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PERGUNTAS & RESPOSTAS

O “Perguntas & Respostas” que durante anos foi publicado no JB News e aqui reproduzido, está agora no “Blog do Pedro Juk” . Para visita-lo ou tirar suas dúvidas clique http://pedro-juk.webnode.com/ ou http://pedro-juk.blogspot.com.br

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

RITUAIS DO REAA DE 1972 E 1988 NO GOB

Em 06.10.2022 o Respeitável Irmão Reynaldo Calaza, Loja Comércio, 0058, REAA, GOB-RJ, Oriente do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, faz a seguinte pergunta:

REAA, RITUAIS DE 1972 E 1988

Recentemente ganhei alguns Rituais antigos do REAA. Comecei a ler os Rituais que ganhei e vi que no Ritual de 1972 não havia as colunas Zodiacais, os Aprendizes se sentavam na Coluna do Sul, a Pedra Bruta também na Coluna do Sul, a Coluna Sul como "B" e claro que na Coluna do Norte o oposto, Companheiros, "J" e a Pedra Cúbica.

No Ritual de 1988 8º edição, já tem a atual formatação, por ter passado pela função de 2º Vigilante e atualmente como 1º Vigilante me perguntam (Aprendizes e Companheiros) o porquê desta diferença/mudança para os outros Ritos.

O Irmão poderia explicar o porquê desta mudança do REAA ou indicar uma literatura?

CONSIDERAÇÕES:

Lamentavelmente esse ritual de 1972 do GOB é um verdadeiro atentado contra a liturgia e a ritualística original do REAA. O de 1988 melhorou um pouco, mas deixou muito a desejar.

Para que se possa compreender essa indevida inversão de colunas vestibulares no escocesismo, é preciso antes entender que nos ritos Moderno e Adonhiramita essas colunas de fato são invertidas em relação ao que é usado no escocesismo.

Originalmente no REAA a Coluna B∴ fica à esquerda de quem entra e a Coluna J∴ à direita (como descrito em Reis). Já nos Ritos Moderno e Adonhiramita, J∴fica à esquerda e B∴ à direita.

A explicação para essa inversão é porque na França esses dois ritos, através do Grande Oriente da França seguiam a forma com que os Modernos ingleses da Premier Grand Lodge (1717) de Londres dispunham as colunas vestibulares (J e B). É notório que os Modernos da Primeira Grande Loja londrina fizeram alterações drásticas na forma antiga de trabalho para fugir das exposures (revelações) que apareciam cada vez dos jornais londrinos da época e revelavam como os maçons trabalhavam em suas lojas.

Essa forma alterada de trabalho fez com que surgisse mais tarde na Inglaterra uma Grande Loja rival que combateria essas alterações e assim se autodenominaria como “Antiga” por preservar, segundo eles, os costumes originais, enquanto que pejorativamente, chamava a primeira Grande Loja de “Moderna” por ter alterado a antiga forma de trabalho.

Isso é um detalhe importante na história, até porque na época existiam na França duas vertentes de Maçonaria, a do Grande Oriente da França que era ligado aos “Modernos” da Inglaterra (daí o nome de rito Moderno) e a outra, que era livre e não se submetia às influências da Primeira Grande Loja inglesa. Essa vertente livre nascera no Norte da França no século XVII e esteve ligada ao séquito dos Stuarts (Reis Católicos da Inglaterra), cuja viúva de Carlos I, Henriqueta de France, recebera do rei Luís XIV exílio em Saint-Germain-en-Laye. Vertente maçônica ligada aos Antigos que faziam oposição aos Modernos, ela acabaria dando origem ao escocesismo, sistema de altos graus que mais tarde culminaria no Rito de Perfeição (Heredon) e por fim no rito Antigo e Aceito que ficaria universalmente conhecido como Rito Escocês Antigo e Aceito.

O adjetivo “escocês” ocorreu porque a família dos Stuarts, era natural da Escócia. Essa família, conhecida no contexto como Reis Católicos, esteve no trono da Inglaterra por diversas vezes. A rainha Henriqueta era a esposa de Carlos I, então decapitado em 1649 durante a revolução puritana de Cromwell. Foi por esse motivo que a rainha acabou se exilando na França - esses são conhecimentos básicos para se entender o que é o escocesismo na Maçonaria.

No que diz respeito às Lojas rivais, Antigos e Modernos, para melhor entendimento sobre o assunto, sugiro perscrutar a história da Maçonaria Inglesa e a sua influência na França. Esses pormenores são importantes porque eles ajudam, no final e em muitos casos, explicar a liturgia e a ritualística particular de cada rito dessas vertentes, aqui em especial a do REAA.

É bom que se diga que os ritos maçônicos trazem muitas diferenças entre eles quando se trata de liturgia e ritualística. É o caso, por exemplo, das Colunas B∴ e J∴ que aparecem dispostas de uma maneira em alguns ritos e de outra em outros ritos. Do mesmo modo, invertem-se também a posição dos Vigilantes conforme o rito, e por aí vai.

No que diz respeito à disposição das Colunas Vestibulares, tomando-se por base três ritos de origem francesa, como o REAA, o Moderno e o Adonhiramita, logo percebe-se que em relação a posição esquerda e direita de quem ingressa no templo, no REAA a Coluna B∴ fica à esquerda e a J∴ à direita, enquanto que nos outros dois ritos as colunas se encontram dispostas de modo invertido, ou seja, J∴ à esquerda e B∴ à direita.

Observe-se também que a disposição J∴ (esquerda) e B∴ (direita) ocorre na vertente francesa dos chamados “Modernos”, enquanto que B∴ (esquerda) e J∴(direita) ocorre na vertente francesa, mas do escocesismo, onde muitos costumes se relacionam com os “antigos”, livres e aceitos.

Comentados esses aspectos relacionados à inversão das duas Colunas Vestibulares, outro detalhe importante a ser ressaltado é que o REAA, o Moderno e o Adonhiramita são todos ritos nascidos no hemisfério Norte. Esse é um importante detalhe que serve para explicar que independentemente de como estejam dispostas as Colunas Vestibulares e os Vigilantes no templo, os Aprendizes sempre ocuparão a Coluna do Norte e os Companheiros a do Sul. Nesse caso, a observação do Sol na sua eclíptica é necessariamente feita do hemisfério Norte da Terra e é ela que define e explica muitas das disposições de elementos na Loja.

O que de fato regula a posição dos Aprendizes e Companheiros na Loja não são as Colunas B∴ e J∴, mas o hemisfério em que o rito correspondente nasceu. As colunas podem até se inverter conforme a vertente maçônica, mas os Aprendizes e Companheiros nunca quando se tratar de rito originário do Hemisfério Norte.

O porquê dos Aprendizes no Norte e Companheiros no Sul – Do ponto de vista do hemisfério Norte, quanto mais ao Norte alguém estiver, mais afastado ele estará do Equador, isso quer dizer que devido a esse afastamento o topo do Norte acaba recebendo menos luz do Sol.

Assim, os ritos maçônicos nascidos no Norte se valem dessa alegoria solar - haurida dos cultos solares da Antiguidade - para iniciáticamente definir o lugar dos Aprendizes e dos Companheiros no templo. Desse modo, os Aprendizes, representando a infância e por estarem no início da jornada, portanto com menos conhecimento, ocupam o Norte do templo onde simbolicamente há menos luz. Já os Companheiros, representando a juventude, portanto mais instruídos, ocupam o Sul do templo onde simbolicamente há mais luz. Nesse contexto, a luz simboliza conhecimento, esclarecimento, aperfeiçoamento, etc.

Vale mencionar que a banda Sul é aparentemente mais iluminada devido ao movimento aparente do Sol na sua eclíptica. Isso pode ser facilmente constatado nos Painéis do 1º e 2º do Grau quando observamos que nele há três janelas que indicam a passagem da luz, uma situada no Oriente, outra ao Sul e ainda outra no Ocidente. O detalhe é o de que no Norte não há janela porque no seu movimento aparente, quem estiver no Norte vê o Sol passra pelo Sul. Graças a essa distribuição solar, do ponto de vista do setentrião, é que o Sul, desde os tempos bíblicos ficou também conhecido como Meio-Dia (hora mais iluminada).

Desse modo é possível explicar do porquê que em qualquer circunstância, em se tratando dos Ritos Moderno, Adonhiramita e Escocês Antigo e Aceito, os Aprendizes sempre ocuparão o Norte e os Companheiros o Sul, mesmo que haja inversão de Colunas Vestibulares e de Vigilantes nos dois primeiros mencionados.

Nesse contexto cabe mencionar que a Maçonaria Brasileira é filha espiritual da França. Isso porque os dois primeiros ritos regulares por aqui praticados foram o Rito Francês (Moderno), e o Rito Adonhiramita, em 1801. O REAA, que também é de origem francesa, somente chegaria oficialmente ao Brasil no ano de 1832.

Em relação à ritualística primitiva do REAA, cabe registrar que ele somente teve o seu primeiro ritual para o simbolismo em 1804 na França. Esse ritual, embora ainda de construção rudimentar, já em 1816 teria que se adaptar ao sistema capitular de Lojas, formato então criado pelo Grande Oriente da França onde o Athersata, dirigente do Capítulo Rosa Cruz (Grau 18 do REAA) era também o Venerável Mestre do simbolismo. Na realidade, tudo ocorria em Loja Capitular, razão pela qual criou-se o Oriente elevado e dividido no REAA para acomodar o santuário Rosa Cruz. Nessa época só ingressavam no Oriente os portadores do 18º Grau. Quando tudo isso acabou, o Oriente permaneceu elevado e separando, ficando reservado apenas aos Mestres Maçons e aos ex-Veneráveis.

Esses acontecimentos - que merecem ser estudados amiúde - colaboraram para o aparecimento logo em 1820/21 de um guia denominado Guia dos Maçons Escoceses, cujo qual já alterava em muitos pontos a estrutura do primeiro ritual nascido em 1804.

Na verdade, esse guia romperia com a originalidade, ainda que incipiente, do primeiro ritual, principalmente para se adaptar à liturgia capitular, pelo menos enquanto ela durasse.

Mais tarde, após a definitiva extinção das Lojas Capitulares, desafortunadamente muitos costumes do Capítulo acabariam ficando enraizados nos rituais do simbolismo do REAA. Assim, iniciava-se a sofrida trajetória de enxertos e acomodações nos rituais do simbolismo do REAA.

Alerto que para se entender o trajeto da paulatina construção dos rituais do simbolismo do REAA é necessário antes estudar (em fonte de água limpa) a história do primeiro ritual e os elementos que influenciaram a sua construção na França. Fica aqui a dica (muito a respeito pode ser encontrado no Blog do Pedro Juk em http://pedro-juk.blogspot.com.br).

Não obstante as alterações que ocorreriam por conta do que foi comentado, também no Brasil, por ocorrências históricas, os rituais simbólicos do escocesismo acabariam sofrendo ao longo dos séculos XIX e parte do XX toda a sorte de enxertos oriundos de outros ritos, principalmente dos ritos Moderno e Adonhiramita que por aqui já vinham sido praticados desde 1801 sob os auspícios do Grande Oriente da Ilhe de France, e do Grande Oriente Lusitano – o GOB somente apareceria em 1822.

Esses registros ritualísticos desencontrados podem até parecer compreensíveis em se levando em conta as dificuldades naturais advindas dos primórdios da Maçonaria brasileira, sobretudo pela falta de comunicação em uma época ainda distante das evoluções tecnológicas da comunicação. Nessa época os rituais eram compilados em simples folhas avulsas de papel e traziam um conteúdo bastante reprovável em termos de originalidade. Fazer o quê? Era o que tinha.

Além disso, ainda outros fatores no decorrer dos tempos iriam colaborar para a proliferação de muitos textos ritualísticos anacrônicos e suspeitos na sua originalidade.

Além do sistema capitular que também ingressaria no Brasil, a partir de 1854 a Maçonaria Brasileira passaria a ser comandada por um Soberano Grande Comentador do Grau 33 do REAA. Isto é, o Soberano Grande Comentador era também o Grão-Mestre Geral da Maçonaria Brasileira. Isso duraria aproximadamente até 1954 quando o GOB voltaria a essencialmente uma obediência simbólica.

Essa ingerência do Supremo Conselho do REAA no simbolismo não agradou os demais ritos aqui praticados, sobretudo pelo trato desprezível que era dado à liturgia e a ritualística dos três primeiros graus.

Em resumo, mais rituais contraditórios à originalidade de cada rito apareceriam. Entenda-se que o Rito Moderno possuía 7 graus e tinha sua Oficina Chefe, assim como o Adonhiramita com seus 13 graus. Todos comandados por um Soberano do REAA com 33 graus. Por certo que isso nunca daria certo. Por oportuno, é bom lembrar que também já transitava por aqui o Rito de York.

Assim, sem nenhum critério a maioria dos rituais eram elaborados misturando práticas e costumes que se somavam ainda às invencionices e aos achismos.

No início do segundo quartel do século XX viria, em 1927, a primeira grande cisão da Maçonaria no Brasil. Diante desses fatos, mais rituais seriam então elaborados e cada um deles geralmente construídos com práticas estranhas a originalidade do rito.

Agora com duas Obediências constituídas, o REAA no Brasil teria rituais para as Grandes Lojas e outros para o GOB. Infelizmente, entre eles persistiam diferenças, muitas delas hauridas por conta de reconhecimento. Por exemplo, muitas práticas das Blue Lodges norte-americanas acabariam indevidamente enxertadas nos rituais do REAA.

Muitas dessas indevidas inserções perduram até hoje e são visíveis pelas diferenças encontradas entre alguns rituais de um mesmo rito, mas de Obediências distintas.

Em 1972/73 aparece então a segunda grande cisão na Maçonaria brasileira, oportunidade em que vem a luz uma nova obediência maçônica, esta então composta por Orientes Independentes. Com isso, a obediência que acabara de florescer passava a elaborar os seus próprios rituais.

A Maçonaria Brasileira, agora com três Obediências regulares, o GOB, a CMSB, e a COMAB, passava a se servir de mais rituais editados para um mesmo rito, mas ainda com muitos procedimentos ritualísticos diferenciados.

Há que se destacar que essa profusão de rituais de um mesmo rito, mas com visíveis diferenças de procedimentos conforme a Obediência, acabaria produzindo mais elementos contraditórios nos trabalhos das Lojas, sobretudo quando Irmãos mudam de Obediência e levam consigo costumes muitas vezes contraditórios ao ritual da Obediência que os recebeu e insistem indevidamente a alterar o previsto no ritual. Água mole em pedra dura tanto bate até que fura, muitas dessas inserções acabam sendo adaptadas quando da impressão de novos rituais.

Assim, a Maçonaria regular brasileira acabou produzindo uma enorme quantidade de rituais, contudo na sua grande maioria de originalidade suspeita. Um exemplo disso são esses dois rituais citados na questão. Sem medo de errar, eles são produtos dessa situação criada principalmente no modo latino de fazer Maçonaria, onde graças aos carimbos e convenções, para muitos somente vale o que está escrito, não importando se o que está escrito esteja certo ou errado.

Enfim, cada rito foi construído sobre uma base doutrinária, portanto, muitos elementos simbólicos e alegóricos têm nele finalidade única. É preciso perscrutar a chave dessa construção para compreender seus propósitos doutrinários. Boa parte dos ritos maçônicos são solares. Alguns possuem caráter ou deísta, ou teísta ou ainda agnósticos. Desse modo os elementos simbólicos e topográficos se distribuem na decoração do Templo de tal modo que eles façam sentido na mensagem proposta.

O Rito de York, rito de origem anglo-saxônica, por exemplo, é teísta por excelência. Nele a Pedra Bruta fica junto ao 2º Vigilante no Sul, no entanto, os seus Aprendizes ocupam o lado nordeste da Loja. Já nos ritos Moderno, Adonhiramita e REAA, a Pedra Bruta fica do mesmo lado em que os Aprendizes sentam, ou seja, no Norte. As Colunas Zodiacais, marcam as constelações do Zodíaco na base da abóbada do REAA. Elas marcam a senda do iniciado em busca de aperfeiçoamento. No princípio, o Zodíaco era representado apenas na base da abóbada. Não haviam Colunas Zodiacais. Elas só apareceriam mais tarde como opção de representar os ciclos iniciáticos comparados aos ciclos da Natureza. A propósito no Blog do Pedro Juk poderão ser encontradas muitas referências sobre as Colunas Zodiacais e os topos das Colunas do Norte e do Sul.

Então, antes de tentar identificar o que é certo ou errado nesse oceano de rituais brasileiros, recomento antes compreender a proposta do Rito, sua história, sua cultura, sua formatação iniciática, etc. Compreendido esse particular o caminho certamente se tornará mais claro para que se possa separar o joio do trigo.

Ao concluir posso lhe assegurar que o GOB em 1996 deu um grande passo na purificação dos seus rituais do REAA, conseguindo extirpar grande parte dos enxertos e invenções que os descaracterizavam. Assim, o ritual de 2009 em vigência, orientado pelo SOR, Sistema de Orientação Ritualística criado pelo Decreto 1784/2019 do Grão-Mestre Geral é o que se tem de melhor no momento para o escocesismo no GOB. Ao contrário do que muitos pensam, não houve mudanças, porém, correções e volta à originalidade. É verdade que muito ainda precisa ser feito. Foi com esse propósito que o SOR foi elaborado, ou seja, para ser aplicado sobre os atuais rituais em vigência.

T.F.A.
PEDRO JUK - jukirm@hotail.com
Fonte: http://pedro-juk.blogspot.com.br

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