Luís Fernando Gascho
CIM 233.102
Durante séculos, a Maçonaria tem sido envolta em símbolos, rituais e tradições que remontam às antigas corporações de ofício da Idade Média. Os maçons operativos — aqueles que trabalhavam com as mãos, o maço, o cinzel e a pedra bruta — construíram não apenas catedrais de pedra, mas uma herança cultural e filosófica que atravessou o tempo. Com o advento da Maçonaria especulativa, os instrumentos materiais foram transpostos ao plano simbólico, e o templo passou a ser construído no coração dos homens. Contudo, neste século de urgência moral, ética fluida e enfraquecimento da esfera pública, a Maçonaria precisa reencontrar sua vocação construtora. A Ordem precisa voltar a ser operativa, mas agora com novas ferramentas, uma nova pedra, e um novo canteiro.
As ferramentas do mundo moderno já não são de ferro ou madeira. Hoje, elas são feitas de ideias, projetos, capacidade de mobilização, articulação social e construção de redes de confiança. O maço, que antes desbastava o excesso da pedra bruta, é agora o pensamento crítico que combate a ignorância e o preconceito. O cinzel, que traçava formas na rocha, é hoje a palavra bem aplicada, o argumento lúcido, a comunicação responsável. A régua e o compasso são hoje os princípios morais e os critérios objetivos com os quais devemos medir nossas ações. A pedra bruta, enfim, é a própria realidade social, ainda desigual, violenta e desinformada, que espera ser polida por mentes ativas e mãos comprometidas.
Nosso novo canteiro de obras são as associações civis, os conselhos comunitários, os grupos de voluntariado, as fundações educacionais, os fóruns de participação política e cidadã. São esses os espaços onde o maçom moderno precisa trabalhar. Não mais apenas entre colunas e sob abóbadas simbólicas, mas no seio da sociedade, onde a presença construtiva de homens livres e de bons costumes é mais necessária do que nunca. A verdadeira iniciação, hoje, passa por assumir responsabilidades concretas diante do sofrimento humano, da exclusão social e do enfraquecimento das virtudes cívicas.
É preciso transformar Lojas em núcleos de ação ética. Transformar sessões em oficinas de projetos sociais, ambientes de planejamento estratégico para o bem comum. A ritualística deve continuar a inspirar, mas não pode mais se esgotar em si mesma. O simbolismo só tem valor quando se transforma em comportamento, quando transcende o templo e alcança a praça, a escola, a rua e o lar. Precisamos formar maçons que sejam reconhecidos não apenas por seus aventais, mas pelas obras que erguem na sociedade, pelos valores que promovem, pela paz que semeiam.
Vivemos dias em que a sociedade clama por referências morais. A desinformação e o relativismo corroem as instituições. A polarização política transforma irmãos em adversários. A banalização da vida e do outro ameaça o próprio conceito de humanidade. Neste cenário, é inaceitável que os maçons se mantenham em silêncio ou apenas debatendo abstratamente os graus e os ritos. O verdadeiro trabalho está lá fora — e ele é árduo, exige coragem, inteligência e virtude.
O compromisso da Maçonaria precisa ser visível. Não para exibir glórias, mas para inspirar ações. Precisamos estar onde a cidadania está enfraquecida, onde os jovens não têm referência, onde os valores são negociados, onde a ética parece ter perdido valor. Precisamos ser mentores, educadores, pacificadores, transformadores. Esse é o novo trabalho operativo: a lapidação da sociedade a partir do exemplo e da ação.
Portanto, urge uma nova postura: a Maçonaria deve se reconectar à sua vocação histórica de construtora. Mas agora construtora de pontes entre grupos sociais. Construtora de oportunidades para os mais vulneráveis. Construtora de consciência moral em tempos de crise. Não há mais tempo a perder com vaidades internas ou disputas estéreis. O mundo precisa da Maçonaria como força viva — como uma Ordem verdadeiramente operativa.
A história cobrará de nós, hoje, mais do que discursos: cobrará obras. E que sejam obras duradouras, justas, belas — tal como os antigos templos, mas agora voltadas ao espírito e à coletividade. O templo a ser erguido é o de uma sociedade mais virtuosa. O tempo é agora. E os operários somos nós.
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