História
A Maçonaria dá uma crescente atenção à sua História. Pela
mesma razão que cada sociedade o deve fazer: os sucessos passados são a base da
situação presente e as lições para as atuações futuras. Conhecer a sua História
é beneficiar de uma aprendizagem duramente feita, ao longo de séculos. E uma
parte dessa aprendizagem foi a conveniência de distinguir entre o que é
História da Maçonaria e o que são histórias à roda ou inspiradas na Maçonaria.
Esta aprendizagem fez-se na Maçonaria como se fez na sociedade. Ainda no século
XIX, a História (com H maiúsculo), em resultado da cultura baseada no
Romantismo da época, pouco mais era do que a narração de episódios épicos
envoltos em véus tecidos pela imaginação, que realçavam as qualidades dos que
na época eram incensados. A evolução da Ciência Histórica gradualmente
habituou-nos à necessidade de fixação de factos e ações em função das provas
documentais ou de outra natureza existentes. Por vezes caindo-se porventura no
extremo oposto da recusa de dar por assente determinado facto ou ação, porque
se não encontrava prova considerada bastante para o ter como verificado, em
exagero que dá um novo e particular e enviesado significado à expressão
Tribunal da História...
Da época em que a pesquisa histórica se enleava com a
imaginação romântica, sobram-nos alguns mitos, que, à falta de comprovação,
pelo menos nos estimulam os egos e a imaginação. O rigor histórico dos dias de
hoje permite estabelecer, com algum pormenor e o devido rigor, o crescimento e
a evolução da Maçonaria, desde a fundação da Premier Grand Lodge de Londres, em
1717, até à contemporaneidade. Neste período, já significativo, a tarefa do
investigador histórico está facilitada pelo profuso acervo documental que os
maçons se habituaram a deixar para a posteridade. Só o facto de ser rotineira,
desde há séculos, a elaboração e guarda de atas registando os sucessos
ocorridos nas reuniões das Lojas facilita enormemente o trabalho do
investigador. Em muitos casos, poder-se-á até dizer que o problema porventura
será já o oposto: o excesso de documentação, que dificulta, quiçá torna
impraticável, normalmente, a análise de toda a documentação e a extração das
pérolas de interesse histórico do meio da imensidão de registos de reuniões
banais de gente vulgar tomando decisões corriqueiras.
Já quando se busca conhecer as origens históricas da
Maçonaria as dificuldades são maiores. Os documentos e registos não abundam e
rareiam mais à medida que se recua no tempo. O manuscrito mais antigo
relacionado com a Maçonaria que se conhece é o Poema Regius, de finais do
século XIV, um poema sobre os deveres morais, divulgado nos tempos modernos por
Halliwell-Phillips numa comunicação, intitulada Da Introdução da Maçonaria em
Inglaterra, apresentada na sessão de 1838-1839 da Sociedade de Antiquários. O
manuscrito do poema é, por esse facto, também por vezes referido como
Manuscrito Halliwell (ver aqui alguns elementos sobre o poema Regius,incluindo
a transcrição do seu teor, em inglês arcaico e a sua "tradução" para
o inglês moderno).
Através deste documento, confirma-se que as Lojas das
corporações de construtores em pedra, os maçons que hoje designamos por
operativos, existiam organizadamente no século XIV e, mais importante, que já
nessa época, não se preocupavam unicamente com a guarda, transmissão e aprendizagem
das técnicas de construção (algumas avaramente guardadas, como, por exemplo, a
forma prática de tirar ângulos retos, imprescindível para que os edifícios
fossem construídos com os cantos efetivamente a 90 graus e não ficassem com as
paredes tortas, em aplicação da chamada 47.º Proposição de Euclides, a
formulação geométrica do - agora - bem conhecido Teorema de Pitágoras), mas
evidenciavam também interesse pelas regras de comportamento moral. Ou seja, o
mais antigo documento relacionado com a Maçonaria mostra-nos que os maçons
operativos já começavam a ser também especulativos, muito antes da
transformação das instituições da Maçonaria Operativa na moderna Maçonaria
Especulativa.
Os documentos históricos disponíveis e analisados indicam
que a moderna Maçonaria Especulativa tem o seu início nos séculos XVII-XVIII
nas Ilhas Britânicas, mediante evolução das Lojas das corporações de
construtores em pedra pré-existentes. Os construtores (que não tinham só
preocupações profissionais, mostra-nos o Regius) foram paulatinamente aceitando
entre si elementos não pertencentes à profissão (senhores que os protegiam e
que lhes davam trabalho, depois intelectuais que consideravam e que, pelo seu prestígio
local, valorizavam as suas Lojas), originando uma surpreendentemente rápida
transição da Maçonaria Operativa para a moderna Maçonaria Especulativa.
Simbolicamente, marca-se o início formal desta através da constituição da
Premier Grand Lodge de Londres, em 1717. Mas, na época, e antes, havia outras
Lojas, para além das quatro Lojas de Londres fundadoras dessa Grande Loja,
designadamente, na Escócia, na Irlanda e na região de York. Da Maçonaria
pré-estabelecida na região de York reclama-se herdeira - e mais antiga Grande
Loja do Mundo - a relativamente pouco conhecida (e não reconhecida pela UGLE e
pela Maçonaria Regular) The Grand Lodge of All England at York.
Desde a fundação da Premier Grand Lodge, a evolução
histórica da Maçonaria até aos dias de hoje é bem conhecida.
Rui Bandeira
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