DIREITOS E DEVERES DO MAÇOM
Charlles Cabral
ARLS Acácia do Rio Branco nº 35
Or∴ de Santo Antônio do Leverger - MT
I - CONSIDERAÇÕES PRÉVIAS SOBRE O DIREITO
Antes de adentrar na matéria específica, se faz necessário tecer algumas considerações prévias sobre Direito. Em primeiro lugar busca-se conceituar o objeto cujo estudo se inicia e, em se tratando do direito, essa tarefa não é nada fácil. Segundo o Dicionário Aurélio, Direito é o que é justo, conforme a lei; o conjunto das normas jurídicas vigentes num país. À primeira vista parece uma definição bastante razoável, mas se aprofundarmos nossa investigação, veremos que nem todas as situações oriundas das relações humanas podem ser aí alocadas, pois, mesmo no Brasil, que abriga uma enorme quantidade leis em seu ordenamento jurídico, elas não são capazes de estabelecer diretrizes para cada ação ou conduta humana. E há, também, muita divergência entre os juristas quanto à conceituação do direito. Trata-se, ainda, de um vocábulo empregado, ora de forma objetiva, para designar o ordenamento da estrutura social, ora subjetivamente, para indicar o poder de agir garantido legalmente. E com este vocábulo fazemos referência tanto ao Direito Positivo quanto ao Direito Natural. Portanto, devemos dar tantas definições quantos sejam os sentidos da palavra direito.
Paulo Nader, na obra, Introdução ao Estudo do Direito, classifica as Definições em Nominais, que se subdividem em Etimológicas e Semânticas, e Definições Reais ou Lógicas. Etimologicamente, a palavra Direito origina-se do adjetivo latinodirectus, a, um (qualidade do que está conforme a reta; o que não tem inclinação, desvio ou curvatura). Pela definição lógica, Direito é“um conjunto de normas de conduta social, imposto coercitivamente pelo Estado, para a realização da segurança, segundo os critérios de justiça”. O Direito Natural é o intrínseco sentimento de justiça que é inato no homem. Segundo Paulo Nader “O raciocínio que nos conduz à idéia do Direito Natural parte do pressuposto de que todo ser é dotado de uma natureza e de um fim. A Natureza, ou seja, as propriedades que compõem o ser, definem o fim a que este tende a realizar. Para que as potências ativas do homem se transformem em ato e com isto ele desenvolva, com inteligência, o seu papel na ordem geral das coisas, é indispensável que a sociedade se organize com mecanismos de proteção à natureza humana. Esta se revela, assim, como a grande condicionante do Direito Positivo”. Já o Direito Positivo é o conjunto das normas sistematizadas e escritas.
Por deveres, entende-se obrigações que são exigidas em uma relação entre duas partes, onde uma conduta esperada de uma parte, corresponde a um direito da outra, logo, um dever também é um direito, só que do lado oposto da relação.
Desta forma, os Direitos e Deveres do Maçom se constituem nas diretrizes que o conduzem à finalidade da maçonaria e, ainda, o conjunto de normas que fornecem as condições para que ele percorra de forma segura e organizada o seu caminho, em harmonia com os demais Irmãos e com a Ordem, de forma a garantir a realização do seu objetivo, que é o melhoramento moral e espiritual próprio e da humanidade como um todo.
Uma vez alinhavadas essas breves considerações sobre Direito, passemos agora a analisar a fonte dos direitos e deveres dos Maçons.
II - A DOUTRINA MAÇÔNICA
Por Doutrina, entende-se: ensino, educação.
A Doutrina da Maçonaria é a fonte dos Direitos e Deveres do Maçom.
O conteúdo da Doutrina da Maçonaria é composto por Doutrinas Morais, Religiosas e Filosóficas.
Aurélio Buarque de Holanda define assim a palavra Doutrina: “Conjunto de princípios que servem de base a um sistema Religioso, Político, Filosófico, Científico, etc”.
A Doutrina Maçônica tem origem na tradição contida nos documentos dos Maçons Operativos da Idade Média. Em 1356 um Código de Regulamentos Maçônicos surgiu em Londres. Em 1390 surge um poema, chamado Poema Regius, que detalha a criação de um ofício especializado a ser realizado por artífices construtores chamados Maçons. Outro documento, conhecido como Manuscrito de Cook, do século XV, estabelece a primeira ligação entre os Maçons e a construção do Templo de Salomão. Por volta do século XVI começaram a surgir as primeiras referências a uma Maçonaria especulativa, com admissão de leigos nos quadros da Loja de Edimburgo. No século XVIII as atribuições dos Maçons operativos foram sintetizadas numa Constituição, por James Anderson, um Maçom inglês, e para regulamentar o funcionamento das Lojas, estabeleceram-se os chamados Landmarks que, em Maçonaria, refere-se a regras imutáveis que norteiam a existência da Ordem.
Os Landmarks são considerados uma Constituição consuetudinária, ou seja, não escrita, e pairam controvérsias a respeito das suas definições e nomenclaturas. Existem várias compilações, sendo a de Albert Gallatin Mackey a que teve mais sucesso. As Potências Maçônicas latino-americanas, de um modo geral, adotam a classificação de 25 Landmarks compilados por Mackey. Dentre os Landmarks de Mackey, estão abaixo transcritos os que mais me pareceram oportunos em função do tema deste trabalho, não obstante os outros serem tão importantes quanto estes:
13. Direito de recurso de cada Maçom das decisões de seus Irmãos, em Loja, para a Grande Loja ou Assembléia Geral dos Irmãos é um Landmak essencial para a preservação da Justiça e para prevenir a opressão.
14. Direito de todo Maçom visitar e tomar assento em qualquer loja é um inquestionável Landmark da Ordem. È o consagrado direito de visitar, que sempre foi reconhecido como um direito inerente que todo Irmão exerce, quando viaja pelo Universo. É a conseqüência de encarar as Lojas como meras divisões por conveniência da Família Maçônica Universal.
22. Todos os Maçons são absolutamente iguais dentro da Loja, sem distinções de prerrogativas profanas, de privilégios que a sociedade confere. A maçonaria a todos nivela nas reuniões maçônicas.
III - OS DEVERES DOS MAÇONS
Quando da iniciação de um profano nos mistérios da Maçonaria, antes de ser recebido Maçom, e para que não seja forçado a se comprometer com obrigações que não conhece, é-lhe explicado a natureza dos deveres a que ele estará sujeito: “o primeiro é um silêncio absoluto acerca de tudo quanto ouvirdes e descobrirdes entre nós, bem como de tudo quanto para o futuro chegueis a ouvir, ver ou saber. O segundo dos vossos deveres, e o que faz que a Maçonaria seja o mais sagrado dos bens, além de ser a mais nobre e a mais respeitável das instituições, é o de vencer as paixões ignóbeis que desonram o homem e o tornam desgraçado; a prática constante da beneficência, socorrer aos seus irmãos, prevenir as suas necessidades, minorar os seus infortúnios, assisti-los com os seus conselhos e as suas luzes. O que em um profano seria uma qualidade rara, não passa no Maçom do cumprimento de seus deveres. Toda ocasião que ele perde de ser útil é uma infidelidade; todo socorro que recusa é um perjúrio; e se a terna e consoladora amizade também tem culto nos nossos Templos, não é apenas por ser um sentimento, mas sim por um dever que pode tornar-se em virtude. O terceiro dos nossos deveres e a cujo cumprimento só ficareis obrigado depois da vossa iniciação, é o de conformar-vos em tudo com as nossas leis e de submeter-vos ao que vos for determinado em nome da associação, em cujo seio desejais ser admitido.”
Ainda são exigidos ao candidato outros deveres, que devem ser praticados por todos os homens de bem: “Ao Ente Supremo deveis todo amor e respeito. Ao vosso próximo deveis toda amizade e dedicação, e nunca façais aquilo que não desejardes que vos seja feito. Deveis beneficiá-lo e socorrê-lo em suas necessidades e ajudá-lo nas emergências em que se achar. Para convosco, deveis evitar toda irregularidade e intemperança que possa fazer destruir ou menoscabar o conceito que deve possuir todo homem de bem.” (Ritual do Aprendiz Maçom - GOEMT).
Ciente desses deveres, o candidato, ao concordar com eles, presta juramento. Estão eles contidos nos princípios do Direito Natural, pois fazem parte do sentimento de justiça próprio da natureza do homem.
A CONSTITUIÇÃO DO GRANDE ORIENTE DO ESTADO DE MATO GROSSO prescreve no segundo capítulo:
Art. 8º (id. Art. 29 da Constituição do GOB). São deveres do maçom:
I – obedecer à lei e aos poderes maçônicos constituídos;
II – freqüentar assiduamente os trabalhos das Lojas e Órgãos, aceitando e desempenhando, com probidade e zelo, as funções e os encargos maçônicos que lhe forem confiados;
Do meu ponto de vista, o cumprimento deste dever reflete o compromisso com que o Maçom está investido dentro da Ordem, e sem o qual não pode ser considerado um verdadeiro maçom.
III – satisfazer com pontualidade as contribuições pecuniárias que, ordinária ou extraordinariamente, lhe forem legalmente atribuídas;
A Maçonaria é uma entidade sem fins lucrativos, o que não quer dizer que não existam custos e despesas com a manutenção do Templo e funcionamento das Lojas. Obviamente que há de vir dos próprios Irmãos as garantias pecuniárias correspondentes.
IV – reconhecer como irmãos todos os maçons regulares, dando-lhes ajuda e proteção em quaisquer circunstâncias e defendendo-os, com o risco da própria vida, contra a injustiça;
V – prestar todo o auxílio que puder às viúvas, irmãs solteiras, ascendentes e descendentes que dele necessitarem;
VI – nada imprimir, nem publicar, na imprensa profana, sobre assunto que envolva o nome do Grande Oriente do Estado de Mato Grosso, sem expressa autorização da autoridade que o represente;
VII – não falar a estranhos sobre os assuntos maçônicos de caráter reservado,
Além de trair o juramento e passar aos profanos informações de caráter reservado, a publicação de matérias de interesse da Ordem, podem comprometer o nome da instituição e causar prejuízos à imagem da Maçonaria. E mais, pode inclusive, causar falso juízo sobre o caráter de todos os irmãos, pelo que apenas um tornou público.
VIII – manter sempre, no mundo profano, conduta digna e honesta, praticando o bem e a tolerância, subordinando-se às leis, aos costumes e aos poderes constituídos do país.
Eu diria que essa postura reflete a imagem da Maçonaria no mundo profano. È pelos seus representantes que o homem comum julgará toda a Instituição.
Parágrafo único – A investidura do maçom em mandato de representação popular ou cargo público acentua-lhe o dever de pugnar pelos princípios e ideais da Instituição.
Estes são preceitos oriundos do Direito Positivo, e são da mesma natureza daqueles sobre os quais se prestou juramento.
IV - OS DIREITOS DOS MAÇONS
Art. 9º. São direitos do maçom:
I – a igualdade perante a lei;
Este é um dos princípios dos Direitos Humanos. É o que justifica a qualidade de irmãos, de pertencermos todos à mesma espécie.
II – a livre manifestação do pensamento nos meios maçônicos, sem dependência de autorização, respondendo, cada um, nos casos e na forma que a lei declarar, pelos abusos que cometer;
Liberdade implica em responsabilidade. Discordar é justo, mas há de se observar cuidadosamente a forma os fundamentos dos argumentos com os quais se utiliza para exercer esse direito. É utilizando-se da Régua de 24 polegadas, ou seja, medindo e meditando sobre as palavras, que se critica sem ofender ou difamar. A crítica pode ser construtiva, mas também pode ser devastadora.
III – a inviolabilidade da liberdade de consciência e de crença;
O que há de mais sagrado para o ser humano é a sua fé. E esse preceito faz com que se possa confiar na idoneidade dos princípios da Ordem, o que considero extremamente necessário nos primeiros passos dentro da Maçonaria.
IV – a justa proteção moral e material para si e seus parentes, até o segundo grau civil;
V – passar de uma para outra Loja filiada ao Grande Oriente do Estado de Mato Grosso, observando o que dispuser o Regulamento Geral;
VI – pertencer, como efetivo, a mais de uma Loja, na forma estabelecida no Regulamento Geral;
VII – não ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei;
VIII – ter assegurada, quando acusado, plena defesa, por todos os meios e recursos;
IX – não lhe ser exigido ou aumentado nenhum tributo, sem que a lei o estabeleça em exercício anterior;
X – ter assegurado:
a) a ciência dos despachos, documentos e informações em processos de seu interesse;
b) a expedição de certidões requeridas para defesa de direitos, salvo se o interesse da Ordem ou da Instituição impuser sigilo;
c) o direito de representar, mediante petição, aos poderes competentes, contra abusos de autoridades maçônicas, a fim de promover sua responsabilidade.
XI – ser parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio da Instituição;
XII – ser isento da freqüência quando emérito ou remido.
Parágrafo 1º. A lei não pode excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual ou coletivo.
Parágrafo 2º. A lei penal regulará a individualização da pena e só retroagirá quando beneficiar o réu.
Parágrafo 3º. Não há crime sem lei anterior que o defina; não há pena sem prévia cominação legal.
Parágrafo 4º. A lei maçônica não prejudicará o direito adquirido, a coisa julgada e o ato jurídico perfeito.
Parágrafo 5º. Os direitos individuais equiparam-se aos que a Constituição Política do Brasil reconhece e garante a todos os cidadãos.
Os parágrafos acima são, por analogia, compilações oriundas do Direito profano, e a esse respeito, leciona o Irmão José Wilson Ferreira Sobrinho:
“Todas as realidade expostas, relativas ao Direito Profano, certamente podem ser transportadas para o Direito Maçônico na medida em que ele também tem por localização ôntica a região objetal conhecida como objeto cultural (...) tem-se, portanto, que o Direito Maçônico não difere do Direito Profano naquilo que diz com sua angulação filosófica. É dizer: trata-se de um objeto cultural que regula um momento da vida em sociedade, ou seja, o momento da vida maçônica...” (FERREIRA SOBRINHO, José Wilson, Legislação Maçônica, Ed. A TROLHA, 2002.)
Para finalizar, fica a reflexão de Oswald Wirth sobre as leis e o ordenamento associativo: “... a submissão à lei impõe-se a quem aceita viver, já que a vida de todo ser está subordinada a um modo mais extenso de existência. Toda autonomia vital é um microcosmos, e portanto, uma ordem participando de uma coordenação mais geral. Aquele que pretende bem viver deve aplicar-se a vibrar de acordo com o rítimo da harmonia ambiente.
As leis arbitrárias que formulam os homens, os regulamentos que se impõem a fim de coordenar a sua atividade jamais serão para o Iniciado objeto de desprezo, embora só a lei da vida tenha perante os seus olhos um caráter plenamente sagrado.
Há de dar sempre exemplo da disciplina, ainda que não lhe escape a imperfeição das regras impostas. Sem acordo, nenhuma vida é possível; o estado de desordem marca a passagem de uma ordem defeituosa a uma melhor coordenação. Por sua influência, os Iniciados apressam a reconstituição da ordem perturbada, já que têm horror da doença à qual corresponde toda desordem.” (Citado por Nicola Aslan, em Comentários ao Ritual de Aprendiz)
Bibliografia:
CONSTITUIÇÃO E REGULAMENTO GERAL – GOEMT
RITUAL DO APRENDIZ-MAÇOM – R:. E:. A:. A:. – GOEMT
ASLAN, Nicola, Comentários ao Ritual de Aprendiz – Vadimecum Iniciático. 3.ed. Londrina: Ed. Maçônica “A TROLHA”, 2006.
FERREIRA SOBRINHO, José Wilson. Legislação Maçônica. 1ª. ed. Londrina: Ed. Maçônica “A TROLHA”, 2002.
BAÇAN, Lourivaldo Peres. O Livro Secreto da Maçonaria. São Paulo: Universo dos Livros, 2008.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito. 21. Ed. Rio
Fonte: http://goeam.com.br
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