PROPÓSITOS DA PRIMEIRA GRANDE
LOJA DE LONDRES
Por que surgiu a primeira Grande
Loja de Londres? Quais os interesses não revelados que detonaram iniciativa tão
marcante? Nos anos que antecederam esse “landmark” na história da maçonaria
mundial, a confraria na Inglaterra mostrava duas realidades distintas: os
maçons católicos, que faziam suas reuniões em locais cedidos pela Igreja e os
maçons não católicos que se reuniam em locais públicos, como tavernas e
hospedarias. As Lojas que reuniam maçons cristãos obedeciam à ritualística
simples organizada para as recepções aos candidatos e para as trocas de grau.
Eram lideradas pela pujante Loja de York. As lojas constituídas por maçons
judeus, muçulmanos e budistas e que se reuniam em tavernas, eram informais. As
reuniões, em ágapes, se destinavam às trocas de idéias variadas e às relações
sociais.
A concorrência entre os dois
segmentos da maçonaria britânica era acirrada, até com episódios de violência
contra o patrimônio. Historiadores não comprometidos com a versão oficial
revelam a campanha sistemática de maçons filiados à Grande Loja de Londres
contra documentos de qualquer espécie que informassem algo sobre a existência
das Lojas católicas mais antigas.
A Grã-Bretanha, desde o Ato de
Supremacia proclamado por Henrique VIII, em 1534, para romper com Roma e
estabelecer a Reforma religiosa, viu-se dividida entre catolicismo e
protestantismo. Esse último ainda contribuiu com o puritanismo; movimento de
confissão calvinista que rejeitava tanto a Igreja Romana como a Igreja
Anglicana. Em 1649, a Revolução Puritana, sob a liderança de Oliver Cromwell,
saiu-se vencedora contra a Monarquia. Protagonizou a prisão e decapitação do
Rei Carlos I e proclamou a República na Grã-Bretanha. Com a morte de Cromwell,
abriu-se um período de crise, que conduziu à restauração dos Stuart, em 1660.
Quando Jaime II pretendeu restabelecer o catolicismo, desprezando os interesses
da maioria protestante, eclodiu a Revolução Gloriosa, em 1688. O Stuart foi
facilmente vencido, refugiando-se na França de Luís XIV. A partir de 1714,
reinaram os Hannover, alemães, protestantes, pouco interessados na gestão do
país e que, por isso, favoreceram e reforçaram a importância dos “Whigs”,
adeptos de uma Monarquia limitada pelo Parlamento.
Os intelectuais e cientistas da
Royal Society, dentre eles vários maçons, eram contra a influência da Igreja
porque essa pregava a idéia do criacionismo para explicar o surgimento do
mundo. A Igreja apoiava sua posição nas teses dos filósofos antigos, nas Sagradas
Escrituras e na autoridade de fé e de santidade dos padres. Os integrantes da Royal Society
adotaram o lema: Nullius in Verba, para mostrar que acreditam na verdade dos
fatos, obtida através da experiência científica e não ditada pela palavra de
alguma autoridade. Combatiam também a Escolástica, que era uma linha dentro da
filosofia medieval com elementos notadamente cristãos. A Escolástica surgiu da
necessidade de responder às exigências de fé, ensinada pela Igreja,
acrescentando ao universo do pensamento grego os temas: Providência e Revelação
Divina e Criação a partir do nada.
O ambiente político estava
favorável para os maçons não cristãos prestigiarem sua atividade, substituindo
as finalidades mundanas das suas reuniões nas tavernas por encontros com
formalidades específicas para uma sociedade que pretendia parecer cultural e
filantrópica.
A esse respeito escreve John J.
Robinson, em “Nascidos do Sangue - Os Segredos Perdidos da Maçonaria”:
“Enquanto a Maçonaria continental estava ocupada em tecer mais e mais padrões
complexos de rituais, a Maçonaria britânica original de três graus enfrentava
seus próprios problemas. Como todo o conhecimento de qualquer propósito
anterior desaparecera, a Maçonaria emergiu como uma sociedade glutona e
beberrona, com, talvez, uma sombria ênfase exagerada na última. Todos os Maçons
ingleses provavelmente lamentavam que seu Irmão moralista, William Hogarth,
houvesse imortalizado o estado da Maçonaria londrina do século XVIII em sua
pintura intitulada A Noite, que retrata um Mestre Maçom bêbado como um gambá
sendo carregado para casa pelo Guarda da Loja, ambos com as insígnias
maçônicas.”
Era preciso encontrar uma solução
para esse comportamento. Os maçons ligados à Royal Society, liderados por John
Theophilus Desaguliers, filósofo, assistente e divulgador de Isaac Newton,
idealizaram fundar uma associação de Lojas para planejar e organizar melhor o
desempenho da maçonaria não atrelada aos eventos da Igreja. Reuniram quatro
Lojas de tavernas e criaram a Grande Loja de Londres, em 1717.
A história da fundação da
primeira Grande Loja no mundo mostra uma dupla motivação para o evento:
combater as Lojas que conservaram a influência dos temas católicos na sua
ritualística e ajudar a expandir o sionismo entre as elites. A emigração de
judeus sefarditas (de origem espanhola e portuguesa) e asquenazes (de origem
alemã e polonesa), sobretudo oriundos da Holanda e da Alemanha para a Grã-
Bretanha, ganhou intensidade na segunda metade do século XVII. A Grã-Bretanha
proporcionou à sua minoria judia condições próximas do ideal para cultivar seus
rituais religiosos. A regularização social dos judeus teve lugar em geral sem
obstáculos, ao longo de um período prolongado. Oliver Cromwell deu permissão
para o culto público a um pequeno grupo de sefarditas,
em 1656, e a licença manteve-se após a restauração da monarquia em 1660.
A geografia e a história
colocaram a Grã-Bretanha de certo modo fora da Europa continental e a
experiência judaica ali, por sua vez, foi algo especial. Os judeus foram
admitidos tardiamente, mas, quando o foram, desfrutaram das liberdades básicas
durante um tempo mais prolongado que em qualquer outro país europeu. A
composição heterogênea da sociedade britânica produziu crescente liberdade de
culto. Embora a vigência da Declaração de Direitos (1689) que, entre outras
regulamentações, restringiu a liberdade religiosa ao culto protestante, os
preconceitos contra grupos religiosos minoritários foram tênues.
Apesar de ser uma das comunidades
menos importantes e menores na Grã- Bretanha, os judeus aproveitaram a generosa
tolerância reinante e destacaram-se na política, no comércio, nas artes e nas
ciências, enfim, em todos os aspectos da vida nacional inglesa. A posição
dominante da Grã-Bretanha no mundo dotou os líderes judeus de um papel
preponderante internacional, como no desenvolvimento inicial do sionismo.
E a maçonaria fez parte do
processo sendo um dos meios de difusão do sionismo. Os primeiros rituais
surgidos da existência da Grande Loja de Londres elegeram o Templo de Jerusalém
construído por Salomão, o símbolo da obra perfeita. Serviu de referência na
analogia com o trabalho da maçonaria de aprimoramento do caráter humano. O
texto do ritual reproduziu passagens bíblicas dos hebreus nas explanações aos
maçons. A resistência ao retorno do catolicismo na maçonaria e a divulgação do
sionismo conjugaram-se numa corrente que sufocou as Lojas cristãs
remanescentes. A influência dos judeus maçons com posições de destaque na
marinha, no comércio de armas e no mercado de negócios bancários levou o
poderio político e institucional da maçonaria inglesa para além fronteiras da
Grã-Bretanha. A estratégia de fazer constar que a Grande Loja de Londres
inaugurou uma nova maçonaria, a especulativa, em substituição à operativa, deu
certo. O mundo maçônico acreditou. A eliminação dos documentos relativos às
atividades anteriores a 1717 deu veracidade à tese. A maçonaria britânica
tornou-se forte e respeitada. Os maçons ingleses mantiveram-se suficientemente
poderosos para ditarem ao mundo, cem anos mais tarde, as oito regras para a
regularidade das Lojas e dos maçons no universo.
Ir.’. Ailton Branco - ex-V.M. GLMERGS – Semear Colégio de Estudos do Rito Schröder - Oficina de Restauração
do REAA - 19/04/2011
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