ZOROASTRO
(Desconheço o autor)
Todos os anos, na época em que os dias se tornavam mais longos, das regiões mais distantes do mundo conhecido partiam caravanas — burros de carga da Anatólia e da Trácia, comboios de camelos da Bactriana e da Arábia, exércitos de carregadores do grande oásis formado pelo vale do Indo. Todos tinham o mesmo destino e transportavam tributos, sob a forma de pedras e metais preciosos, ébano, marfim, peles de animais raros e tecidos valiosos. Alguns grupos conduziam animais: antílopes da Líbia ou garanhões da Armênia. Os babilônios levavam um carregamento particularmente exótico — quinhentos jovens eunucos.
Vindos de todas as partes do império, esses cortejos avançavam com rapidez por uma excelente rede de estradas a fim de, pouco antes do equinócio da primavera chegar a Persépolis — um deslumbrante e monumental complexo de palácios e fortalezas erguidos no empoeirado e elevado planalto iraniano. Em Persépolis, emissários de todos os estados pertencentes ao império persa entregariam seus "presentes" de ano-novo — a quantidade exata e a natureza dos tributos anuais haviam sido estipuladas pelo governo imperial — ao seu regente supremo, o Rei da Pérsia, o Grande Rei, o Rei dos Reis, o soberano mais poderoso na face da Terra. Ninguém jamais controlara território tão vasto ou tanta riqueza. No apogeu do império, por volta do início do século IV a.C., o domínio persa atingia 5 milhões de quilômetros quadrados de montanhas e estepes, imensos desertos e férteis planícies fluviais.
A lenda persa narra como, muitas centenas de anos antes do nascimento de Cristo, um grande profeta apareceu. O povo dava-lhe o nome de Zaratustra; mas os gregos que não suportavam a ortografia dos "bárbaros", chamavam-lhe Zoroastro. A concepção de Zaratustra era divina: seu anjo da guarda entrara na planta haoma e passara com a seiva para o corpo de um sacerdote, quando este oferecia um sacrifício divino; no mesmo instante um raio de glória celeste entrou no seio de uma virgem de alta linhagem. O sacerdote desposou a virgem, o anjo assimilado pelo seu corpo misturou-se com o raio aprisionado — e surgiu Zaratustra.
Começou rindo alto no próprio dia do nascimento, e os espíritos maus que costumam reunir-se em torno de cada nova vida fugiram dele em tumulto e terror. Seu grande amor à sabedoria fê-lo afastar-se da sociedade dos homens e ir viver no agreste das montanhas, alimentando-se de queijo e frutos da terra. Tentou-o o Diabo, mas sem vantagem. Seu peito foi varado por uma espada, e suas entranhas enchidas de metal derretido; ele não se queixou e ainda mais se aferrou à fé em Ahura-Mazda — o Senhor da Luz, Deus Supremo. Ahura-Mazda manifestara-se a Zoroastro numa visão, revelando-se como a divindade suprema, onisciente e onipotente e pôs-lhe nas mãos o Avesta, ou Livro da Ciência e da Sabedoria, mandando que o pregasse ao gênero humano. Por muito tempo o mundo escarneceu dele e o perseguiu; mas por fim um alto príncipe da Pérsia — Vishtaspa ou Histapes — ouviu-o com alegria e prometeu-lhe espalhar a nova fé. Assim nasceu a religião de Zoroastro. Zaratustra viveu vida longa, sendo consumido por um raio e subido até o Céu. Não se pode dizer o que há de verdadeiro nesta lenda; os gregos aceitaram-na como história, honraram-na e deram-lhe uma antiguidade de 5500 anos antes da era grega; os historiadores modernos admitem a existência de Zaratustra entre os séculos X e VI a.C. Quando Zaratustra apareceu, encontrou o povo na adoração de animais, de ancestrais, da terra e do sol, numa religião com muitas deidades em comum com os hindus da idade védica.
As principais divindades desta fé pré-zoroastriana foram Mitra, deus do Sol; Anaita, deusa da fertilidade e da terra, e Haoma, o deus-touro que, vivendo, voltou de novo e deu à Humanidade seu sangue como bebida destinada a conferir imortalidade; os primitivos persas o adoravam embriagando-se com o suco da erva haoma. Zaratustra sentiu-se desagradado dessas deidades primitivas e daqueles rituais; rebelou-se contra os sacerdotes que o serviam; e com ímpeto anunciou ao mundo um deus único — Ahura-Mazda, Senhor da Luz e do Céu, do qual todos os outros deuses não passavam de manifestações e qualidades. Talvez Dario I, que aceitou a nova doutrina, visse nela uma fé capaz de inspirar o povo e fortalecer o seu governo. A partir do acesso ao trono, Dario I declarou guerra aos velhos cultos e seus sacerdotes, fazendo do zoroastrinismo a religião do Estado.
A bíblia da nova fé consistia numa coleção de livros em que os discípulos do Mestre haviam juntado todas as suas palavras e preces. Mais tarde este livro recebeu o nome de Avesta, e devido ao erro de um erudito o mundo ocidental o conhece como o Zend-Avesta. (Anquetil Duperron introduziu o prefixo zend, que os persas haviam usado para denotar apenas uma tradução e interpretação do Avesta).
De acordo com a tradição sagrada, duas cópias foram feitas pelo príncipe Vihtaspa; uma foi destruída quando Alexandre incendiou o palácio real de Persépolis; outra foi levada pelos gregos vitoriosos e, traduzida na Grécia (dizem os persas), proporcionou aos gregos todo o conhecimento científico que demonstraram. No século III da Era Cristã, VologesoI, rei persa da Dinastia Arsacid, ordenou que se procedesse ao colecionamento de tudo quanto subsistia em escrito ou na memória dos fiéis; esta coleção fixou a forma atual do avesta e se tornou a religião oficial do Irã. Durante a conquista muçulmana no século VII a obra sofreu nova devastação.
Como nosso Antigo Testamento, o Avesta trata-se de uma composição bastante eclética. Alguns trechos mostram a influência babilônica na história da Criação do mundo em seis períodos (céu, água, terra, plantas, animais, e homens); na descendência do homem de um casal primitivo, no estabelecimento de um paraíso, no descontentamento do Criador com a criatura, e na destruição desta por meio de um dilúvio. Mas os elementos especificamente iranianos bastam para caracterizar o todo: o mundo é concebido em termos dualísticos, como palco de um conflito entre o deus Ahura-Mazda e o diabo Ahrimã; a pureza e a honestidade são as maiores virtudes e levam à vida eterna.
O deus de Zoroastro foi primeiramente "o total círculo dos céus". Ahura-Mazda "vestia-se com a abóbada do firmamento (....) seu corpo é a luz e a glória soberana; o Sol e a Lua são seus olhos". Como Criador e senhor do Mundo, era assistido por uma legião de divindades menores originariamente descritas sob a forma de forças naturais — fogo e água, sol e lua, vento e chuva.
Zoroastro interpreta Ahura-Mazda como tendo sete aspectos ou qualidades: Luz, Bom Espírito, Justiça, Domínio, Piedade, Bondade e Imortalidade. Seus seguidores interpretavam esses atributos como pessoas, ou as imortais criaturas sagradas que, sob a chefia de Ahura-Mazda, criaram e dirigem o mundo. Em adição a esses sagrados espíritos haviam os anjos da guarda, um para cada criatura. Mas do mesmo modo que esses anjos e os sagrados seres ajudavam os homens na virtude, assim também sete espíritos maus pairavam no ar, sempre induzindo os ao crime e ao pecado, em guerra eterna contra Ahura-Mazda e todas as formas de justiça. O chefe desses diabos era Ahrimã. Príncipe das Trevas e rei do mundo subterrâneo, protótipo daquele operoso Satã que os judeus tomaram dos persas e legaram ao Cristianismo. Foi Ahrimã, por exemplo, quem criou as serpentes, as pestes, os gafanhotos, as formigas, o inverno, o escuro, o crime, a sodomia, a menstruação e outras pragas da vida; e foram essas invenções do diabo que arruinaram o paraíso em que Ahura-Mazda colocara o primeiro casal humano. Na religião de Zaratustra a alma do homem, como o universo, era o campo de batalha dos espíritos benéficos e maléficos. Mas, os seres humanos não eram meros peões no xadrez desta guerra cósmica; tinham livre arbítrio, podiam livremente escolher o caminho da luz ou da mentira. Porque Ahrimã equivalia à Mentira Viva e todos os mentirosos eram seus servidores.
Por algum tempo, sob Dario I, essa fé se tornou a expressão espiritual na Pérsia no apogeu. Mas a humanidade prefere poesia a lógica, e sem mitos um povo perece. Por baixo da adoração oficial de Ahura-Mazda, os cultos de Mitra e Anaita — deus do sol e deusa da vegetação, da geração e do sexo — continuaram a encontrar devotos, e nos dias de Artaxerxes II os nomes desses deuses já aparecem nas inscrições. Em seguida a adoração de Mitra cresceu poderosamente enquanto o de Ahura-Mazda declinava, até que nos primeiros séculos da nossa Era, o culto de Mitra, como um divino jovem de radiante aparência, de halo solar sobre a cabeça, espalhou-se pelo Império romano e contribuiu para dar o Natal ao Cristianismo. (O Natal era originariamente uma festa solar que celebrava, no Solstício de Verão (22 de dezembro), o alongamento dos dias e o triunfo do sol sobre os seus inimigos. Tornou-se um dia santo mitráico e finalmente, o Natal dos cristãos.
Tanto Mateus como Lucas colocam o nascimento de Jesus “nos dias em que Herodes era o rei da Judéia”. Mateus e Lucas aceitam Jesus como nascido em Belém, ao sul de Jerusalém; de lá, dizem eles, a família mudou-se para Nazaré, na Galiléia. Marcos não faz menção de Belém mas chama Jesus, simplesmente, de “Jesus de Nazaré”. Nada se sabe do dia certo de seu nascimento. Clemente de Alexandria cita várias opiniões a respeito; alguns cronologistas põem o nascimento de Jesus no dia 19 de abril, outros em 20 de maio; e Clemente, em 17 de novembro do ano 3 a.C. Lá pelo século II, os cristãos orientais celebravam o Natal no dia 6 de janeiro, nas igrejas ocidentais, incluindo as de Roma, celebrava-se o Natal a 25 de dezembro. As igrejas orientais permaneceram no 6 de janeiro e acusaram suas irmãs ocidentais de adoração do sol e idolatria, afirmando que elas estavam comemorando o natalis invicti solis, o aniversário do sol invencível, segundo elas, data central da festa do mitraísmo. Mas no fim do século IV o 25 de dezembro foi adotado também no Oriente.
O zoroastrismo sofreu inúmera modificações no decorrer dos séculos, e seu monoteísmo essencial acabou minado por uma hierarquia cada vez maior de santos e demônios. Mas a essência abstrata do zoroastrismo afetou profundamente o pensamento religioso do Oriente Médio. Ela influenciou os escribas judeus que, na Babilônia, estavam editando os antigos textos da Lei Mosaica, proporcionando-lhes novos conceitos de céu e inferno e inspirando-os com um novo sentido de responsabilidade individual perante um deus único e verdadeiro.
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