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PERGUNTAS & RESPOSTAS

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segunda-feira, 2 de agosto de 2021

ATIVIDADE DOS DIÁCONOS NA TRANSMISSÃO DA PALAVRA

Em 01/11/2020 o Respeitável Irmão Alexandre Rodrigues Formigoni, Loja Francisco Glicério, 1522, REAA, GOB-SP, Oriente de São Paulo, Estado de São Paulo, apresenta a questão seguinte:

ATIVIDADE DOS DIÁCONOS

Irmão Pedro, estou estudando o nosso Ritual juntamente com a Orientação Ritualística e fiquei com uma dúvida em um item. Peço por gentileza esclarecimento. Fiquei com dúvida na função do 1º Diácono.

No item 41 - Página 47 do Ritual sobre a Postura do 1º Diácono – 2.1 Abertura Ritualística – 4º parágrafo: Texto editado no Ritual diz:

Item 15. Luzes e Dignidades da Loja - função do 1º Diác∴ - (levanta-se) – “Para transmitir vossas ordens ao Ir∴1º Vig∴ e a todas as Dignidades, de modo que os trabalhos se executem com ordem e perfeição.

Já na Página 30, Luzes e Dignidades da Loja - 1.5 Dos Títulos, Joias e Trajes – 2º parágrafo: Texto editado no Ritual deixa claro quem são as Dignidades - “O 1º Vigilante e o 2ºVigilante, com o Venerável, são chamados de Luzes. O Orador, o Secretário, o Tesoureiro e o Chanceler constituem as demais Dignidades”.

Entendo que o 1º Diác∴ é o responsável por transmitir as ordens ao 1º Vig∴ e ao Orador, Secretário, Tesoureiro ou Chanceler pois estes são as Dignidades da Loja.

No entanto, no item 48. Da orientação Ritualística, Leis e Decretos traz a seguinte informação: Leis e Decretos – Página 54 – 2.3 Leitura e Destino do Expediente – 2º explicativo:

Texto editado no Ritual: “(Se houver Leis ou Decretos para serem lidos, o Orador fará a leitura sentado)”.

Orientação:

I - Se for o caso, o Ven∴ Mestre solicita ao M∴ de CCer∴ para que ele conduz o texto até o Orad∴.

II - O M∴ de CCer∴ é o Oficial encarregado de conduzir o expediente ou outros afins do gênero quando o Ven∴ Mestre precisar destiná-los a alguém durante a Sessão. Esse ofício não é do 1º Diác∴.

Justificativa:

Evitar, sobretudo que o Ven∴ Mestre dê uma missão indevida ao 1º Diác∴.

Porem no Item 15 do diz que isso é sim função do 1º Diác∴.

Minha dúvida é: porque o Ritual deixa claro qual é a função do 1º Diác∴ quando estamos abrindo a Loja e mais adiante, na orientação Ritualística, está dizendo que esse ofício não é do 1º Diác∴.

CONSIDERAÇÕES:

No REAA, a dialética inerente aos Diáconos e as Luzes da Loja é apenas simbólica para preservar antigas tradições. Essa dialética de obrigação não é literalmente aplicável.

Imediato do Venerável Mestre, é o Mestre de Cerimônias, cargo comum da Maçonaria francesa que, dentre outros, tem o ofício de levar escritos, documentos, bilhetes e outros afins durante a sessão no REAA.

Os Diáconos, inseridos na Moderna Maçonaria inglesa pelos irlandeses, remontam oficio do passado quando eram os mensageiros que serviam ao Mestre da Loja (um Companheiro experiente) e aos Wardens (zeladores, diretores) no canteiro de Obras da Maçonaria primitiva.

O REAA, rito de origem francesa, mas com influência anglo-saxônica haurida principalmente dos “Antigos” de 1751, revive emblematicamente as aprumadas e nivelamentos comuns no ofício das construções operativas, quando os Diáconos, nos imensos canteiros de obra operativos levavam ordens do Mestre da Obra aos Wardens (depois Vigilantes) para que fossem aprumados e nivelados os cantos antes da jornada de trabalho que estava prestes a iniciar.

Assim, os Vigilantes, com o nível e o prumo respectivamente, cumpriam a contento a missão para que tudo estivesse “justo e perfeito” no início dos trabalhos (nivelado e aprumado).

Do mesmo modo, isso ocorria ao final da jornada quando os mensageiros novamente traziam ordens do Mestre da Obra para que os Vigilantes conferissem o trabalho produzido, isto é, aferiam o nível e a aprumada das paredes até ali erigidas.

Se tudo estivesse nos conformes, justo e perfeito, os operários eram pagos e despedidos para o merecido descanso. Obviamente que isso se dava no período da Maçonaria Operativa, o que não ocorre na atualidade com a Maçonaria Especulativa, senão uma alegoria especulativa que revive o passado.

Desse modo, respeitando a tradição, usos e costumes, o REAA, procura demonstrar emblematicamente essa prática se utilizando da alegoria da transmissão da palavra, isto é, estando a palavra correta e transmitida conforme as exigências da arte, tudo então estará justo e perfeito no canteiro, podendo o Venerável Mestre determinar que os trabalhos sejam abertos conforme a liturgia.

Antes do encerramento dos trabalhos, esse procedimento se repete para constatar se tudo transcorreu nos conformes. Estando tudo justo e perfeito, o Venerável então determina que Primeiro Vigilante feche a Loja.

Em linhas gerais a alegoria da transmissão da palavra simboliza o antigo nivelamento e aprumada das primitivas construções medievais. Entenda-se que de maneira especulativa a pedra, matéria prima do passado operativo, hoje é simboliza o iniciado que é preparado no canteiro especulativo que é a sala da Loja.

Tão somente para compor essa alegoria é que os Diáconos foram introduzidos no REAA. Com isso, a dialética que os acompanha tem apenas o caráter simbólico. Em síntese, os Diáconos no REAA são apenas e tão somente mensageiros da transmissão da palavra. Os Diáconos não são imediatos do Venerável Mestre e dos Vigilantes e nem transmissores de ordem. Para tal ofício, existe o Mestre de Cerimônias.

Para ilustrar as minhas colocações sobre os Diáconos e a palavra sussurrada, vou transcrever a seguir um trecho do livro “Masons At Work” do irretocável Irmão Harry Carr. Antes contudo, é imperioso mencionar que Harry Carr foi por muitos anos secretário da Quatuor Coronati Logde, 2076 de Londres, a Loja de Pesquisas mais antiga do mundo (século XIX). Esse livro traz seu texto desenvolvido em perguntas e respostas que foram por ele respondidas ao longo dos anos do seu secretariado. Segue o trecho sobre os Diáconos como mensageiros e uma palavra sussurrada:

Pergunta: Na abertura da Loja no Primeiro Grau - e na Investidura dos Diáconos - nos foi dito que seus deveres são de "levar mensagens e comunicações" para o 2º Vig., ou "portar mensagens e comandos para o 1º Vig.". Mas eles jamais desempenham tais tarefas de fato (o grifo é meu). Como tais palavras foram parar no Ritual?

Resposta. De acordo com uma tradição muito antiga (o grifo é meu), os Diáconos são os "Mensageiros" da Loja, e as mais antigas formas da Joia ou da Insígnia do Diácono incluíam um "Mercúrio alado", o mensageiro dos deuses (há alguns belos exemplares no Museu da Grande Loja e várias das nossas antigas Lojas ainda as usam no lugar da "pompa").

É certo que de c. 1760 para cá, os Diáconos - na prática Inglesa - realmente exerceram tais tarefas, ou seja, havia certas partes da cerimônia em que o V. M. sussurrava (o grifo é meu) uma mensagem para o 1º Diác. que a transmitia para o 1º Vig. que, por sua vez, a passava para o 2º Diác. que finalmente, a transmitia para o 2º Vig.. Nós temos um perfeito exemplo disso no Three Distinct Knocks[1] (o grifo é meu), publicação espúria de 1760, quando a prática estava em uso para "reunir" e "dispersar[2]" (ela foi subsequentemente repetida no popular J & B[3]).

O Mestre sussurrava (...); as palavras permaneceram no ritual (o grifo é meu), ainda que tal prática tenha desaparecido da maioria dos trabalhos ingleses. E possível, contudo, que alguns vestígios originais dela tenham sobrevivido na Europa e nos Estados Unidos (...):

O texto acima é precioso, contudo, é preciso analisa-lo com cuidado. A se notar que ele se refere à Maçonaria anglo-saxônica.

Atualmente, os Diáconos na Maçonaria inglesa têm função diferente da de que se apresenta no REAA. O principal do texto é que ele menciona a forma sussurrada entre os Diáconos, o Venerável e os Vigilantes e ainda informa a fonte de origem quando alude a exposure da Grande Loja dos Antigos (ingleses), cujo texto deu suporte para o primeiro ritual do simbolismo do REAA em 1804 na França. Em síntese, é daí a origem da alegoria da transmissão da palavra, procedimento comum na liturgia do REAA.

Vale mencionar que a alegoria da transmissão da palavra na abertura e encerramento se dá entre os Diáconos e as Luzes da Loja, portanto esse é um conjunto emblemático de procedimentos e não deve ser confundido com um ato de telhamento (exame de reconhecimento).

Como se pode notar o diálogo ritualístico entre esses protagonistas é só mantido como tradição. A própria questão apresentada do texto já revela essa propriedade. Enfim, o que menciona o ritual na obrigação dos Diáconos é só uma reminiscência dos tempos primitivos. Reitera-se, no REAA os Diáconos não são transmissores de ordens e nem zeladores de disciplina, eles ali estão apenas como mensageiros da palavra sagrada (sussurrada).

A Maçonaria francesa quando estabeleceu a sua estrutura ritualística criou alguns cargos que são inexistentes na Maçonaria inglesa, a exemplo do Mestre de Cerimônias (não confundir com Diretor de Cerimônias) e dos Expertos.

Nesse sentido, o REAA, por ser de origem francesa, possui naturalmente os cargos de Mestre de Cerimônias e Expertos, adotando, contudo, os Diáconos que não são comuns à Maçonaria francesa. Isso se explica pela influência anglo-saxônica que o rito possui já que ele herdou sua estrutura na exposure As Três Pancadas Distintas (The Three Distinct Knocks) de origem inglesa.

Dados esses comentários, o ritual precisa ser compreendido a partir do seu contexto histórico, o que faz com que muitas passagens às vezes são meramente ilustrativas, como é o caso da dialética de obrigação dos Diáconos no escocesismo.

[1] The Three Distinct Knocks – minha anotação: era uma revelação (obra espúria) publicada em 1761 na Inglaterra e que revelava a prática dos trabalhos da Grande Loja dos Antigos, rival da Primeira Grande Loja londrina. Essa revelação relacionada aos Antigos serviu como espinha dorsal, junto com as tradições da Loja Mãe Escocesa e o Regulador do Maçom, na elaboração do primeiro ritual do simbolismo do REAA em 1804 na França.

[2] Reunir e dispersar – minha anotação: se refere a reunir para iniciar os trabalhos, enquanto que dispersar menciona o encerramento da jornada.

[3] J &B – minha anotação: menciona a obra espúria (revelação) inerente aos Modernos da Primeira Grande Loja em Londres.

T.F.A.
PEDRO JUK - jukirm@hotmail.com
Fonte: http://pedro-juk.blogspot.com.br

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