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terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

O ANIMAL POLÍTICO

O ANIMAL POLÍTICO

Para Aristóteles, o homem é um animal político. Entenda por que esta máxima do filósofo de Estagira é uma das bases da Filosofia Política

Zoon Politikon (Animal Político) é uma expressão utilizada pelo filósofo grego Aristóteles de Estagira (384 a.C – 322 a.C), discípulo de a Platão, para descrever a natureza do homem – um animal racional que fala e pensa (zoon logikon) – , em sua interação necessária na cidade-Estado (pólis). O animal político aristotélico é um dos conceitos mais exaustivamente estudados na filosofia política e um dos argumentos fundamentais para a organização social e política.

Em uma definição sumária, sem firulas e rodeios filosofantes, pode-se afirmar que, para Aristóteles, o homem é um animal político na medida em que se realiza plenamente no âmbito da pólis. Segundo Aristóteles, a “cidade ou a sociedade política” é o “bem mais elevado” e por isso os homens se associam em células, da família ao pequeno burgo, e a reunião desses agrupamentos resulta na cidade e no Estado (Política, cap.I, Livro Primeiro). Todavia, esta rápida acepção carece de uma explicação detalhada, indispensável para uma melhor compreensão do termo. Até porque, bem sabemos, o autor de “Política”, “Ética a Nicômaco” e a “Magna Moralia” deixou-nos acima de tudo um legado de extremo rigor lógico que não pode ser jamais desconsiderado.

Para o filósofo de Estagira, o homem é tão capaz de “desejos” e “afecções” (vontade ou alma desiderativa) quanto está apto a adquirir inteligência (razão ou alma racional). Complexo, o homem é o único zoon com capacidade para agir orientado por uma moral, de modo que suas ações e juízos resultam ora em vício, ora em virtude. Mas o que define essa moral? Existe nela um conteúdo invariável?

Para começar a responder a essas indagações preliminares, é preciso resgatar um pensamento aristotélico que remete ao núcleo do modelo republicano: a sociedade precede o indivíduo. Em outras palavras, o todo precede a parte. Para Aristóteles, um homem incapaz de “viver em sociedade” ou alheio ao Estado é um “bruto ou uma divindade”. Em algumas edições de “Política”, a frase dele é assim traduzida: “O todo deve, necessariamente, ser posto antes da parte”. Isso, obviamente, seria próprio de uma tendência gregária detectável em várias espécies. Mas, de acordo com Aristóteles, o diferencial do homem está no fato de ele não se unir aos demais apenas para a satisfação de seus desejos imediatos (reprodução, proteção, alimentação, etc.), saciados no seio da família ou da aldeia. Ele tende a ir além, dar vazão às suas potencialidades, e nesse ponto entra a importância da pólis para sua realização.

Evidentemente, e amparado pelos debates sobre o tema, creio ser reveladora a ênfase dada por Aristóteles à comunicação humana. Ao conceituar as coisas (significar, classificar) e estabelecer relações mediadas pela palavra (retórica, argumentação), o homem detém a condição de quantificar e qualificar (racionalizar) suas ações, locais e objetos. E é também a partir da formação intelectual, moral e física que ele encontra o equilíbrio vital para atingir a virtude. Para Aristóteles, presumo, a virtude é agir conforme a razão dos valores universais de uma determinada pólis. Ou seja, o que desejo como bom deve equivaler àquilo considerado bom para a minha sociedade. E sejam quais forem as especificidades dessas regras, o bem comum será invariavelmente a felicidade, a justiça, o bem viver na sociedade política.

Assim, o homem é um animal político, pois, na pólis, ele consegue orientar-se pela conduta moral mediada por leis estabelecidas pelos elementos intelectuais (adquiridos no processo de formação) e moral (lapidada pelos hábitos racionais e pela experiência vivida). O homem é, portanto, um receptáculo pronto a receber e experimentar ensinamentos e vivências, sem os quais sua existência ficaria incompleta, sendo comandada apenas pelas vontades. A propósito, eis a razão para a prudência ser tão estimada na pólis aristotélica: somente com a experiência e a inteligência consegue-se antever as consequências de um ato desviante à moral do grupo.

É interessante perceber que o pensamento aristotélico não oferece uma receita dogmática fechada. Depreendemos da obra do filósofo grego que a grande chave da moral é o racionalismo, sendo o conteúdo dela determinado pelo consenso da sociedade política. Arrisco-me a interpretar que Aristóteles entendeu o mundo como uma combinação de acasos e circunstâncias variáveis de acordo com o tempo, o espaço e as relações.

Em suma, o homem busca a pólis para viver a plenitude de suas potencialidades enquanto espécie, e para suprir condições que outros agrupamentos (família, aldeia) estão, quando isoladas, aquém de proporcionar. A pólis não exclui a dimensão da família, na qual o homem se reproduz e se abriga; na verdade, a pólis é a arena na qual ele faz escolhas e se relaciona por meio de regras que podem levá-lo à virtude. Observo, por fim, que Aristóteles não vê os homens como “naturalmente” virtuosos; eles possuem, na realidade, os predicados necessários para, na condição de animal político, obter a felicidade e o bem comum. O seu sentido de completude.

Autor: Daniel Rodrigues Aurélio

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