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sexta-feira, 3 de dezembro de 2021

A LIBERDADE

A LIBERDADE
Autor: Anatoli Oliynik (*)

Liberdade é um termo que usamos todos os dias, pensando conhecer o seu significado; mas a um exame mais cuidadoso vemos que é difícil dar-lhe uma definição precisa e unívoca, tão variados e diversos são os casos em que nós o usamos. Todavia, existe um núcleo fundamentalmente igual que ocorre constantemente: é a ausência de constrangimento.

Em maçonaria, segundo Castellani:

"Liberdade - Substantivo feminino (do latim: libertas, atis), designa a faculdade de fazer ou deixar de fazer uma coisa por vontade própria, sem se submeter a imposições alheias; o gozo dos direitos de homem livre; a licença, a permissão."

Definição:

Geralmente, nós entendemos liberdade como a ausência de constrangimento. A coação pode depender de diversas causas e, por isso, podem ser distinguidos vários tipos de liberdade, dos quais os principais são:

a. Liberdade física: é a isenção de constrangimento físico;
b. Liberdade moral: é a isenção da pressão de forças relativas à ordem moral, como prêmios, punições, leis, ameaças.
c. Liberdade psicológica: é a isenção de impulsos de outras faculdades humanas sobre a vontade para fazê-la agir de uma determinada forma.
d. Liberdade política: é a isenção de determinismos políticos.
e. Liberdade social: é a ausência de determinismos sociais.

Embora Liberdade seja um dos lemas da trilogia maçônica - "Liberdade, Igualdade e Fraternidade", cujo conceito na Instituição é muito amplo e abrangente, neste artigo, trataremos mais especificamente da liberdade psicológica. Portanto, vamos a sua definição:

Liberdade psicológica define-se como capacidade que o homem possui de fazer ou não uma determinada coisa, de cumprir ou não determinada ação, quando já subsistem todas as condições requeridas para agir. É o controle soberano sobre a situação, de forma que a vontade tenha em suas mãos o poder de fazer pender a agulha da balança de um ou do outro lado. É a senhoria absoluta, o domínio completo de si mesmo, das próprias ações, de tudo o que nos diz respeito. Nessa possibilidade radical de decidir por si mesmo é que consiste a essência da liberdade psicológica.

Historia do problema O estudo do problema da liberdade efetuado pela filosofia grega, não forneceu contribuição significativa. As principais razões pelas quais o pensamento grego não conseguiu realizar uma investigação satisfatória do problema da liberdade são três:

a. porque considera todas as coisas sujeitas ao destino, uma vontade absoluta, superior aos homens e aos deuses, que determina consciente ou inconscientemente a ação; por isso, definitivamente os homens estão isentos de qualquer responsabilidade das ações.

b. porque conforme o pensamento grego, o homem faz parte da natureza e é sujeito às leis gerais que a governam, pelo que ele não pode comportar-se diversamente.

c. porque o homem é escravo da férrea engrenagem da história, que é concebida pelo pensamento grego como um movimento cíclico, no qual tudo se repete regularmente em um certo período de tempo.

O problema da liberdade adquiriu uma nova dimensão e atraiu enorme interesse no pensamento contemporâneo.

Mas, nos dois milênios da reflexão filosófica cristã, o problema não foi encarado sempre do mesmo modo e nem recebeu uma única solução.

Durante o período patrístico e medieval o problema foi visto da perspectiva teocêntrica; a liberdade é, sobretudo, uma relação entre o homem e Deus e a esse propósito Santo Agostinho coloca a seguinte pergunta: "por que Deus criou o homem livre, sabendo que ele abusaria desse dom?" São Tomás de Aquino, também nos coloca a seguinte questão: "Como é possível, pois, que o homem seja livre se Deus é a causa principal e última de cada coisa?".

No período moderno, a perspectiva teocêntrica cede lugar à antropocêntrica: o homem toma consciência da sua autonomia e, por isso, a liberdade não constitui mais um problema para as relações com Deus, mas somente para as relações com as outras faculdades (sobretudo com as paixões) e com os outros indivíduos, com a sociedade, o Estado. Daí os estudos de Descartes, Spinoza, Hume, Freud e de muitos outros autores que estudaram as paixões, e mais recentemente de Karl Marx, Augusto Comte, Stuart Mill, Groce, Russel, Marcuse, sobre as relações entre o indivíduo e sociedade.

No período contemporâneo, o fenômeno da socialização e das suas conseqüências leva a considerar a liberdade, sobretudo, do ponto de vista social. O problema hoje é: de que forma se pode ser ainda livre na sociedade atual, na qual sistemas políticos, os instrumentos de comunicação, os produtos da tecnologia tornaram-se todos, meios potentes da opressão? Hoje, a liberdade não é mais comprometida por forças extramundanas ou infra-humanas, mas por forças sociais, criadas pelo próprio homem, e que agora viram-se contra ele. O problema é encontrar a forma de conciliar o progresso com a liberdade.

Soluções principais

Indicaremos aqui, de forma extremamente esquemática, as soluções mais significativas que foram oferecidas através dos séculos para o problema da liberdade.

Há, antes de tudo, a solução determinista, que nega que o homem seja livre.

O determinismo é justificado de diversas formas, alegando razões intrínsecas à natureza do homem ou mesmo razões extrínsecas. Por conseguinte, dão-se duas formas de determinismo: extrínseco e intrínseco.

Mas desses dois determinismos apresentam-se diversas subespécies.

Determinismo extrínseco

- mitológico: nega que o homem seja livre por razões mitológicas: são o fado, os astros, os demônios, etc., que impedem o homem de ser dono de suas próprias ações. É o determinismo da filosofia grega e também de alguns autores medievais;

- teológico: nega que o homem seja livre por razões teológicas: a onipotência de Deus não deixa espaço nenhum ao exercício da liberdade humana. É a posição da teologia muçulmana e protestante.

Determinismo intrínseco

- fisiológico: definido por Lambroso e por muitos cientistas modernos, que vêem nos movimentos da vontade simples, reações a determinadas combinações químicas entre as células dos tecidos humanos;

- sociológico: todo o agir humano é determinado pela pressão exercida pela sociedade e pelas estruturas sobre os indivíduos;

- psicológico: a ação da vontade é inteiramente determinada pelo intelecto e pelos seus conhecimentos; segundo Freud, a ação da vontade é telecomandada pelos instintos;

- metafísico: formulado por Spinoza e Schopenhauer, os quais vêem na vontade humana nada mais do que um momento e um modo da vontade Suprema e da substância divina;

- político: é a submissão da vontade dos cidadãos à do soberano ou da classe governante: foi teorizado por Maquiavel e por Hobbes.

Do lado oposto, encontramos a solução indeterminista, que afirma que o homem é livre. Porém, desta solução também se dão várias interpretações, das quais as principais são as seguintes:

Ponto de vista gnosiológico

- versão postulatória: afirma que o homem é livre, mas ao mesmo tempo sustenta que não é possível elaborar uma demonstração teorética dessa verdade (Kant).

- versão assertória: diz que o homem é livre e que essa é uma verdade pela qual se podem aduzir muitas provas decisivas (Aristóteles, Orígenes, Agostinho, Anselmo, Tomás, Locke).

Ponto de vista ontológico

- primeira: a liberdade é uma qualidade essencial do homem, mas não constitui a sua própria essência (Aristóteles, Agostinho, Escoto, Tomás e Kant);

- segunda: a liberdade constitui a própria essência da natureza humana (Descartes e Sartre).

O ponto de vista ontológico, diz respeito a correlação entre a liberdade e a natureza profunda do ser humano.

Existência da liberdade

De todas as soluções enumeradas acima, a mais fidedigna nos pareceu a que se pode demonstrar que o homem é livre e que a liberdade, mesmo não se identificando com a natureza humana, faz parte da sua essência.

Para provar a existência da liberdade, podem aduzir-se muitíssimas argumentações. Alguns autores fazem apelo ao testemunho da consciência, outros à constituição intelectiva do ser humano pelo qual goza ele de alguma superioridade sobre as coisas, outros, enfim, a conseqüências absurdas e desastrosas que o conhecimento da liberdade traz consigo.

Entre os textos mais eloqüentes a favor da liberdade, embora muito distanciados no tempo, citaremos quatro: Clemente de Alexandria, São Tomás de Aquino, Emanuel Kant e Jean-Paul Sartre.

Clemente de Alexandria (150-215)

Clemente afirma insistentemente que o homem é livre. Algumas vezes a essa afirmação, dá uma justificativa teológica, apelando para a autoridade da Escritura. "Nos sabemos pela Escritura, diz Clemente, que o homem recebeu de Deus a capacidade de escolher e de rejeitar alguma coisa".

Porém, com muito mais freqüência, oferece-nos argumentos racionais. Em particular, ele insiste sobre o argumento ex absurdis: das conseqüências que resultariam caso se negasse a liberdade. "Elogios, repreensões, recompensas, punições não seriam inteiramente justas se a alma não tivesse a faculdade de querer ou de não querer e cumprisse o mal involuntariamente... Suposto que os pecados têm início na nossa escolha e no nosso desejo e que às vezes reina no nosso espírito uma opinião errada, devido à ignorância e à indiferença e nós não fazemos nada para eliminá-la, Deus tem razão de nos condenar pela nossa iniqüidade, mesmo se não a quisemos aberta e diretamente. Não se tem culpa se não se pega a febre voluntariamente; mas, se ela é pega voluntariamente, se é merecedor de censura. Evidentemente, não escolhemos o mal enquanto mal, mas seduzidos pelo prazer que o acompanha, cremos boa uma coisa e a escolhemos. Todavia, está em nosso poder nos libertarmos da ignorância, da escolha do objeto ruim mas encantador, e, sobretudo, não dar nosso consenso a imagens falazes", conclui Clemente.

São Tomás de Aquino (1225-1274)

São Tomás afrontou o problema da liberdade em muitas obras preocupando-se em demonstrar, antes de tudo, a sua existência e depois, também, em esclarecer a sua verdadeira natureza, determinando com precisão as suas correlações com o intelecto e com as outras faculdades da alma. Também ele, como Clemente, dá muita importância ao argumento das conseqüências absurdas. Contra aqueles que sustentam que a vontade humana se move por ação das necessidades, São Tomás escreve: "Essa opinião deve ser contada entre aquelas alheias (extraneas) à filosofia, porque não é somente contraditória à fé, mas subverte também todos os princípios da filosofia moral. De fato, se nós partirmos para a ação, necessariamente, se suprime a deliberação, a exortação, o comando, o louvor e a reprovação, que são coisas pelas quais existe a filosofia moral... Tais opiniões, que destroem os princípios de alguma parte da filosofia, dizem-se posições extravagantes (positiones extraneae), como a afirmação de que nada se move, a qual demole os alicercer da ciência natural". Contra os que afirmam que as ações humanas são determinadas pelos outros, São Tomás faz a seguinte declaração, muito aguda: "A nenhum ser é dada em vão uma faculdade. Logo, o homem tem a faculdade de julgar e de refletir sobre tudo quanto pode operar, seja no uso das coisas exteriores, como no favorecer ou rejeitar as paixões internas; e isso seria inútil se o nosso querer fosse originado pelos astros e não pela nossa faculdade. Não é, portanto, possível que os astros sejam causa da nossa eleição voluntária". Mas a razão mais profunda com que São Tomás justifica a presença da liberdade na determinação das ações humanas é outra e tem como base a possibilidade que o homem tem de avaliar os limites e as carências das coisas que se oferecem à sua atenção e, conseqüentemente, de repeli-las. Eis o seu fino raciocínio: "A eleição humana não é necessária. E isso porque nunca é necessário o que pode não ser. Ora, pode-se demonstrar que é coisa indiferente eleger ou não partindo das faculdades de querer, ou de cumprir, esta ou aquela coisa. E disso temos a confirmação na mesma estrutura da razão humana. De fato, a vontade pode tender para as coisas que a razão aprende sob aspecto de bem. Ora, a razão pode considerar como bem não somente o querer e o agir, mas também o não querer e o não agir. Além disso, em todos os bens particulares a razão pode observar o aspecto bom de uma coisa, ou as suas carências de bem, que se apresentam como um mal; e, com base nisso, pode considerar cada um de tais bens como digno de eleição ou de fuga. Somente o bem perfeito, ou seja, a felicidade, não pode ser considerado pela razão como um mal ou um defeito. E é por isso que o homem, por necessidade, quer a beatitude e não pode querer a infelicidade e a miséria. Mas a eleição não tem por objetivo o fim, mas os meios; não diz respeito ao bem perfeito, ou seja a beatitude, mas aos outros bens pariculares. Por isso, o homem não cumpre uma eleição necessária, mas livre" (Summa Theologiae, I-II).

Emanuel Kant (1724-1804)

Kant sustenta que a razão na sua função teórica nada possa dizer de definitivo sobre o problema da liberdade, porque ele diz respeito à realidade como é em si mesma, enquanto o objeto próprio da razão teorética são os fenômenos. Kant afirma também que na sua função prática, ou seja, como fonte da moralidade, a razão não pode absolutamente prescindir da liberdade, porque "sem liberdade... não é possível uma lei moral, tampouco uma imputação segundo essa lei". De fato, "os dois conceitos (moral e liberdade) são interligados tão inseparavelmente, que a liberdade prática se poderia também definir mediante a independência da vontade de toda outra coisa, menos da lei moral". Mas, então, se pode provar a existência da liberdade? Não, podemos somente postulá-la. "A liberdade de uma coisa eficiente, especialmente no mundo sensível, não pode ser de modo algum conhecida quanto à sua possibilidade (e, por isso, muito menos quanto à sua existência): somos bem afortunados se podemos ser suficientemente seguros apenas de que não há nenhuma demonstração da sua impossibilidade, e se mediante a lei moral que postula essa possibilidade, somos constrangidos a admiti-la precisamente por isso, também justificados para assim o fazer".

Jean-Paul Sartre (1905-1980)

Entre os autores do nosso tempo, o que afirmou com mais vigor a existência da liberdade foi Sartre. Segundo o célebre existencialista francês, "o homem está condenado a ser livre... A escolha é possível em algum sentido, mas o que não é absolutamente possível é não escolher.

Eu posso sempre escolher, mas devo saber que se não escolho, ainda assim eu escolho".

O que mais distingue os homens dos outros seres é a consciência. Tem-se assim a impressão de que para Sartre a consciência é o constitutivo último essencial do homem. Pode ser verdade, mas Sartre não o diz; ele prefere afirmar que a essência do homem é a liberdade. Para sermos mais precisos, Sartre diz que aquilo que constitui (produz) a essência do homem é a liberdade, não vice-versa. Com isso ele se opõe à concepção tradicional, que via na liberdade uma das propriedades da essência humana e que tinha uma prioridade ontológica sobre elas. Sartre é de opinião que esta concepção não explica como os indivíduos, usando a sua liberdade, formam personalidades tão profundamente diferentes; uns se tornam santos, outros assassinos; uns avaros, outros pródigos; uns doutos, outros analfabetos. A personalidade, com todas as características da existência (essência) individual, é produzida pela liberdade, na qual é necessário, portanto, fazer consistir o constitutivo fundamental do ser humano.

Como constitutivo último, a liberdade não tem limites. "Eu estou condenado a ser livre. Isso significa que não se pode encontrar para a minha liberdade nenhum limite que não seja ela mesma; ou, se se preferir, que não temos a liberdade de deixarmos de ser livres".

A liberdade não está vinculada a nenhuma lei moral; a sua única norma é ela mesma. Para a liberdade "todas as atividades são equivalentes... No fundo é a mesma coisa embriagar-se na solidão ou conduzir os povos. Se alguma dessas atividades é superior a uma outra, não o é por causa do seu escopo real; e neste caso o quietismo do ébrio solitário é superior à vã agitação do condutor de povos".

Natureza da liberdade

Para compreender a natureza da liberdade, é necessário antes de tudo estabelecer de que maneira se desenvolve o ato livre. Por exemplo, quando escolho ler um livro antes da fazer qualquer outra coisa, como chego a essa determinação?

São Tomás e muitos outros autores distinguem no ato livre três momentos principais:

- deliberação: é a fase da exploração, da procura, da indagação a respeito do objeto por adquirir ou da ação por cumprir;

- juízo: é a fase de avaliação;

- eleição: é a fase da decisão.

Geralmente entre as três fases a distinção é muito clara, mas, de qualquer modo, as três fases são muito vizinhas, quase que juntas.

O ato livre exige, antes de tudo, que se conheça o que se quer fazer e, portanto, implica num exame cuidadoso da ação que se quer cumprir ou do objeto que se quer alcançar. É o que fazemos normalmente. Se, por exemplo, nos vem à mente adquirir um microcomputador, informamo-nos do que se trata, se é bom, quanto custa, etc. Adquiridas suficientes informações, avaliamos os prós e contras: se vale a pena ou não, adquirir aquele microcomputador. Mas também a avaliação positiva não comporta ipso facto o cumprimento da ação ou da escolha do objeto, porque se pode tratar ainda de uma avaliação abstrata, que não me diz respeito neste determinado momento. Para que após o juízo se siga a escolha, é necessário que o juízo seja um juízo prático. Deve valer a pena naquele momento. Se o juízo assume essas características, então emite o ato de escolha.

O ato livre, que conclui na escolha, é um ato complexo, resultado de um diálogo entre o intelecto e a vontade. De fato, na escolha "concorrem um elemento de ordem cognitiva e um elemento de ordem apetitiva: da parte da potência cognitiva requer-se o conselho, com o qual se julga qual a escolha preferida; por outro lado, da parte da potência apetitiva, solicita-se que seja aceito mediante o desejo da mesma forma com é julgado mediante o conselho". Por essa razão Aristóteles deixa suspensa a questão de se a escolha pertence mais à faculdade cognitiva ou à apetitiva. Diz que a colha é "ou uma intelecção apetitiva ou um apetite intelectivo". Também São Tomás pensa que o ato livre pertença substancialmente à vontade, mesmo dependendo essencialmente também do intelecto. Eis o seu raciocínio a esse respeito: "O termo escolha implica elementos que cabem à razão ou ao intelecto, e elementos que cabem à vontade... ora, se dois elementos concorrem para formar uma coisa, um deles é o elemento formal com relação ao outro. E, na verdade, São Gregório de Nissa afirma que a eleição ‘por si mesma não é o apetite e também não é o único conselho, mas a sua combinação. Como dizemos que o animal é composto de alma e corpo, não de corpo ou de alma separadamente’. Ora, é preciso considerar que um ato da alma que pertence substancialmente a uma dada potência ou a um dado hábito, recebe a forma e a espécie de uma potência e de um hábito superior na proporção em que o inferior é subordinado ao superior; se um, por exemplo, cumpre um ato de força por Deus, materialmente o seu ato é um ato de força, formalmente de caridade. Ora, é evidente que a razão é, de algum modo, superior à vontade e que ordena os seus atos, ou seja, enquanto a vontade tende ao próprio objeto segundo a ordem de razão, pelo fato de que a faculdade de conhecer apresenta à apetitiva o próprio objeto. Assim, então, o ato com o qual a vontade tende para alguma coisa que lhe é proposta como bem, sendo ordenado pela razão para um fim, materialmente é ato de vontade, formalmente da razão. Efetivamente, a substância do ato se comporta como matéria relativamente à ordem imposta pela potência superior. Por esse motivo, a escolha, substancialmente, não é um ato da razão, mas da vontade; de fato, a escolha consiste em um movimento da alma em direção ao bem escolhido. Logo, é claro que ela é um ato de potência apetitiva" (Summa Theologiae, I/II).

Limites da liberdade

Um dos aspectos mais originais de Jean-Paul Sartre é a tese do poder infinito, ilimitado da liberdade. Essa tese singular encontra apoio muito fraco entre os filósofos. São, no entanto, muito numerosos os que sustentam que a vontade humana não é nunca livre, mas sempre determinada. Essa tese é, também, refutada por uma ampla série de argumentos difíceis de serem contestados.

O homem é livre, mas não totalmente livre como quer Sartre. Que a liberdade humana seja limitada resulta dos seguintes argumentos:

- A liberdade não se identifica com o ser do homem, mas constitui uma propriedade fundamental dele, junto com outras propriedade também fundamentais como o viver, o pensar, o trabalhar. Por isso também a liberdade é sujeita aos mesmos limites aos quais são sujeitos o viver, o pensar e o trabalhar, porque é por eles condicionada.

- O homem não é livre de ser corpóreo, sociável, sexuado, etc. Não é livre de usar a linguagem a seu bel-prazer, do contrário a linguagem não alcança mais o seu objetivo, que é o da comunicação com os outros. Para alcançar este resultado, deve-se usar a linguagem conforme os significados que lhe foram impostos e seguindo as regras estabelecidas.

- O homem não é livre de inclinar-se em direção ao bem: seria o suicídio da vontade e do seu ser, porque, como o intelecto tende naturalmente para a verdade, a vontade tende naturalmente para o bem. A tendência da vontade para o bem é necessária, mas natural e não forçada. A liberdade exerce-se no interior do horizonte da tendência natural em direção ao bem.

- O homem não pode subtrair-se a uma certa dependência do mundo, da sociedade e da história. O peso do mundo, da sociedade e da história sobre os indivíduos é tão óbvio e tão grave que alguns filósofos e sociólogos estão hoje mais propensos a denunciar o estado de profunda escravidão que se encontra a humanidade presente, em vez de exaltar a sua liberdade, como faz Sartre. Na Antigüidade e na Idade Média o maior obstáculo à liberdade humana era representado pelos "determinismos cósmicos", hoje, ao contrário, é constituído pelos "Determinismos sociais".

- A liberdade humana, enfim, é condicionada pelas paixões. Esse último condicionamento foi sempre tomado em consideração pelos filósofos.

Podemos encontrar tratados sobre paixões em todos os períodos da história da filosofia, tanto no grego e no medieval como nos modernos e contemporâneos. Este fato basta sozinho para testemunhar o quanto é importante uma indagação sobre as paixões, a fim de estabelecer em que medida elas podem condicionar no homem o exercício da liberdade.

Conclusões

Dissemos na introdução do nosso artigo que, liberdade é um termo que usamos a todo instante, mas não conhecemos o seu significado com a devida profundidade. Isto pode ser constatado ao longo da exposição que fizemos sobre o tema.

Constatamos, ainda, a complexidade do termo e sua evolução em diferentes épocas. A cada nova concepção filosófica o entendimento foi se modificando, resultando na compreensão de que a concepção de Liberdade nos tempos atuais difere, substancialmente, da concepção que os nossos irmãos maçons, do século XVIII, tiveram em sua época.

Sabiamente os nossos rituais e os preâmbulos das Constituições maçônicas, estabelecem que a Maçonaria é, ou pelo menos deveria ser, uma Instituição progressista e evolucionista, cabendo, portanto, aos maçons o dever de pesquisar e estudar todos os assuntos e questões a ela pertinentes, para não ficarem defasados no tempo e no espaço e, especialmente, nos conceitos.

Bibliografia:

CASTELLANI, José. Dicionário etimológico maçônico. Londrina: A Trolha, 1991. v. 3.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da Língua Portuguesa. 2a ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
GABRIEL L. Uomo e mondo in decisione. Turim: Marieti, 1972.
KANT, I. La critica della ragion pratica. Laterza: Bari, 1924.
MONDIN, Batista. Curso de filosofia. São Paulo: Edições Paulinas, 1981. 3 v.
MONDIN, Batista. O homem, quem é ele?. São Paulo: Edições Paulinas, 1980.

(*) O Irm. Anatoli Oliynik, é membro da Academia Paranaense de Letras Maçônicas e Academia de Cultura de Curitiba.

Fonte: JBNews - Informativo nº 152 - 26/01/2011

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