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sexta-feira, 12 de junho de 2020

A PEDRA CÚBICA

A PEDRA CÚBICA

Nada se revela perante olhos estranhos ou fechados que possa dar indicação daquilo que existe para lá daquela simples porta. Não há imagens, avisos de proibição de fumar, placas de “proibida a entrada a pessoas estranhas ao serviço”, nenhuma sinalética, como hoje se diz. E, no entanto, a porta existe.

Separa, divide o profano do sagrado, sendo que aqui o sagrado não consubstancia outra forma que não a etimológica, isto é, o terreno do Templo.

E é isso que aquela pequena sala representa no seu formato quandrangular, ou mais pròpriamente rectangular, pois que o arquitecto que a concebeu tem título começado por letra minúscula.

A sala é simples, discreta, despojada de adornos. Mas não de símbolos, pois estamos no reino da simbologia. A luz, essa, é um bem escasso. Apenas uma migalha de trémulas velas dá contorno aos corpos que não às almas. Sombras e vultos a povoam, como na Caverna do Platão. E no entanto, e contrariamente ao ensinamento do filósofo, é lá dentro que todos vão procurar a luz. 

Paradoxo, ou verdade universal?

TRUZ, TRUZ, TRUZ,
- Quem vem lá?
- É o Irmão Inocêncio, Venerável Mestre
- Irmão Guarda Interno, manda entrar ritualmente o Irmão Inocêncio e pede-lhe para se colocar à ordem, pois está entre nós o Muito Respeitável Grão Mestre.
- Irmão Inocêncio, vens de tanga? Que é feito do teu smoking, das luvas e do avental?
- Ficaram no prego, Venerável Mestre; os profanos foram-nos à Loja e desataram a cortar em tudo; ainda recorremos ao auxílio do Grande Conselho Federativo, mas os filhos das trevas deram a volta ao Texto. Ficou só o Irmão Tomás a pregar no deserto.
- Como assim? Outra revolta do Sino?
- NÓS NÃO SABEMOS DE NADA!
clama a Assembleia em coro
- Silêncio!
pede o Venerável Mestre da Loja
- Não, Venerável Mestre; aos do Sino, os filhos das trevas até o badalo querem arrancar.
- Bem que o merecem depois das modernices que quiseram introduzir no nosso Ritual. Então queres dizer que para os renegados há agora mão de ferro?
- Não é bem assim, Venerável Mestre; eu diria antes que caíram, como nós, nas malhas da rede
- Que nem um cardume de peixes, ah?
- Pelo Grande Arquitecto do Universo, não me fale em peixes, Venerável Mestre!
- Não me digas que não aprecias um bom cherne!
- Ai de nós, Venerável Mestre, que já nem barcos temos para aviar uma simples sardinha!
- Peço a palavra, Venerável Mestre
- Irmão Daniel, tens a palavra, a bem desta Respeitável Loja
- Muito obrigado, Venerável Mestre. Quero apresentar o meu abraço fraterno ao nosso querido Irmão Inocêncio e com ele saudar todos os nossos Irmãos da Loja Republicana Portucale, nesta hora de infortúnio.
- Infortúnio? Mas o que é que se passa neste nosso Templo?
- Venerável Mestre...o Templo...ruiu...
- Eu bem que suspeitava daquele fradalhão do Melícias!
- Não foi bem por aí que as Colunas abateram, Venerável Mestre
- Então, como é que os profanos entraram?
- Com martelo e escopro, Venerável Mestre, para trabalharem a pedra bruta
- Mas esse é o trabalho de um maçon: transformar a pedra bruta em pedra cúbica!
Do seu assento, no Oriente, ergue-se, irada, a figura imponente, majestática e senatorial do Grão Mestre, inquirindo a Assembleia:
- E vós, meus Irmãos, que fazíeis enquanto esses profanos ousavam roubar-nos as nossas Virtudes?
Respingada de alguns tremeliques, ouve-se a voz, algo sumida, do Venerável Mestre da Loja:
- De pé e à ordem, meus Irmãos. Ao meu golpe de malhete respondam, em uníssono, à pergunta do nosso Muito Respeitável Grão Mestre.
Golpe de malhete

- ESTÁVAMOS A DEFINIR O QUE É A PEDRA CÚBICA, GRÃO MESTRE!

Fonte: http://filhosdehiran.blogspot.com

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