colocam os fiéis, corresponde a parte sem cobertura do Templo hebraico, parte essa destinada aos pátios para acomodar o povo.

A despeito das acomodações dos lugares nos Templos maçônicos que foram copiados do Parlamento britânico, influenciados pela Igreja, os recintos de trabalho maçônico com seu eixo longitudinal oriente-ocidente são do mesmo modo divididos em três partes. O Altar no Oriente, que acomoda o Venerável Mestre, corresponde ao mesmo tempo ao “Santo dos Santos” do Templo hebraico e ao altar-mor da Igreja; o restante do espaço oriental, onde se colocam as autoridades e outras dignidades maçônicas, corresponde ao mesmo tempo ao “Santo” do Templo hebraico e ao presbitério da Igreja. Por fim, as Colunas, onde ocupam lugar os demais obreiros da Loja, correspondem simultaneamente à nave da Igreja e ao pátio do Templo de Jerusalém.

É por esse viés que o Templo maçônico possui relação com Templo de Jerusalém, todavia sem que se imagine ser um a cópia fiel do outro. Há sim alguns aspectos correspondentes, todavia mais pelo seu significado simbólico do que propriamente como um modelo. 

De qualquer modo, a afinidade entre um e outro existe, e tem como intermediária dessa relação, a Igreja. Destaque-se que nada há de estranho nessa relação, pois a Igreja, através do Cristianismo, acabou herdando do judaísmo inúmeros aspectos ligados à liturgia e os seus símbolos. 

Nesse sentido, a Arca acabou se tornando uma peça importante nas lendas e alegorias que dão estrutura à doutrina de muitos ritos maçônicos – a exemplo do escocesismo, a mesma tem estado presente em vários dos seus Altos Graus.

De alto significado simbólico, no Templo maçônico a Arca da Aliança geralmente aparece aberta mostrando no seu interior o Decálogo. Colocada no Oriente, fica junto ao Altar por este simbolizar o Santo dos Santos do Templo hebraico.

A Arca da Aliança, ou do Testemunho. Síntese do seu significado

Citada na Bíblia em Êxodo 25 – 10 a 22, ela simboliza terceira aliança de Deus com o homem. Cabe destacar que a primeira aliança, a que abrange a humanidade inteira, foi aquela que Deus firmou com Noé. Como menciona em Gênesis, o arco-íris é a prova da sua existência. A segunda aliança, já de modo mais particular, foi a abraâmica e tem como sinal a circuncisão (em hebraico: brit-milá). Seu propósito abrange todos aqueles que invocam o Deus de Abraão. Por fim, a terceira aliança foi aquela concluída no monte Horeb por Moisés. Essa aliança aspira representar pelo sacrifício, o pacto de união entre Israel e seu Deus. O seu sinal é o shabat (sábado) – dia da plenitude da criação. A sua Lei é aquela que Deus revelou a Moisés no Sinai.

A Arca, com as Tábuas da Lei, ou o Testemunho da Lei, foi colocada no Santo dos Santos como único objeto a ali se situar, não havendo nenhum outro além dela. Nesse recinto (Santo dos Santos) só teria acesso, uma única vez por ano, no Dia do Perdão, ou Expiação o sumo sacerdote (em hebraico: cohen gadol). 

No trajeto da sua existência, segundo conta a tradição, após a entrada dos hebreus na terra prometida, a Arca ficou guardada em Galgala, e posteriormente levada a Siló, juntamente com o Tabernáculo. Quando ocorreu a guerra contra os filisteus, ela fora roubada, porém recuperada posteriormente pelos hebreus. Permaneceu então pelo período de oitenta anos em Cariatiarim, de onde foi levada para a casa de Obed-Edom. Assumiu lugar definitivo no Santo dos Santos quando da construção do Primeiro Templo (o de Jerusalém – de Salomão). Em 586 a.C., após a tomada de Jerusalém pelos babilônios de Nabucodonosor II, quando o Templo foi completamente destruído, a Arca desapareceu, sem que se saiba do seu destino (se a mesma foi escondida ou destruída junto com o Templo).

Cabe comentar que o termo Testemunho (da lei) se refere ao decálogo e é o Testemunho da terceira aliança – de Deus como Moisés.

De tudo, a alegoria da Arca da Aliança carece de um estudo abrangente naquilo que envolve o seu significado histórico, religioso e simbólico no contexto em que ela aparece.

Arca da Aliança nos Altos Graus

Sob a égide dos graus históricos israelitas-bíblicos a Arca é um símbolo de sustentação e de fé. É o elemento principal de uma alegoria relacionada a existência de uma aliança entre a Lei do Criador e o homem como produto da Sua criação.

Sob aspecto filosófico, poder-se-ia citar Leibniz e a sua teoria da mônada. Segundo ele, a Arca é tida como o elemento constitutivo de todas as coisas. Essa teoria, que se refere ao “todo no um”, tem o propósito de explicar que cada uma das substâncias simples e de quantidade infinita, de natureza psíquica e que não têm relação umas com as outras, se agregam harmoniosamente no Universo por vontade da Divindade.

Nesse sentido, são várias as apreciações que a Arca assume, mesmo nos Altos Graus. Cada lenda que a envolve traz uma espécie de chave, ou uma espécie de fio de Ariadne para se descobrir o segredo do absoluto.

Para a Maçonaria, além dos propósitos do seu significado alegórico e filosófico, a Arca, em última análise, representa a onipresença do Arquiteto Criador.

Epílogo

Concluindo, devo mencionar que as considerações aqui contidas não possuem o objetivo de explicar o seu simbolismo sob o viés esotérico. Superficialmente essa abordagem objetiva incluir no seu contexto a relação do símbolo da Arca com o Templo maçônico. Assim, a sua exposição mística e histórica, mesmo que superficial, se embasou na tradição hebraica. No contexto maçônico ela se resume a uma colocação filosófica que faz parte da espinha dorsal doutrinária dos Altos Graus do REAA. 

T.F.A.
PEDRO JUK - jukirm@hotmail.com
Fonte: pedro-juk.blogspot.com.br - 26/07/2019

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