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Filosofia ( o estudo dela ) pode mudar alguma coisa...
Ir∴ Mauro Pinto
A∴ R∴ L∴ S∴ 7 de Setembro, 45
G∴L∴E∴ S∴P∴ - O∴ de Santos
Contrariando, de inicio, a “linha” que seguem
muitos trabalhos de teor filosófico, este arranjo de palavras não se apresenta
na seqüência de uma análise etimológica ou de um excerto de obra filosófica de
nome imponente. Talvez surjam análises etimológicas e citações em seu
desenvolvimento, mas não de início. Este é um comentário acerca do cenário
atual da Maçonaria, sem pretensão intelectual avançada, que tem por objetivo
estimular as lideranças, nas Lojas e nos sistemas “obedienciais”, a tentar
promover uma major realização do potencial humano, sob a influência do que nos
oferece nossa Ordem. Comecemos, portanto, por urna analise do cenário atual.
Eis uma afirmação aceitável: e preciso mais do que simplesmente a boa vontade
para que se produza um maçom, homem equilibrado, capaz de levar “luz” por onde
for, pensando, falando e agindo de acordo com as regras mais aceitáveis, seja
na família, seja em qualquer dos outros possíveis grupos sociais nos quais
esteja inserido. Talvez esta afirmação possa nos ajudar a entender a tão lida e
falada “construção social”, assim corno pode abrir caminho para as
considerações sobre o papel da Maçonaria como provedora destes homens
“trabalhados”, equilibrados, aperfeiçoados, melhor realizados. A Maçonaria,
enquanto conjunto de maçons em torno de “alguns’ ensinamentos, deve oferecer
condições para que tal resultado (o maçom) seja alcançado, não necessariamente
em nível máximo de realização, mas em nível crescente (progressivo).
Alguns de nossos IIr∴ mais jovens, pouco tempo
depois da iniciação ou ao longo do caminho que lhes conduz à condição de Mestre, encontram-se tão amargurados
que é difícil não perceber alguma falta de estímulo neles, que, não raro,
abandonam os trabalhos maçônicos ou os mantêm de maneira pouco aceitável.
Interessante é notar que tais posturas pouco geram, atualmente, em termos de
medidas corretivas. Para que não fique restrito aos “mais jovens” o que
comentamos, ha experiências com “mais velhos”. Certa vez, ao término de uma
palestra que proferimos, um Irmão confessou, de maneira emocionada e discreta,
que acabava de recuperar algo do “velho ânimo” que o tempo e a incoerência
tinham quase sufocado nele. Uma briga apaixonada, entre Irmãos em Loja, pode
ser, também, urna experiência conhecida. Não é necessário, no momento, citar em
detalhes episódios mais desagradáveis acontecidos nas cúpulas maçônicas
brasileiras, desde a cisão de 1927, passando pelos problemas dos anos 70 e
chegando a acontecimentos recentes, nos quais nunca apenas um dos lados está
completamente certo. Diante das marcas destes eventos e de outros registros que
a memória pode estar oferecendo aos leitores, podermos aceitar que há um ou
mais fatores “discordantes” agindo em nosso meio, prejudicando a consecução de
nossos objetivos representados pela bandeira da “construção social”, fatores
estes considerados, aqui, sem que sejam ignoradas as nossas imperfeições
humanas.
Que fator discordante existiria em nosso meio?
Existiriam vários? Para que não avancemos demais com perguntas sem resposta,
tentemos, pelo menos, analisar um Único possível fator, que talvez esteja
relacionado com todos os demais, caso realmente existam. Referimo-nos á educação na Maçonaria, ou melhor, á educação nas coisas da Maçonaria.
O homem pode converter-se no mais divino dos animais, sempre que se o
eduque corretamente; converte-se na criatura mais selvagem de todas as criaturas que habitam a terra, em caso de
ser mal-educado. (Platão,
em Fedro).
O que é educar? Recorramos a um dicionário (1),
para que não nos classifiquem como intelectuais que usam livros inacessíveis.
Duas acepções nos ajudam no momento:
• dar (a alguém) todos os cuidados necessários ao pleno
desenvolvimento de sua personalidade e
• transmitir saber a; dar
ensino a; instruir.
Podemos entender, a partir da idéia platônica exposta, com a ajuda das acepções do dicionário, que o maçom pode se tornar mais coerente, em relação á Maçonaria, caso haja, sobre ele, a ação de educadores. Quais seriam, na Maçonaria, os educadores? Resposta instantânea: nossos Mestres. Não havendo insistência no trabalho educativo mais amplo, mais completo, indo além da simples promoção de leitura de fragmentos de nossas instruções, o processo educativo ou de desenvolvimento fica ameaçado, dificultando a transmissão e a preservação dos conhecimentos, valores e habilidades mencionados por Chinoy e transcritos abaixo:
Seja qual for seu impacto em determinado ambiente, a educação realiza importantes funções gerais. A sociedade como um todo, proporciona a preservação e a transmissão da cultura. Consoante a observação de Ernile Durkheirn, e “acima de tudo o meio pelo qual a sociedade recria perpetuamente as condições da própria existência” (Educação e Sociologia, 1956). Transmitindo de uma geração a outra crenças firmadas, conhecimentos, valores e habilidades, concorre para a continuidade e a persistência de urna vida social organizada. (2)Não dar a devida atenção á educação dos jovens maçons (não necessariamente jovens homens) é ameaçar o futuro da Ordem. 0 reflexo da seriedade do processo educacional maçônico dá-se em nós mesmos, em nossas Lojas e em nossos sistemas “obedienciais”. Quando não preparamos o senso crItico dos “alunos”, eles, movidos apenas pela vontade de aprender, buscam respostas desordenadamente, o que explica, na Maçonaria, a abundância de literatura rasteira, a discussão de temas ocultistas, a ignorância de fatos históricos, a mistura de alhos com bugalhos, a decepção (ou a amargura) e outras “barbaridades” que, em algumas de nossas Lojas, podem estar sendo verificadas. Construir uma sociedade com estes obreiros, nestas condições, parece impraticável. Como empregar os maçons na “construção social” sem antes prepará-los para o trabalho?
É chegado o momento de tentar uma resposta para a pergunta: a quem cabe a responsabilidade de preparar construtores para a “obra”? Seria abuso indicar que cabe aos Mestres? Talvez não, já que têm (ou deveriam ter) o domínio da “arte”, corno forma de perpetuá-la e de difundir os seus efeitos pela sociedade. A Maçonaria é “apenas” um sublime processo, para o qual a matéria-prima é o homem, conduzido por sua vontade e pela mão amiga de um Mestre que o orienta sem comprometer seu desenvolvimento, ate que ele possa “andar com as próprias pernas”, servindo para aquilo que se propôs na noite de sua Iniciação, a saber: a “construção social”. A Maçonaria é responsabilidade dos Mestres, pensamos, e se ela não vai bem (na prática), eles devem reavaliar seus métodos de operacionalizá-la, pois realizar pouco ou mal aquilo que tem grande potencial (nós todos) é algo como manter um gênio criativo amarrado, amordaçado e vendado.
Não havendo um número suficiente de Mestres prontos para esta abordagem mais “ampla” na educação maçônica (existem Mestres maravilhosos), a solução mais simples e acessível parece ser o apelo a Filosofia, para que não haja mais perda, como as citadas anteriormente, promovida pela literatura rasteira e os “achismos” insustentáveis. Conhecendo o desenvolvimento do pensamento ocidental, através da História da Filosofia, algo já pode ser mudado, surtindo efeitos a curto prazo. 0 senso comum não pode imperar entre os buscadores da Verdade (não confundamos senso comum com consenso). A Filosofia é como a liberdade, quando experimentada pela primeira vez. Depois da experiência, o retorno a restrição é inaceitável. Apresentemos a Filosofia aos homens livres e de bons costumes. 0 resultado não pode ser negativo.
Hoje, com a Internet e muitas facilidades para a aquisição de livros de bons autores, corno Bertrand Russel, Richard Tarnas, Will Durant, Hegel, Finley, além de coleções populares corno Os Pensadores, da Abril, e obras didáticas como as da professora Marilena Chaui, temos um Irmão de nossa Grande Loja publicando “livrinhos” maravilhosos sobre Filosofia. Depois deste discurso sobre a Filosofia na Maçonaria, seria lamentável não citar nosso Irmão Raimundo Rodrigues e sua obra, única e muito rica fonte desta matéria em nosso meio maçônico. A partir de um senso critico mais desenvolvido, os nossos outros Irmãos “mais consistentes” podem ser melhor aproveitados (José Castellani, Frederico Guilherme Costa, Ricardo Mario Gonçalves, Mario Name, Fernando de Faria etc.).
A propósito, como vão as bibliotecas de nossas Lojas? Pois é, a grande maioria pode estar cheia de pó e de obras maravilhosas, fantásticas, onde a Maçonaria aparece romanceada a ponto de parecerem livros “paulocoelhanos”, de leitura agradável, mas sem fundamentação histórica satisfatória ou aplicação perceptível no contexto da “construção social”. Que tal urn “banho” de livraria como primeiro passo? Depois, podem surgir grupos de estudo e pesquisa. Bom, são muitas idéias...
Busquemos algo mais que apenas os Rituais jogados ao nosso peito. Precisamos de algo como urna Paidéia ou Trivium e Quadrivium (se preferirem), obviamente adequados as nossas possibilidades, o que não pode querer dizer largados a natureza, a menos que reconheçamos a nossa incompetência. Lembremo-nos que o que parece difícil para o dito profano é tarefa normal para o maçom. Precisamos de compromisso com o aprendizado. Precisamos formar maçons mais completos, pois os desafios do presente não são como os desafios do passado. Cada Mestre que promova a “arte” como puder, mas que não a deixe de lado, enquanto o mundo dito profano invade nossas Lojas com seus vícios, quando nOs, iluminados pela luz da Razão (com ou sem elementos de religiosidade) deveríamos invadir o mundo profano, com nossas virtudes desenvolvidas (melhor realizadas), para ajudar na sua evolução.
Promover boa educação maçônica, que talvez seja um compromisso dos Mestres, é, acima de tudo, colaborar para a preservação da Ordem, pela sua continuidade sem a inserção de elementos estranhos aos seus ensinamentos universalmente aceitos. Neste sentido, não parece absurdo entender que a Filosofia pode suprir algumas deficiências educacionais, ainda mais entre buscadores da Verdade. Ensinemos a “arte do pensamento”. Depois disso, tudo deve caminhar nos seus eixos.
(1) HOUAISS, Antonio. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro : Objetiva, 2001.
(2) CHYNOY, Ely. Sociedade - Uma Introduções a Sociologia, São Paulo : Cultrix, 1984.
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