O QUARTO DE HORA DE ESTUDOS OU INSTRUÇÃO
Sérgio Roberto Cavalcante - MI
ARLS Cavaleiros do Sol nº 42 – GLMEPB
Todas as noites, milhares de Lojas Maçônicas acolhem seus membros para mais uma sessão de trabalho.
De acordo com o Rito adotado, os trabalhos das Lojas são abertos, como o objetivo de desbastar a Pedra Bruta. Na antiga Maçonaria Operativa existiam essas reuniões noturnas, constituindo-se nas Lojas. Podemos especular, com um pouco de imaginação, como aconteciam essas reuniões.
O Mestre da Loja, que presidia as reuniões devia agradecer a Deus por mais um dia de labuta e assim abria as atividades. Em seguida deviam ser feitos os avisos e os informes gerais sobre a corporação e debatiam-se os projetos e o andamento dos trabalhos.
Mas, o momento central daquelas reuniões, se não houvesse instruções para os novos aprendizes de pedreiros, era a apresentação de um traçado arquitetônico por um irmão mais experiente. Em geral o assunto deveria versar sobre assuntos profissionais.
E na Maçonaria Especulativa, os maçons se reúnem em Loja para qual finalidade?
Houve tempo, no passado, que as discussões e debates que ocorriam nas Lojas Maçônicas se concentravam nos acontecimentos políticos e nas propostas de ações dos maçons. Isso aconteceu na França pré-revolucionária, nas Américas à época das lutas pela independência e em especial nas Lojas Maçônicas Brasileiras da época da Colônia e do Império. Havia amplo engajamento dos irmãos nos acontecimentos. E as sessões maçônicas, não raro, prologavam-se pela madrugada quase até o amanhecer.
E hoje?! – a proposta da Maçonaria pelo menos no Brasil, parece (salvo engano) centrar seus esforços na melhoria do homem, induzindo-o a conhecer a si mesmo e a prepará-lo para agir na sociedade profana, como modelo e como um agente de ação.
No mundo profano, entretanto, a imaginação corre solta sobre o que acontece nas reuniões da Maçonaria. Especula-se sobre todo o tipo de fantasia. Para uns, aqui praticamos rituais satânicos; para outros, articulamos complôs e aconchavos secretos ou maquinamos planos maquiavélicos para exercermos o domínio e manobrarmos a sociedade profana.
Contudo, buscamos aqui, além da prática da fraternidade, um conhecimento maior, que dificilmente conseguiríamos alcançar no mundo profano.
E este conhecimento, que nos é facultado através da filosofia maçônica, está além do conhecimento científico oficial, além do saber puramente acadêmico, cultural, filosófico ou empírico, que está estruturado nos cânones formais e universais. O conhecimento maçônico é, pois, mais profundo e amplo. Baseia-se na sabedoria acumulada pela Humanidade ao longo dos séculos e no espírito livre do homem.
Acredito que é o que todos nós esperávamos ao ingressar na Ordem. É, pois, o que deveria tornar o maçom um homem especial e diferente.
Porém, precisamos refletir seriamente sobre tudo isso, sem passionalismo ou surtos de personalidade, pois que parece não ser exatamente esta a realidade que vivenciamos nas nossas Lojas. Aliás, o problema é muito mais sério e preocupante.
Mas, o que se constata? Sem querermos assumir o papel de crítico ferino ou dono da verdade, podemos afirmar que a maioria dos maçons pouco lê ou estuda sobre a Ordem, sobre sua história, sua ritualística, seu simbolismo, sua filosofia, suas leis e regulamentos.
Juntamos a essas observações a constatação de que em muitos de nós não existe patriotismo nem interesse na participação do processo social e na ação que a Maçonaria poderia exercer junto à sociedade e à Nação.
É comum um irmão Aprendiz ou Companheiro, ao fazer uma indagação mais profunda a um Mestre, ficar sem resposta ou ser advertido de que saberá o que pergunta quando alcançar este ou aquele grau.
Poucos de nós entendem com profundidade os símbolos que ornamentam nossas Lojas. Pouco de nós não sabem sequer distinguir as jóias dos cargos em Loja!
Muitos de nós recebemos “aumento de salário” sem entender o significado disso, sem saber o “porque”, sem se preocupar em estudar e conhecer o grau alcançado.
Alguém pode lembrar que a busca do conhecimento, na Maçonaria, depende do interesse de cada um, é algo individual, pessoal e intransferível. Afinal, não há muito tempo disponível nas sessões regulares e todos são muitos ocupados com suas próprias vidas. Aos interessados, dizem que existem inúmeros livros disponíveis onde encontrar as respostas.
Seria esta uma explicação plausível para nossas expectativas? Principalmente para um Mestre Maçom, teria ele, na prática, atingido um estado de auto-perfeição e auto-suficiência para seguir por isso?
Sinceramente, não creio que para a maioria de nós aconteça isso. As exceções, infelizmente, são raras.
O que observamos, com certa apreensão e desalento, é um esvaziamento das Lojas, por desmotivação.
Nas sessões, que em geral duram de duas a três horas, no máximo, só é reservado no máximo, dez a quinze minutos para Instrução ou Estudos, quando há[1].
É refletindo sobre tudo isso, que entendo que o momento mais importante numa sessão é o TEMPO DE ESTUDOS ou INSTRUÇÃO. É o momento que realmente se espera para aprender algo novo ou conhecer um assunto relevante sob um novo ângulo. Não é necessário ser estritamente um assunto rigorosamente maçônico.
Entretanto, é o momento em que muitos bocejam ou dormem a sono largo. Pior se o irmão apresentar um trabalho longo. Percebe-se logo um desagrado no ar. Ora, muitos temas perdem a essência, ficam superficiais sintetizados ou condensados demais. Fica-se assim, tolhido a regras que limitam a criação e o estímulo intelectual.
Existe, queiramos ou não admitir, uma implícita “pressão” para que a sessão termine logo, de maneira que haja mais tempo para lá, no salão de banquetes ou num barzinho mais próximo, “batermos papos”; enchendo nossos canhões com pólvora amarela[2] e atirarmos um canhonaço, e nos deliciarmos com materiais que mastigamos com prazer.
Não sou contra, nem critico estes momentos de lazer e descontração. Em absoluto e que fique bem claro este ponto.
Muito pelo contrário, acredito que é um momento em que nossa fraternidade se consolida e nossos laços se estreitam ainda mais.
Contudo, precisamos refletir seriamente sobre nossas sessões. Será que não pecamos pelo excesso de assuntos administrativos ou burocráticos, tão repetitivos e muitas vezes tão cansativos?
Relegamos à insignificância o mais interessante, o novo, o diferente, que corresponde a cada trabalho ou traçado arquitetônico apresentado no Quarto de Hora para Instrução.
Felizmente, pelo menos para os irmãos Aprendizes e Companheiros, há uma compensação. Em algumas Lojas existem alguns Mestres, abnegados, que sacrificam uma noite a mais da semana para ajudá-los[3].
O mundo moderno exige homens cada vez mais preparados e informados. E o verdadeiro maçom tem que ser forjado como um livre-pensador, num constante exercício da liberdade.
No mundo maçônico, as possibilidades são enormes e muitas vezes não sabemos aproveitar este privilégio, o que não encontramos em outros lugares.
No mundo maçônico podemos estudar, pesquisar, debater inúmeros assuntos que são relegados nas academias e universidades. Podemos no mundo maçônico, sem receio da censura, do “patrulhamento” ou da arrogância das cátedras e das mentes fechadas, debater e estudar o que quisermos.
Já foi ratificado que a Maçonaria se constitui num verdadeiro centro de estudos e de saber acumulados pela humanidade ao longo dos séculos.
Infelizmente, alguns irmãos se iludem, imaginando que os cargos e as honrarias constituem o poder. E gastam todas as suas energias para perseguí-los, demonstrando uma visão estreita e antimaçônica. Onde está a humildade? Onde está a sabedoria?
Quando falamos que a Maçonaria é um verdadeiro centro de estudos e pesquisas, não estamos afirmando que o maçom deva ser necessariamente um intelectual, um filósofo ou um cientista. Não é isso que objetivam os estudos maçônicos, mas sim algo maior, mais profundo e vital, pois que é através desses estudos que a nossa consciência se ampliará.
E é nesse humilde apelo aos irmãos, no sentido de valorizarem o Quarto de Hora para Instrução[4] e, por extensão, toda e qualquer iniciativa, a fim de que nos proporcione mais conhecimento, na busca da verdade.
Lembremos que, apesar da Maçonaria se prestar a ajudas humanitárias e aos trabalhos sociais, ela não é um clube de serviços. É uma sociedade reservada Iniciática antes de tudo e tem um finalidade muito maior, que não raro muitos maçons nem chegam a vislumbrar.
Tudo isso pode parecer uma opinião desmensurada, exagerada ou prepotente, mas que sirva ao menos para refletirmos sobre o que realmente esperamos da Maçonaria. Ou então continuaremos nos nossos pequenos mundos, na mesquinha existência e ignorância dos comuns mortais e na reprodução das mesmices do mundo profano.
Neste caso não seríamos os dignos depositários de uma tradição secular e nem da memória dos nossos irmãos do passado. E isso, certamente, seria um triste fim de nossa Ordem.
Que o Grande Arquiteto do Universo vos ilumine e reforce nossas motivações para realizarmos nossos trabalhos com justeza e perfeição, de modo que a Luz da Maçonaria jamais se apague.
COMETÁRIOS:
[1] – Na ARLS Cavaleiros do Sol nº 42 – GLMEPB, é obrigatório a ralização de sessão de Instrução, além das preleções normais;
[2] – No linguajar maçônico “canhão” é copo. E “pólvora amarela” é cerveja;
[3] – Deveríamos nós, em cada Potência Maçônica, interceder junto as autoridades maçônicas constituídas, para efetivar o Encontro Distrital de Aprendizes e Companheiros, podendo ser esse encontro, bimestral, trimestral ou semestral, fazendo-o como prova para galgar aos respectivos graus pleiteados, dando com isto, uma oportunidade ímpar para a formação e aperfeiçoamento respectivamente do Aprendiz e do Companheiro, com as novas gerações de irmãos, vibrando e vivendo a Maçonaria;
[4] – Depende do Rito. No Rito de Emulação é denominado de Preleções e/ou Loja de Instrução. Já no Rito Escocês Antigo e Aceito é denominado de Quarto de Hora para Instrução.
Parabéns belíssimo trabalho e coberto das mais puras verdades. Um grande tfT.
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