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quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

A CÂMARA DAS REFLEXÕES

A CÂMARA DE REFLEXÃO (*)
(republicação)

É a lei: todo ser, antes de ver a luz, tem que se formar, enclausurado em ambiente de recolhimento. Só depois de ver a luz é que se inicia a sua aprendizagem e aperfeiçoamento, mercê de um processo contínuo, até que sobrevenha a morte material. Assim uns passam pelo ovo, pelo casulo; outros pela semente, pelo ventre materno. Assim também o Maçom, ainda profano, antes de ser iniciado, passa pela Câmara de Reflexões, o "útero " de sua Loja mãe.

Mergulhado na escuridão de sua ignorância, o profano vai ali meditar sobre a sua vida, tomando como padrões símbolos existentes naquele gabinete: o pão e a água; o enxofre, o sal e o mercúrio; a bandeirola "Vigilância e Perseverança"; os ossos, a caveira, a foice e a ampulheta; a sigla V.I.T.R.I.O.L.; as perguntas cujas respostas irão compor seu testamento.

Tal simbologia fundamenta-se toda no Hermetismo: trata-se da primeira fase da Grande Obra, a Putrefação, que não ocorre somente no interior do Ovo Filosófico, criação que não é apenas inerente ao homem, mas também e, principalmente, à natureza operante.

A Câmara de Reflexão, dessa forma, faz as vezes de útero, onde se dá a maravilha da criação, imediatamente antes da iniciação, que é o nascimento, o conhecimento da luz.

A grandiosidade da Criação Maçônica, que ocorre nessa câmara fechada e quase totalmente escura, é análoga à iniciação dos Essênios, identificando a união de Deus com a alma, como o princípio de toda a vida mística.

Há também a analogia dessa câmara com a Caverna Sagrada dos Templários, onde o ambiente tétrico e sinistro do "Clima do Norte" somavam-se emblemas da morte. E era na dicotomia gerada pelo Norte e o Meio-Dia que os Templários fundamentavam seu esoterismo, incutindo nos iniciados a existência de uma outra vida: "nada se perde, tudo se renova!".

Na Câmara de Reflexão, além dos símbolos já citados, o profano vê projetadas contra a parede negra as advertências de que a curiosidade não justifica a sua presença ali; de que o sentimento de medo deve fazê-lo retroagir; de que somente a perseverança o conduzirá das trevas para a luz.

O pão e a água são emblemas da simplicidade que há de orientar a trajetória do recipiendário prestes a iniciar-se. Não representam tão somente os alimentos do corpo, como também os do espírito, porquanto o trigo moldado pela água simboliza, segundo muitas crenças a carne do Deus sacrificado. 

É o alimento indispensável ao feto em desenvolvimento, é a mesma fonte de força que possibilitou Elias galgar o monte Oreb, energia que, da mesma forma, possibilitará ao iniciando vencer as provas a que será submetido é o maná que mobiliza a vontade de transpor o deserto da ignorância.

O Enxofre, o Sal e o Mercúrio sugerem os três princípios herméticos contidos em qualquer corpo: o Espirito; a Sabedoria e a Ciência; a ousadia e a Vigilância, posto que o mercúrio se materializa na figura de um galo. Este ser, itimorato por natureza, anuncia a chegada da Luz, ao mesmo tempo que se faz sentinela e guardião contra a influência profana.

A bandeirola, condutora das duas palavras "Vigilância e Perseverança" , faz saber ao futuro Maçom que, a partir daquele momento, ele deve permanecer atento e concentrar-se nos múltiplos significados sugeridos pelos símbolos, cuja compreensão só será conseguida através da paciência e da vontade.

Os ossos, a Caveira, a Foice e a Ampulheta são referências a Saturno, portanto ao chumbo-metal. Simbolizam a morte do profano transmudado para a vida espiritual a metamorfose do chumbo em ouro; é o despojamento do antigo homem que se prepara para um novo nascimento.

O "V.I.T.R.I.O.L." que acrescido de um "O" final significa sulfúreo, pedra ácida, pedra oculta e vulcânica do fundo da terra, condensa a frase latina: "VISITA INTERIORA TERRAE RECTIFICANDOQUE, INVENIES OCCUNTUM LAPIDEM (Visita o interior da terra e, retificando, encontrarás a Pedra Oculta).É o chamamento do eu profundo, à alma, através do silêncio e da meditação".

Respondendo sobre as obrigações, que deve a Deus. À Humanidade, à sua Pátria, à Família, a seus semelhantes e a si próprio, o profano procede ao testemunho de suas intenções filosóficas, contraindo assim uma prévia obrigação. Tal testemunho passa a ser seu testamento, pois, sabedor de sua morte para a vida profana, o iniciado naturalmente terá que fazer aquele juramento.

É nessa Câmara ou Caverna terrível, solene e escura, que se passa o primeiro momento em que se desvendam os olhos do recipiendário. Ali ele medita solitário sobre o que se vê, seu vigia é a morte, na qual ele deve pensar; não obstante, deve também pensar na nova vida uma vez que lhe são feitas perguntas sobre Deus, sua Nação, sua Família, o resto dos Homens e ele próprio.

Somente depois desta experiência maravilhosa, de vivenciar a primeira morte, o recipiendário estará pronto, para as demais provas.
(autor desconhecido)

(*) Publicado em 30/03/2014

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