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PERGUNTAS & RESPOSTAS

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segunda-feira, 4 de julho de 2022

LITURGIA, RITO E RITUAL

Izautonio da Silva Machado Junior*

Introdução

A maçonaria realiza as suas reuniões através de cerimônias litúrgicas, fazendo uso de rituais que seguem determinados Ritos. Mesmo nos sistemas maçônicos onde não se adota o termo Rito - como o inglês - as cerimônias seguem de modo geral uma ordem estabelecida, com o objetivo de revelar os conteúdos iniciáticos que a Ordem propõe aos seus membros.

O objetivo deste trabalho é apresentar as definições de Liturgia, Rito e Ritual, vocábulos comumente utilizados no meio maçônico, no entanto frequentemente mal-empregados e menos ainda compreendidos. A exata compreensão destes termos tende a clarificar o entendimento das cerimônias maçônicas, proporcionando uma percepção correta das formas e dos conteúdos, distinguindo o supérfluo daquilo que é essencial, e deste modo melhor internalizar as lições que estas cerimônias visam transmitir.

A Liturgia

Liturgia vem do grego leitourgia, e significa serviço, ação, trabalho ou serviço público. Nesse sentido, não visa a utilidade particular, mas a comunidade. A Liturgia pode ser conceituada como um conjunto de atos preordenados para o desempenho de um serviço público, cujo objetivo é estabelecer uma ordem coerente dos mesmos, de modo a proporcionar que os assistentes percebam qual a finalidade da cerimônia que está sendo realizada.

A Liturgia pode ser de ordem social ou de ordem religiosa.

Existem no plano social diversas formas de liturgias. Por exemplo, no Poder Judiciário, quando se estabelece uma sequência de atos ordenados que têm por escopo promover a Justiça; ou em uma Inauguração de edifício público, onde os atos solenes realizados buscam demonstrar ao público que aquela construção terá uma importante finalidade social.

Do mesmo modo, na esfera religiosa existem as formas de Liturgia. Por exemplo, as missas católicas e os cultos judaicos, onde se pretende, através de uma ordem de atos cerimoniais e rituais, transmitir os conceitos e sentimentos religiosos que fomentam a fé e orientam os devotos a seguir os seus princípios.

Nesse ponto, interessante anotar que no Antigo Testamento da tradução grega da Bíblia (Bíblia dos Setenta), o vocábulo “liturgia” é designativo do serviço de culto do Templo de Jerusalém. Somente mais tarde é que o termo passou a se referir também às celebrações cristãs.



LITURGIA CERIMONIAL E LITURGIA RITUAL

A Liturgia possui como tipos a Liturgia Cerimonial (da cerimônia) e a Liturgia Ritual (do rito).

Enquanto a cerimônia é o nome atribuído às formas exteriores de um ato, o Rito se relaciona com um Mito e com símbolos.

O objetivo central da Liturgia Cerimonial é transmitir a sensação de ordem e beleza, através das formas exteriores dos atos praticados, ao passo que a Liturgia Ritual visa transmitir os elementos essenciais, a expressão dos mitos e símbolos, a interiorizar nos participantes os conteúdos iniciáticos. (MUNIZ, 2016, p. 35)

Por exemplo, o caso do Sacramento do Batismo Católico. A Liturgia Cerimonial pode ser identificada pelos atos de entrada do sacerdote, pelos objetos ou pelas vestes usadas. Já a Liturgia Ritual está compreendida na essência do ato em si, que ocorre quando o sacerdote molha com água a cabeça do batizado, consagrando-o na fé cristã.

Trazendo esses conceitos para uma sessão maçônica, podemos dizer que a Liturgia Cerimonial pode ser observada em elementos exteriores, como o sentido da circulação em loja, as músicas tocadas, a procissão de entrada, os títulos das autoridades maçônicas, a posição de sentar, o local onde se coloca os paramentos etc. Já a Liturgia Ritual pode ser identificada em atos como a abertura e o fechamento da loja, a disposição das Três Grandes Luzes, a verificação pelo Cobridor se o Templo está coberto, as provas da Iniciação, os sinais, toques e palavras etc. Todos estes são elementos internos essenciais da Liturgia.

RITO

Etimologicamente, a palavra Rito vem do latim ritus e significa “ordem prescrita” ou “ordem estabelecida”, e traduz um uso ou costume aprovado.

O Rito é uma forma de expressão de um Mito. De fato, a maçonaria se estrutura em torno de mitos, como por exemplo podemos citar a Construção do Templo de Salomão e a Lenda do Terceiro Grau. O Mito é o coração de um Rito, pois este se estrutura de modo a expressar aquele.

Historicamente, alguns dos primeiros Ritos conhecidos foram os primitivos Ritos Adivinhatórios e os Ritos Sacrificiais, onde se pretendiam influenciar as forças invisíveis e as divindades por meio de oferendas ou homenagens (ASLAN, 2012, p. 1173). Com o tempo, foram se desenvolvendo, de um lado, os Ritos Sociais, como o casamento e o funeral, e de outro lado os Ritos Religiosos, por meio de cerimônias e cultos.

Salomão dedica o templo em Jerusalém c. 1896–1902, James Jacques Joseph Tissot (francês, 1836–1902), ou seguidores, Museu Judaico de Nova York.

Os Ritos possuem um aspecto exterior, manifestado pela Liturgia Cerimonial, e um aspecto interior, exprimido pela Liturgia Ritual.

Em termos maçônicos, o Rito é um método de conferir a luz maçônica, e se vale para esse intento de uma coleção de graus, onde cada um deles contém uma etapa de conhecimento e progresso nos estudos. O Rito determina o conjunto de diretrizes gerais pelas quais se praticam as sessões, e por intermédio do qual se expressam os elementos da Ordem.

Acredita-se que a terminologia maçônica se inspirou na Tradição da Igreja Católica (MELLOR, 1989, p. 213), que se divide em ritos, dos quais são espécies o Latino, o Bizantino, o Armênio, o Antioqueno, o Caldeu e o Alexandrino.

Como sabemos, na maçonaria existem diversos Ritos, que se distinguem entre si pela forma e possuem pontos fundamentais em comum, que são uma síntese da essência da maçonaria. Em outras palavras, a essência dos elementos maçônicos está presente nos Ritos, que são meios alternativos de se alcançar o mesmo objetivo, que é o de transmitir o conteúdo simbólico, filosófico e iniciático da maçonaria.

Em maçonaria, podemos dizer, sem sombra de dúvida, que a Cerimônia de Iniciação, parte essencial de todos os Ritos, que a realizam de variadas formas, é uma experiência representativa de uma Tradição que desde a Antiguidade segue os mesmos padrões: o aspirante deve renunciar à ambição e à possíveis aspirações para se submeter a uma prova, à qual deve se sujeitar sem esperança de sucesso. Deve estar preparado para passar por provações e inclusive morrer. A criação de uma atmosfera de morte e renascimento simbólicos é o verdadeiro propósito da Iniciação (HENDERSON, 2008, p. 170).

OS RITOS E SUAS VERSÕES

Como dissemos, é possível que a maçonaria tenha se inspirado na terminologia da Igreja Católica, que possui Ritos. O Rito Latino, que é o adotado pela Igreja Católica Apostólica Romana, possui como versões o Rito Romano, o Rito Ambrosiano, o Rito Moçárabe e o Rito Galiciano (ou Lionês). As versões são, portanto, formas diferentes de se praticar o mesmo rito. No exemplo, se tratam de variações do Rito Latino. Fazendo comparação com a maçonaria, podemos ver que o mesmo ocorre com seus diversos Ritos.

O Rito Escocês Antigo e Aceito possui versões na forma como é praticado nos diversos países, e mesmo dentro de um mesmo país, como no Brasil, onde observamos que há variações na sua prática entre as potências simbólicas.

Também no Rito de York americano isso é verdadeiro, na medida em que cada Grande Loja dos Estados Unidos pode adotar uma diferente versão do mesmo. No Brasil, a maioria das potências seguem o modelo da Grande Loja de Nova York, mas encontramos variação na Grande Loja da Paraíba, por exemplo, que adotou o modelo da Grande Loja de Nevada.

OS RITOS MAÇÔNICOS PRATICADOS NO BRASIL

O Brasil é um dos países onde a maçonaria pratica maior quantidade de Ritos diferentes, o que se configura em uma grande riqueza cultural disponível aos maçons brasileiros. Em nosso país, os Ritos praticados pelas potências reconhecidas são os seguintes:


Além desses, há outros Ritos que são adotados por potências não reconhecidas, dentre os quais citamos o Rito Antigo Primitivo de Memphis-Misraim.

RITUAL

A palavra ritual, do latim ritualis, isoladamente, possui outros significados. Como adjetivo, Ritual designa o que é relativo a Ritos (MENDES, 2011, p. 37). Como substantivo, de-signa o livro que contém a ordem e a forma de determinada cerimônia, das dramatizações e representações ritualísticas.

O Rito prescreve o conjunto de princípios gerais, enquanto que o Ritual é um conjunto de regras estabelecidas para a Liturgia das cerimônias maçônicas. Ao fazer analogia com ter-mos jurídicos, o Rito pode ser comparado a uma Lei - um conjunto de preceitos e obrigações gerais -, enquanto o Ritual pode ser comparado a uma Instrução Normativa - que regulamenta como essa Lei deve ser observada e praticada (ISMAIL, 2013).

Como substantivo, Ritual é o livro que serve como “manual de procedimentos”. Chamamos de Ritual o livro que usamos nas sessões, pois ele contém as fórmulas e instruções necessárias à prática uniforme e regular dos trabalhos, como por exemplo a fórmula ritualística de abertura e fechamento de uma sessão.

Enquanto o Rito é um gênero, o Ritual é uma espécie. Em outros termos, o rito é “continente” - que contém - e o ritual é “conteúdo” - está contido naquele. Cada Rito maçônico pode conter vários rituais, como o Ritual de Consagração de Templo, os Rituais de Iniciação, Elevação e Exaltação, o Ritual de Cerimônia Fúnebre, o Ritual de Loja de Mesa, os Rituais de abertura das sessões, entre outros.

Nesse ponto de nosso estudo, adverte-se não confundir Liturgia com Rito e com Ritual. Os Ritos fazem uso da Liturgia (Cerimonial e Ritual) para alcançar a finalidade de transmitir o seu conteúdo iniciático e simbólico, e também fazem uso dos rituais, para organizar os seus procedimentos nas sessões e cerimônias.

CONCLUSÃO

Conforme vimos, os vocábulos Liturgia, Rito e Ritual possuem definições diferentes, que se relacionam entre si, e que muitas vezes são objeto de confusão quando empregados no meio maçônico. A compreensão destes termos possibilita ao maçom ampliar a seu entendimento acerca das cerimônias da Ordem, e assim apreciar a sua ordem e beleza, consciente de que se tratam de elementos meramente formais, ao mesmo tempo em que se torna apto a captar os seus aspectos mais profundos e essenciais.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASLAN, Nicola. Grande Dicionário Enciclopédico de Maçonaria e Simbologia. Londrina: Editora Maçônica “A Trolha”, 2012.

HENDERSON, Joseph L. Os mitos antigos e o homem moderno. In: JUNG, Carl G. O homem e seus símbolos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.

ISMAIL, Kennyo. O que é Rito e o que é Ritual. Blog No Esquadro, 2013. Disponível em https://www.noesquadro.com.br/termos-e-expressoes/o-que-e-rito-e-o-que-e-ritual/. Acesso em 09 de maio de 2020.

MELLOR, Alec. Dicionário da Franco-Maçonaria e dos Franco-Maçons. São Paulo: Martins Fontes, 1989. MENDES, Fábio. Ritual de Emulação – O grau de Aprendiz Maçom. Sorocaba: Edição do Autor, 2011. MUNIZ, André Otávio Assis. Curso Elementar de Maçonologia. São Paulo, Richard Veiga, 2016.

*1Bacharel em Direito. Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil. Especialista em Maçonologia - História e Filosofia da Maçonaria. Mestre Instalado. Cavaleiro Templário do Rito de York. Past Ilustre Mestre do Conselho Lux Mundi no 54. Grau 28 do R.E.A.A. Presidente da Loja de Perfeição Jorge Teixeira. Desembar-gador do TJM da GLOMARON. Cad. Maçônico no 2434 GLOMARON. E-mail: izautonio@gmail.com

Fonte: Revista Triponto nº 1

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