José Filardo, M∴ I∴
Vimos recentemente na TV GOB as entrevistas dos Grãos Mestres Estaduais relativas aos problemas de crescimento e de encolhimento da Ordem nos diferentes orientes da federação.
Pudemos notar, a partir das entrevistas, que o maior problema, ou seja, o abandono da Ordem é provocado por reversão de expectativas.
Cabe aqui uma digressão histórica que se refere especificamente à Maçonaria Brasileira e não à Maçonaria enquanto instituição.
A Ordem surge no Brasil com DNA francês e em um fervilhante momento político crucial para o futuro da colônia. A consequência imediata foi o seu envolvimento nos acontecimentos que levaram à emancipação do Brasil. Posteriormente, a sua história se confunde com a história do Brasil até pelo menos 1925, quando disputas internas provocam uma cisão da qual ela jamais se recuperaria. Isso, aliado à ação deletéria dos esbirros de Getúlio Vargas (que fechou as lojas e infiltrou as fileiras da Ordem) e uma segunda cisão na década de 70 provocaram a debandada dos poucos irmãos que ainda nutriam veleidades políticas.
Aqueles que sobraram, preferiram refugiar-se no escuro da loja e insistir comodamente em que não se discute política ou religião em loja, algo que não fazia parte da tradição maçônica brasileira. Passou a ser mais importante conduzir ritualisticamente a sessão, do que atuar na sociedade a exemplo dos nossos antepassados.
Mas, essa evolução histórica produziu uma situação esquizofrênica. Ora, a imagem pública da Maçonaria no Brasil é aquela representada pela presença marcante da instituição nos acontecimentos políticos e sociais mais importantes da história pátria. A consequência imediata disso é que a expectativa dos candidatos (uma vez que se preservou a cultura do segredo) é encontrar um grupo político aguerrido, voltado para a transformação da sociedade. A realidade, contudo, é diametralmente oposta. As lojas desenvolveram uma cultura conservadora, reacionária e retrógrada. A alienação é a norma. O imobilismo a consequência.
Some-se a isso, a tendência natural de acomodação e a falta de estudo sério da nossa história.
Estão colocadas todas as condições para o desastre.
Mais um dado vem complicar ainda mais as coisas no caso específico do Grande Oriente do Brasil: diferentemente da matriz inglesa, o GOB abriga em seu seio sete ritos diferentes: REAA, Moderno, Brasileiro, Emulação ou York, Adhoniramita, Schroeder e Escocês Retificado. Se por um lado é louvável a liberdade proporcionada pela instituição, por outro lado, ela se transforma em um balaio de gatos, onde cada rito puxa a brasa para sua sardinha, recusa-se a transigir e busca seu próprio crescimento sem considerar o interesse do conjunto. Rivalidades vêm à tona, traduzidas em disputas políticas e jogos de poder. Isso tudo complica a busca de uma solução para os problemas do encolhimento do número de obreiros, mas diríamos que nem tudo está perdido.
Naturalmente, uma solução exigiria mão firme dos Grãos Mestres Estaduais e do Grão Mestre Geral, assim como alterações conceituais nos processos de recrutamento.
A primeira alteração seria transformar o processo de recrutamento. Seria recomendado às lojas uma posição proativa na sociedade, detectando potenciais membros e buscando envolve-lo e descobrir se eles não têm interesse em juntar-se a nós. Isso caberia aos membros das lojas, nos mesmos moldes atuais.
O Grande Oriente produziria um material “didático” que permitisse às lojas conduzir seminários explicando a natureza da Ordem e de cada rito (considerando que existem diferentes ritos em algumas cidades maiores) no caso de múltiplos candidatos, matéria esse que seria entregue ao(s) candidato(s). Somente depois desse seminário ou esclarecimento sobre TODOS OS RITOS, o candidato preencheria um formulário com os seus dados manifestando seu interesse por um determinado rito.
Também é urgente e necessário mudar a mentalidade dos padrinhos. Eles não precisam contar ao candidato como é uma sessão de loja, dar palavras, ensinar toques e palavras, mas também não podem ocultar tudo do candidato. Precisam deixar que o candidato à vontade para escolher (quando possível) o rito que melhor se ajusta à sua personalidade, depois que ele recebe o material “didático” com uma explicação detalhada da natureza de cada rito.
O padrinho não deve “puxar a sardinha” para o seu rito. Ele colherá os dados e os remeterá ao Grande Oriente para que este encaminhe o candidato à loja adequada.
O padrinho também deveria “abrir o jogo” com o candidato, explicando a ele que atualmente a maçonaria está em crise, não tem mais a mesma pujança e espírito que tinha antes de 1927, mas que ela oferece as condições para que o candidato encontre outros maçons com boas intenções e junte-se a eles em ações específicas sobre a sociedade que não envolverão a Maçonaria enquanto instituição. Precisa salientar a importância do networking que a Maçonaria oferece.
Um segundo critério necessário é o critério geográfico, onde o candidato seria encaminhado PELO GRANDE ORIENTE ESTADUAL para iniciação na loja mais próxima de sua residência, no rito escolhido por ele. Isso facilita a vida do candidato nas grandes cidades e favorece o comparecimento à sessão.
Essas providências cobririam a questão da reversão de expectativa, uma vez que o candidato receberia todas as informações ANTES DE ENTRAR na instituição.
A segunda ordem de problema – o abandono por parte de companheiros e mestres – é um pouco mais complicado, embora também esteja ligado a uma reversão de expectativa.
Na Maçonaria, por seu sistema de progressão, o irmão está sempre esperando que no próximo grau as coisas mudem. Até chegar lá. Aí descobre que nada muda, se a loja é, por sua própria natureza, alienada ou entropizada. Se a loja se resume a ler atas, cumprir o ritual e comer pizza, chegará um momento em que o maçom bem intencionado se cansará e deixará a Ordem.
É preciso revisar as proibições de discussão política em loja, visto que o brasileiro cada vez mais participa da vida social e precisa desse exercício. O que se tem a evitar é a política partidária, mas as grandes questões políticas precisam ser abordadas, sob pena de se ter sessões desinteressantes, maçantes e vazias.
As lojas precisam ter, NO MÍNIMO, ações beneficentes que mobilizem toda a comunidade da loja, envolva as cunhadas e os sobrinhos e crie um senso de confraternização, de participação na sociedade. Os irmãos precisam ter ALGUMA COISA A FAZER JUNTOS que não seja limitar-se a ler o ritual e comer pizza.
A visitação de lojas precisa ser incentivada para que o maçom adquira a consciência de que faz parte de uma rede poderosa que pode ser instrumentalizada. Precisa cultivar o networking que a visitação proporciona.
Essas providências podem não ser a resposta completa, mas pelo menos iniciaríamos uma ação voltada para a reversão da tendência atual.
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