A ORIGEM DA EXPRESSÃO "ERA VULGAR"
Sergio Antonio Machado Emilião
Irmão Matheus
Desde os idos mais antigos, a
humanidade utiliza-se de certos referenciais para delimitar um determinado
espaço de tempo. Os astrônomos servem-se de acontecimentos naturais ou
fenômenos a que se referem os seus cálculos, como as revoluções da Lua, os equinócios
e solstícios, os eclipses e a passagem dos cometas.
Os cronologistas e historiadores
servem-se, também, de certos acontecimentos que tiveram influência sobre o
gênero humano. Designam-se as épocas enunciando os fatos notáveis a que se
referem: a Criação do Mundo, a Fundação de Roma e o Nascimento de Jesus, entre
outros.
Primitivamente, os tempos eram
calculados em gerações: a Bíblia, por exemplo, conta dez gerações antes do
Dilúvio e outras dez depois. Já, segundo Heródoto (escritor grego, considerado
o Pai da História) e a maior parte dos autores da época, três gerações
correspondiam a cem anos.
Posteriormente, no século VIII
possivelmente, introduziu-se o uso das Eras, que consistiam no número de anos
civis de um povo, decorridos desde uma época notável, tomada como ponto de
referência, dando o nome à era adotada.
A etimologia da palavra “Era”, é
um tanto controversa. Alguns indícios apontam que teve sua origem na Espanha,
acreditando-se ser a contração das iniciais A.E.R.A., correspondendo à inscrição
“Annus Erat Regni Augusti” (era o ano do reinado de Augusto) ou “Ab Exordio
Regni Augusti” (do começo do reinado de Augusto) encontrada nos monumentos
antigos. Os espanhóis iniciaram seus cálculos a partir do período em que o país
ficou sob o domínio de Augusto.
Outros dizem derivar da palavra
latina “aeneu” (bronze), porque, das medalhas e moedas desse metal, deduzia-se
a data do acontecimento notável, que serviu de começo a uma série de anos. As
palavras “era” e “época” têm certa relação entre si, mas, contudo, são bem
distintas: ”era” é o número de anos decorridos desde certo acontecimento
notável; “época” é o momento desse acontecimento. De todos os marcos de início
que se poderiam escolher, nenhum seria mais apropriado e natural do que o
próprio começo do tempo, isto é: o instante do ponto de partida da primeira
volta da Terra em torno do Sol, no princípio do mundo. Todos os povos tomariam
esse instante, se tivesse sido possível determiná-lo.
Não o sendo, cada povo adotou uma
Era: A dos Judeus funda-se na criação do Mundo segundo o Gênese; a dos antigos
Romanos na fundação de sua Capital; a dos Gregos no estabelecimento dos Jogos
Olímpicos; a dos Egípcios na ascensão de Nabonassar, primeiro rei da Babilônia,
ao trono daquele Império; a dos Cristãos no nascimento de Jesus, e assim por
diante.
Já a expressão “Vulgar” tem
origem no Latim Vulgare e, originalmente significava “pessoas comuns”, ou seja,
aqueles que não eram da nobreza. Isso, pelo menos, até meados do século XVI,
quando a palavra “vulgar” passou a ter o significado de algo “grosseiramente
indecente”.
Foram os Judeus, no entanto, que
substituíram o antes de Cristo e o depois de Cristo por antes e depois da Era
Vulgar. Como a Era Cristã, sob a denominação de Era Vulgar, é a mais empregada,
serve de termo médio e de comparação com as outras, as quais podem se
classificar em Eras antigas, as anteriores à Era Vulgar, e Eras Modernas, as
posteriores. A Era Vulgar, portanto, designa o Calendário Gregoriano,
mundialmente, adotado.
Para entender como a expressão
Era Vulgar passou a ser empregada na Maçonaria, é preciso lançar mão do
Calendário Maçônico. O primeiro ano do Calendário Maçônico é o da Verdadeira
Luz, "Anno Lucis”, em latim, ou, simplesmente, V.L. ou A.L., como empregado na
datação de antigos documentos Maçônicos do século XVIII, e interpretado como
“Latomorum Anno” ou, como no texto original em inglês, que serviu de base para
esta pesquisa, “Age of Stonecutters”, “Idade dos Cortadores de Pedra”.
A determinação do Ano da
Verdadeira Luz teria se dado com base nos cálculos de James Usher, bispo
anglicano, nascido no ano de 1581, em Dublin. Usher havia desenvolvido um
cronograma que começava com a criação do mundo, segundo o Gênese, ocorrido às
09:00h da manhã, do dia 23 de Outubro de 4004 a.C., com base no texto
Massotérico (texto em hebraico que deu origem a vários capítulos da Bíblia), ao
invés de utilizar a Septuaginta (antiga tradução grega do Velho Testamento).
Nesse contexto, James Anderson
fez constar, em sua Constituição de 1723, a adoção de uma cronologia
independente da religião, pelo menos no contexto britânico da época, com o
objetivo de afirmar, simbolicamente, a Universalidade da Maçonaria.
Foi aceito, portanto, que o
início da Era Maçônica se deu 4000 anos antes da Era Comum ou Vulgar.
Nota-se o
que parece ser um pequeno arredondamento de quatro anos entre os cálculos de
Usher e o que foi adotado nas Constituições de Anderson. O Ano Maçônico tem o
mesmo comprimento do Ano Gregoriano, no entanto começa em 01 de março, assim
como o Ano Juliano, que, ainda, estava em vigor quando da redação das
Constituições de Anderson.
No Calendário Maçônico, os meses
são designados pelo seu número ordinal. Assim, 09 de março de 2012 da E.V.
seria o dia 09 do mês 01 do ano de 6012 da V.L., segundo Anderson.
Se, por um lado, existem claras
referências nas Constituições de Anderson a eventos calculados segundo esta
regra, por outro, tal prática parece não ter sido adotada como norma geral. Os
antigos Maçons dos Ritos de York, Adonhiramita e Francês ou Moderno adicionavam
4000 anos à Era Vulgar, conforme as Constituições de Anderson. No entanto,
Maçons do Rito Escocês Antigo e Aceito utilizavam o calendário judaico,
adicionando 3760 anos à Era Vulgar. Já os Maçons do Real Arco utilizavam-se da
data de construção do segundo Templo de Jerusalém, ou seja, 530 anos antes da
Era de Cristo.
Qualquer que seja o motivo que
tenha levado a tantas variações nos diferentes Ritos, um Calendário Maçônico é
baseado na data de um evento ou um começo, e essas referências eram usadas em
documentos oficiais das Lojas. As datas históricas são símbolos de novos
começos, e não devem ser interpretadas como se já houvesse uma Loja maçônica no
Jardim do Éden. A ideia só foi concebida para se transmitir que os princípios
da Maçonaria (e não a Maçonaria em si) são tão antigos quanto a existência do
mundo. Qualquer outro significado Maçônico para essas datas não passam de um
desejo dos primeiros escritores Maçons de criar uma linhagem antiga para a
Maçonaria, nos moldes de suas imaginações.
No Brasil, há registros de que o
GOB utilizava, nos primórdios da Maçonaria Nacional, um calendário equinocial
muito próximo do hebraico, situando o início do ano Maçônico não em 01 de
março, como sugere Anderson, mas no dia 21 de março (equinócio de outono, no
hemisfério Sul), acrescentando 4000 aos anos da Era Vulgar, datando seus
documentos com o ano da V.L. (A.L.). Dessa maneira, o 6° mês Maçônico tinha
início a 21 de agosto (primeiro dia do sexto mês), e o 20° dia era, portanto,
09 de setembro da E.V., como situa um Boletim do GOB de 1874, segundo o Irmão
José Castellani, em sua obra “Do Pó aos Arquivos”.
O fato é que datar pranchas e
documentos Maçônicos exclusivamente com o ano da V.L. caiu em desuso, talvez
porque hoje saibamos que nosso sistema solar existe há mais de 4,5 bilhões de
anos.
Utilizar o Calendário Gregoriano e
referir-se a ele como E.V., é a prática mais comum em Maçonaria nos dias
atuais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário