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PERGUNTAS & RESPOSTAS

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sexta-feira, 5 de agosto de 2016

BURACO NEGRO

BURACO NEGRO
Ir.´. Pedro Moacyr M. de Campos - Loja Acácia do Continente nº 2.014

Introdução
Muito se tem falado, comentado e escrito, a respeito da cisão do Grande Oriente do Brasil ocorrido em 1973. A literatura não é farta porém, compõem-se de obras que sempre procuram abrir novos caminhos contendo importantes e valiosas informações, às vezes até contundentes, mas que sob o aspecto histórico e filosófico, permitem ampliar a avaliação deste momento histórico da maçonaria brasileira. Não são livros de leitura ad libitum, mercê de uma interpretação unilateral, cujas conclusões ficam expostas à liberdade introspectiva. Eles relatam as causa explícitas, cuja análise remete-nos à incertezas e, muitas vezes, à paradoxais iniciativas de sentir-se a necessidade de uma pesquisa mais detalhada, haja vista situações comprometedoras, pois trata-se de uma história, cujo desfecho foi a partição de um sistema, teoricamente indivisível.

Aqui, entretanto, uma análise pessoal das causas explícitas, onde a igualdade, a fraternidade e a liberdade foram aviltadas; além disso, a tolerância, “princípio cardeal nas relações humanas, para que sejam respeitadas as convicções e a dignidade de cada um” (Constituição GOB, Art. 1º, III), foi transformada em senha de guerra.

Longe de qualquer prepotência intelectual, literária, romancista ou mesmo pragmática, aproveito a liberdade de expressão e pensamento que me foi outorgada, para manifestar-me a respeito deste importante acontecimento. Como dizia Lincoln, “se queres conhecer um homem dá-lhe o poder ou dinheiro”, não é necessário um aprofundamento muito rigoroso na história da maçonaria brasileira, mesmo que diletante, simples curioso, ou pesquisador para constatarmos que a cisão de 1973, foi o fruto amargo comportamento de elementos, aos quais a disputa pelo poder, fama e glória, perfaziam a trilogia da virtude. A instituição, que após a década de 30, reconheçamos, caudatária, neste período, pernoitou em leitos de albergues tumefactos de inglórias e decepções.

Importante lembrar, considerando as sagradas palavras, quotidianamente invocadas, quão profunda é nossa filosofia e nosso compromisso, pois é a partir dos ensinamentos do Grande Geômetra, que foram estabelecidos os princípios que regem nossos padrões de comportamento. Assim, fomos advertidos em Ex 20,16 “Não levantarás falso testemunho contra o próximo” e no Novo Testamento, a complementação em Jo 8,7 “Aquele de vós que estiver sem pecado, atire-lhe a primeira pedra”. E na cisão de 1973, os interesses desenvolveram-se concretizando essas advertências, desestabilizando a identidade de um sistema cuja literatura, repleta de histórias e histórias, desde os afortunados contos de fada, às mais delirantes ficções, às mais sérias pesquisas elaboradas por historiadores, ainda hoje, são recondicionadas por revisionistas íntegros de procedência ilibada.

Mas sempre, por mais que se queira achar um vilão e um herói, o bom senso nos leva às mais delirantes achegas de um entroncado jogo político, onde o resultado foi um único e desalentado procedimento de notório poder de desintegração. Perdeu-se a identidade; desigualaram-se os conceitos de honra e integridade. O sistema ficou abalado e a deformação de forças favoráveis e contrárias, provocaram o inevitável: a cisão. Os poderosos, de ambos os lados, enclausurados e afastados daqueles que depuseram seu voto de confiança, na certeza do bem estar de toda uma corporação, dividiram o poder estabelecido por um pseudo idealismo. A cúpula piramidal rompeu-se e como consequência, a partição de uma base amargurada pela falta de liderança onde o fatídico destino obscuro, ameaçava e diluía a cada dia, todo um idealismo, outrora, capaz de impetrar, de forma austera, soluções onde a cidadania de cada elemento, era acima de tudo, a evidência da preservação da integridade, dignificada por aqueles que fizeram nossa história.

Não louvo os que se foram nem os que ficaram. Ambos compactuaram com um mesmo objetivo e por um mesmo ideal: o poder. Como arguido anteriormente, quem poderia ter levantado falsos testemunhos e quem poderia ter atirado a primeira pedra? Ambos afastaram-se em direções opostas, em benefício da cisão; recusaram-se a lutar. O bravo luta pela preservação e não pela partição. E bravura, de ambos os lados, foi o que não houve... a não ser a ignomínia de uma instituição. Mesmo assim, insisto em colocar no alvo principal, minha dúvida com respeito a congruência dos fatos, que justificaram a partição do sistema, pois a sombra do buraco negro da obsessão peloo poder, mesmo que tênue e difusa, sempre foi uma ameaça, pois tem origem comum: o homem.

E as causas implícitas, no meu entendimento as principais, a seguir enumeradas, fossem consideradas como um pouco de bom senso, muita coisa poderia ser evitada afinal, “se alguém ama a justiça, saiba que as virtudes são fruto de seus esforços: ela ensina a temperança e a prudência, a justiça e a fortaleza. E não há, na vida, nada mais útil para os homens que isto” (Sb 8,7).

Causa primeira
A indicação: Uma entroncada e complexa investigação, tal qual um novo cliente de uma casa de crédito. O Mestre, após apresentar seu candidato, imediatamente é afastado. Sua palavra não tem valor. Sua honra, sua dignidade e integridade, são aviltadas por uma comissão investigadora. E como se ainda não bastasse, uma assembleia é convocada e, a partir de um simplório depoimento, todos votam, aprovando ou não. Quão atroz comportamento! Desde quando a palavra de um Mestre pode ser colocada em votação? Quando a palavra de um Mestre pode ser carteada em uma mesa de desconfianças? A oposição pode e deve existir afinal, ninguém é perfeito. Entretanto, os métodos clássicos conhecidos pela ética do comportamento, através do diálogo, deveriam satisfazer perfeitamente os argumentos contrapostos à indicação.

Causa segunda
A Iniciação: Uma cerimônia cheia de artifícios e aforismas, onde o aprendiz, condecorado após o teatral espetáculo, estonteante de luzes e cores, é contemplado com um banquete comemorativo em cujo cardápio, a impregnação ilusória de uma vida melhor. A cerimônia repleta de simbolismo rico e profundo, perde sua essência em favor de uma alegoria, pobre e sem sentido.

Há necessidade de conscientizar-se de que a iniciação é como o plantio de uma semente. Depende do trabalho dos Mestres, em adubar com seus conhecimentos a fim de poder-se um dia, colher o fruto: mais um Mestre. Porque é na exaltação, a existência da real iniciação, que está a grande vitória e as razões de um grande banquete. O Mestre é então, um Iniciado.

Mas o critério, assoberba a instituição de galanteios malfadados e repletos de uma progressiva ascendência, em função de méritos questionáveis. Sua evolução moral, cívica, e cultural; seu comportamento familiar e social, são discrepantes com nossa competência de manter uma disciplina, não rigorosa, mas compatível com os postulados constitucionais. Tudo é demasiadamente fácil e o progresso, se é que assim se pode chamar, enxertado com os coloridos e luxuriantes aventais e colares como um crepúsculo boreal, estonteia e faz crescer o desejo de captação do sempre querer mais. E esse querer mais, pode transformar-se em ambição e inveja; pode transformar-se no buraco negro da vaidade, onde qualquer meio justifica o fim: o obsessivo desejo pelo poder.

Causa terceira
O Juramento: O item mais importante. O irrepreensível sistema, paradoxalmente é firmado pela impunidade. E essa impunidade, outorgada pela necessidade de se comprovar que o homem, imperfeito, permanecendo inalterável em busca da perfeição, nada mais é que uma comédia hilariante e sem sentido, haja vista a impossibilidade do próprio sistema, praticar as exigências disciplinares.

E como principal causa, a patética imprecação de um juramento. Uma imprecação que agride a ética de comportamento e do bom senso; agride o código civil, os mandamentos sagrados e as leis civis e da própria instituição: ao perjuro, a morte com requintes de crueldade.

Aonde fomos buscar tamanha barbárie? Em que parte de nossa história está registrada a prática desta imprecação? Sabemos que nunca foi e nunca será. Então, seria uma forma figurativa, apenas para mostrar que nossos princípios são suficientes para estabelecer comportamentos equalizados com a justiça e a verdade? Se assim o fosse, não haveria necessidade em se estruturar a instituição em vários poderes, o que na verdade, não seria também, uma válvula de escape para satisfazer a vaidade com títulos, medalhas, faixas e condecorações?

Causa quarta
O Afastamento: Afastamento de que ou quem? Nosso afastamento da realidade e de nós mesmos; nosso afastamento do verdadeiro amor ao próximo e da espiritualidade. Nosso afastamento do próprio homem. Nosso afastamento dos ensinamentos dos grandes Mestres, seja Cristo, Buda, Confúcio, Krishnamurti, etc. Nosso afastamento da oração e da paz. Nosso afastamento conceitual do direito de ser, o que muitos confundem com o escravismo, onde o carrasco é um agente disciplinador e o mentor espiritual, um consolador que professa uma vida eterna cheia de glória e fartura.

Olhemos o que está escrito na abertura e no encerramento de nossos trabalhos; tudo não passe de simples rotina protocolar, quando deveriam ser alvo de meditação e introspecção; de reflexão no profundo silêncio existencial porque “o fruto do silêncio é a oração; o fruto da oração é a fé; o fruto da fé é o amor; o fruto do amor, é o trabalho” (Madre Tereza de Calcutá) pois é com trabalho que se constrói e não com discórdia.

Conscientizemo-nos da necessidade do amor; da necessidade de andarmos de mãos unidas. Conscientizemo-nos, repito, da tolerância, “princípio cardeal nas relações humanas, para que sejam respeitadas as convicções e a dignidade de cada um”.

Conclusão
Não podemos permitir, que o falso diletantismo, avilte os mecanismos que determinam os procedimentos compatíveis com as regras de probidade e comportamento da instituição. Muito menos, sob qualquer hipótese, permitir sua partição em poderes paralelos como aconteceu em 1973. Foi uma agressão à ética do comportamento, atendendo conveniências personalizadas pela vaidade pessoal, para defender-se da intromissão de outrem ou pela ganância em querer disputar, ou preservar-se o direito por um desvairado cesarismo.

A cisão tributou uma dívida onde, sem parcimônia, deixou sulcos profundos mas, apenar de tudo, a instituição não está, como nunca esteve, comprometida porque sua base, sem injunções, é constituída por elementos dignos, honrados e íntegros, os quais conseguem manter sua estrutura com dignidade. Não existe maçom irregular. O que existe é irregularidade de comportamento, que subestima a capacidade de discernimento da própria instituição, em função de prerrogativas alienadas ao desenvolvimento.

Julgo procedente a elaboração de moção, dirigida às autoridades competentes a fim de que, analisadas as variáveis pertinentes às causas implícitas citadas, sejam as regras disciplinares reformuladas, de forma compatível com a realidade e necessidade de manutenção da unidade. E hoje, já passados duas décadas, toda corporação maçônica brasileira, com uma nova filosofia de trabalho, procura, de forma indelével, não só manter a estabilidade de sua existência, mas também, difundir seus princípios honrados, preservando a essência da identidade de um sistema que, a partir de então, verdadeiramente indissolúvel e indivisível.

Fonte: O Painel, Agosto/98, p. 12

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