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quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

MAÇONARIA CONSERVADORA VS. MAÇONARIA PROGRESSISTA

MAÇONARIA CONSERVADORA VS. MAÇONARIA PROGRESSISTA
J. Filardo

A campanha eleitoral do ódio de 2014 e novamente em 2018, no Brasil, nos leva à reflexão sobre posições ideológicas em todos os campos, inclusive no universo da Ordem Maçônica.

As redes sociais encheram-se de manifestações raivosas vazadas em expressões inadequadas para um cidadão civilizado e muito menos para um maçom que se tem como esclarecido e selecionado como melhor entre os melhores.

O que se espera de um maçom?

As respostas “dominar minhas paixões”, “desbastar a pedra bruta”, “ajudar a humanidade” soam absolutamente vazias diante das reações testemunhadas nessas campanhas eleitorais. Perfilando-se com as forças mais retrógradas e reacionárias e com candidatos fascistas, os maçons brasileiros diminuíram a Maçonaria a uma facção e estiolaram sua universalidade, o que é lamentável.

Mas, quem estuda a história da humanidade em geral e da maçonaria em particular não se surpreende, visto que suas origens determinam sua trajetória atual.

Rememoremos.

A Maçonaria foi uma franquia em forma de clube inventada em 1717 pelos iluministas membros da Royal Society de Londres, que encomendaram aos pastores Anderson e Desagullier uma formatação adequada de Grande Loja que se arvorava em central consolidadora e autoridade única para a emissão (onerosa) de cartas constitutivas e cobrança de taxas dos franqueados. Uma iniciativa que tinha razões de Estado, visto que o Establishment da época precisava de uma linha de suporte às pretensões do pretendente protestante que tinha menos direito ao trono inglês que o pretendente católico escocês James Stuart.

Sendo fruto das cabeças iluminadas que foi, era uma invenção genial no tratamento inovador da abordagem política e religiosa, totalmente destoante do espírito medieval vigente. Em seu papel de suporte ao status quo, assumiu o caráter conservador (propondo a volta de uma instituição que não tinha mais lugar – a guilda), ela propunha como objetivo o aperfeiçoamento pessoal através de uma ascensão aos degraus da hierarquia, uma convivialidade combinada com networking (oferecia ao homem comum, a possibilidade de privar da companhia dos nobres) e preconizava a beneficência interna corporis e também voltada para a comunidade. Instrumentalizada como ferramenta de ponta no imperialismo britânico, viu-se difundida pelos quatro cantos da terra, onde alcançava a mão pesada do colonialismo. Inserida em um ambiente onde religião e política não se distinguiam, preconizavam a proibição da discussão desses dois assuntos.

Contemporaneamente, surge o Rito Escocês, uma criação francesa inventada para atender à corte escocesa exilada na França que tinha como característica, diferentemente da Maçonaria autêntica, ou seja, baseada na instituição das guildas de pedreiros, uma mitologia de origem diferente da mitologia inventada para o Craft na Inglaterra. O Rito Escocês afirmava ter sua origem nos cavaleiros templários que retornaram de Jerusalém. Essa ordem de cavalaria também se apropria dos graus simbólicos do Craft e representa como ele uma vertente conservadora.

Também na França, fruto do espírito esclarecido dos franceses, a Maçonaria é reinventada, resgatando os valores da franquia original de 1717, principalmente no que se refere à religião dos maçons. Todavia, diferentemente da abordagem endógama e conservadora do Craft inglês, a Maçonaria francesa adota o ideário da revolução e se arvora em defensora do secularismo de estado e dos valores da República francesa. Surge uma Maçonaria voltada para fora e que tem um papel progressista na sociedade.

Ficaram assim bem divididos os dois campos: os ingleses preconizando a Maçonaria Conservadora e os Franceses preconizando a Maçonaria progressista que evoluirá até se transformar na Maçonaria Liberal que temos atualmente na França.

Abaixo do equador a situação se complica.

A Maçonaria surge com DNA francês, combativa, interventora e protagonista. Mas, ao mesmo tempo já abrigava em si as forças retrógradas e conservadoras, representadas pelos Andradas. Estes lutam contra a vontade republicana de Gonçalves Ledo até fazer valer sua força. E desde então a Ordem no Brasil convive com essa herança híbrida: uma estrutura que se quer neutra, onde a discussão política é proibida e que, ao mesmo tempo, atua politicamente na sociedade, quase como um “shadow cabinet” nas comunidades onde se insere. Mas sempre com um viés conservador.

As obediências transformam-se em “one-stop-shop” onde o freguês pode encontrar o modelito de maçonaria que quiser: escocês, templário, mais religioso, menos religioso, com medalhas, sem medalhas. Com isso, diferentemente da franqueadora inglesa, perdem o foco e transformam-se em instituições fracionadas e ingovernáveis, prejudicando o posicionamento em momentos históricos cruciais.

Nesses ano de 2015, 2016, 2017 e 2018 no Brasil, testemunhamos manifestações de maçons absolutamente incompreensíveis à luz do ideário teórico da maçonaria. Maçons cerraram fileiras com grupos desprezíveis que apresentavam reivindicações vergonhosas até mesmo para um cidadão comum.

Testemunhamos algo que jamais aconteceria na França, por exemplo, onde a Maçonaria vai às ruas e se manifesta pela ordem constitucional do país e jamais contra os ideais da República.

A Maçonaria deve ser contra a corrupção? Claro, mas essa oposição deve levar em conta todo tipo de corrupção, de governantes da esquerda e da direita; de juristas conservadores e liberais. Não pode ser seletiva nem pode ser usada como cortina de fumaça para ocultar um posicionamento político que não se tem a coragem de declarar.

A maçonaria conservadora impede a discussão em loja e o aperfeiçoamento intelectual e político dos irmãos. Limita-se à prática limitada do ritual e ao networking consequente da condição de maçom.

A maçonaria progressista no Brasil é a minoria da minoria e não tem a menor condição de influenciar os acontecimentos tanto interna corporis quanto na sociedade.

O resultado é a inércia, a paralisia e a frustração das expectativas dos candidatos e o encolhimento da instituição.

(Publicado inicialmente em 2015)

Fonte: https://bibliot3ca.com

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