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sexta-feira, 15 de março de 2019

SESSÕES MAÇÔNICAS DESMOTIVADORAS

SESSÕES MAÇÔNICAS DESMOTIVADORAS*
Ir∴ André Luis Ferreira Dutra – Curitiba-PR

Dentre o vasto universo de temáticas sobre as quais deve um Mestre Maçom se debruçar, a fim de ampliar e, mesmo, aprofundar o estudo, a compreensão, o conhecimento maçônico, é de grande relevo a questão pertinente a qualidade das sessões maçônicas que conduz, não permitindo que se tornem desmotivadoras.

Neste sentido, é curioso observar e constatar como algumas “Verdades” – assim mesmo, com inicial maiúscula no meio da frase – incomodam muito mais do que outras.

Por exemplo, é verdade que nem sempre o Maçom – homem Iniciado– é um sujeito melhor, mais perfeito que o homem profano – não iniciado. Isto ocorre porque, infelizmente, a experiência da Iniciação não garante por si só ao Iniciado cruzar o umbral, deixando para trás suas imperfeições e asperezas. Esta verdade, contudo, não nos causa grande furor. Inclusive, podemos até classificá-la como uma “taxa de depreciação do estoque”. Em outras palavras, de um universo relativo de homens chamados a integrar a Arte Real, um determinado percentual, quase como uma regra, não poderá ser aproveitado. Algo com uma precisão matemática. Estatístico até.

Entretanto, o mesmo não acontece se algum Irmão visitante nos chama de lado, discretamente e meio constrangido, e nos diga que achou nossos trabalhos desmotivados. A reação de cólera é imediata. Mesmo que concordemos com ele, ou que vislumbremos um mínimo de plausibilidade em sua fala, não conseguiremos aceitar. Desmotivadora?

Quem é esse profano de avental para julgar nossos trabalhos? Desmotivadora coisa alguma. E seguimos desfiando mentalmente todo um rosário de maledicências àquele pobre coitado que ousou ser sincero e amigo. Pois amigo verdadeiro Irmão Maçom, é aquele que diz o que precisamos ouvir ao invés de se restringir aos “tapinhas nas costas”, risos forçados, falsidade de todo gênero, enquanto aprecia ruidosamente a cerveja gelada servida nos tão esperados “ágapes fraternais”.

Entretanto, tal assertiva, “sessões maçônicas desmotivadoras”, deveria por si só, causar grande alvoroço. Enorme desconforto. Desmedida indignação. Fico a imaginar aqueles Irmãos de estadia mais longeva “Entre Colunas”, injuriados. Tomado de um indisfarçável rubor nas faces. Não de vergonha. Mas de brios feridos ante uma “imperdoável heresia”.

Heresia, sim. Uma sessão maçônica não poderia jamais cair na mesmice.

No chove não molha. Primeiro, em razão de que a quantidade de temas e símbolos específicos de cada um dos três graus simbólicos é suficiente para tornar o período de um ano demasiadamente curto para seu estudo. Mesmo para as Lojas que trabalham toda semana.

Segundo, porque se os Maçons se consideram os melhores indivíduos na sociedade, como podem se conformar em comparecer semana após semana em lojas apenas para ouvir o som seco do martelo?

Entretanto, infelizmente para nós, estamos diante de uma inegável realidade. Cada dia mais, as sessões maçônicas estão se tornando vazias. Sem sentido. Sem propósito. Semana após semana, repetem-se as mesmas batidas surdas do martelo, sobre a madeira fria das mesas, chamada por muitos de altares.

O que se vê é uma espécie de encenação repetida “monotônica”. Algo semelhante a idéia do chamado “eterno retorno”. Numa semana o Primeiro Vigilante fecha a Loja, no caso do REAA, e o Venerável Mestre encerra os trabalhos para mecanicamente reabri-los na semana seguinte. Então se repetem intermitentemente ao longo do ano a abertura da Loja, leitura do balaustre, expediente, saco de propostas e informações. Segue-se com a interminável ordem do dia, onde são debatidos sempre os mesmos assuntos. Sem que seja dado qualquer encaminhamento novo.

Seja porque tem um Irmão ausente, seja porque o Tesoureiro não recebeu o “AR” confirmando o recebimento da prancha pelo Irmão “X” ou “Y”, ou ainda, o Irmão Secretário não encaminhou a prancha ao Grande Oriente no prazo.

Finda a ordem do dia, “dado o avançado da hora”, suprime-se o tempo para instrução, afinal o importante é o ágape, a Loja dois. Resolvidos os assuntos administrativos, o que importa é o churrasco, a janta, a cerveja. Ou, com certa recorrência, preenche-se o tempo de instrução com a leitura de uma peça de arquitetura elaborada pelo Irmão Fulano de Tal, do qual nunca se ouviu falar, mas que está encartada na mais recente edição de alguma revista maçônica, nem sempre conhecida ou de qualidade reconhecida. Faz-se a leitura e, logo depois do depósito – ou não do óbolo no Tronco de Beneficência, alguns incautos atrevem-se, na palavra a bem da ordem, a agradecer e parabenizar, sem qualquer entusiasmo ou sinceridade, o irmão leitor pela brilhante peça.

Não sei se todos perceberam a sutileza da idéia acima esboçada. Qual seja a de que “preenche-se o tempo de estudos”. Ora, preenche-se apenas o vazio. O desocupado. A lacuna. O oco.

O desprovido de algo melhor. Como é possível que uma Loja maçônica consiga fazer o tempo de estudos um imenso vazio?

De todo modo, segue o baile. Com mais alguns momentos de comentários ora interessantes, ora meramente para satisfação daquele que fala, chega-se ao final da sessão. Quando essa foi rápida, o Venerável Mestre procede ao encerramento ritualístico. Do contrário, dá-se uma forte pancada com o malhete sobre a mesa e tem-se por encerrados os trabalhos.

Boa janta a todos e até a próxima semana.

Sem revolta. Sem sentimentos de injúria ou contrariedade. Não há brios feridos. Não há vergonha. Há, isto sim, muito apetite. Muita sede. Infelizmente, não de conhecimento.

Entretanto, para alegria e júbilo de uns poucos, nem tudo está perdido. Sempre hão de existir os “Dom Quixotes”. Seres intrépidos. Destemidos. Temerários. Que não se darão por satisfeitos mesmo que as sessões ocorram de acordo com as nossas leis. Para estes, as sessões para serem justas precisam ser perfeitas. Bem executadas no ponto de vista ritualístico. Sem desperdício de tempo com questões administrativas, que podem e devem ser definidas fora da Loja. Sessões que primem pelo Tempo de Instrução. Assim, de modo genérico mesmo. Tempo. Indeterminado. O necessário. E não pelo quarto de hora de instrução. Fechado. Curto. Estreito.

Intrigado, muitas vezes me flagro em conjecturas e devaneios vários e me parece que muitos não conseguem enxergar o obvio: as sessões maçônicas só são desmotivadoras, quando seus condutores são desmotivados. Quando se deixam dominar pelo burocratismo.

Quando agem profanamente dentro do Templo. Quando suas paixões dominam suas virtudes.

Aprendizes e Companheiros são homens ainda sedentos de informações, de conhecimento. Por isto mesmo, costumam ser encarados como “problemas” por muitos pretensiosos Mestres. E isto se deve, muitas vezes, ao fato de que em muitas Lojas, apenas estes, Aprendizes e Companheiros, conseguem manter acesa a chama maçônica da busca constante e infindável da verdade, conseqüentemente, do conhecimento.

Por isto falei em brios. Em sentir-e injuriado. Numa referência aos Maçons verdadeiros, Mestres no melhor sentido do termo. Motivadores e inovadores. Fieis condutores do trabalho de edificação do templo social à Gloria do Grande Arquiteto do Universo. Homens de conhecimento muitas vezes apenas médio, razoável, mas firmemente voltados à realização da Grande Obra. Afinal, a genialidade é dispensável ao trabalho. O que não pode faltar é a vontade para empunhar o Malho e a inteligência para posicionar o Cinzel.

E mãos à obra.

*Texto extraído das pp. 24-25 – Revista A Trolha nº 298– Agosto/2011

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