José Maurício Guimarães
Tautologia significa “dizer a mesma coisa”, uma locução não informativa que, com a aparente intenção de definir ou ilustrar um conceito, afirma no <Predicado> o que está compreendido no <Sujeito>. Em Lógica (parte da Filosofia considerada a ciência do raciocínio, que trata das operações intelectuais e do pensamento), <Sujeito> é a locução que designa um elemento singular; e <Predicado>, um conceito universal que possa ser atribuído a qualquer ser concreto ou várias extensões de uma espécie. Talvez pareça complicado ou pedante de minha parte escrever assim, mas tenho certeza que meus leitores entenderão. Acontece que não fui buscar definições no google nem na wikipedia; em se tratando da essência do Conhecimento, cuido de não me instruir na internet. As explicações acima constam do “Dicionário de Filosofia” de Nicola Abbagnano, da Universidade de Nápoles − filósofo, escritor e professor falecido em 1990.
Essa parte da Lógica parece difícil, mas não é; eu poderia “trocar em miúdos”, mas isso seria desconsiderar a inteligência e a cultura dos meus leitores. Felizmente, para simplificar, o próprio Abbagnano prossegue na obra citada: “... Nesse sentido, tautologia é, por exemplo, a seguinte afirmação: ‘Triângulo é uma figura geométrica com três ângulos’; por conseguinte, a afirmação de uma tautologia é sentida como o enunciado de algo óbvio”. (1)
A massificação da maçonaria virou moda nos últimos 10 anos, nivelando por baixo os conceitos mais elevados da Arte Real. Na falta de projetos sólidos, exequíveis e permanentes, as instituições lançam mão das ilusórias aparências de poder, enquanto muitos sonham acordados de que temos influência sobre os destinos da sociedade. Na prática, valorizam-se os aspectos externos na vã esperança de que supostas prerrogativas motivem as pessoas; ou que a pompa dos cargos sejam reconhecidas e reverenciadas neste mundo de angústias, incertezas e conflitos. Para exemplificar, haja vista nossa imobilidade e perplexidade diante da crise atual que também pegou o mundo profano, os sábios, cientistas, religiosos e iniciados “com as calças na mão”.
A massificação e vulgarização das artes, das ciências e da filosofia criou, principalmente na internet, uma falsa impressão de que “todo mundo sabe tudo”: qualquer pessoa pode falar sobre o que quiser, tenha ou não estudo acadêmico ou conhecimento técnico para tanto; opina-se, através da telinha dos celulares, sobre Direito e Medicina, sobre os trâmites legais, sentenças, acórdãos e mesmo sobre medicamentos ou terapias a serem ministrados diante de uma pandemia, com a mesma cara-de-pau com que se opina sobre a escalação de um zagueiro num time de várzea.
Todo mundo sabe tudo – inclusive "sobre maçonaria" – seja o palpiteiro iniciado na Ordem, ou não. Por exemplo: nessa Páscoa, recebi uma dezena de mensagens abordando as cerimônias do Grau 18 ("Cavaleiro Rosacruz"), postadas por Aprendizes, Companheiros e Mestres recém-exaltados no Grau III. Daí, vocês podem imaginar o pandemônio em que se tem transformado a "maçonaria-digital” dos whatsapp, facebook, blogs, instagram e em ALGUNS grupos de discussão.
Vivemos TAUTOLOGIAS, conjuntos de palavras, "nada mais que palavras“, desinformações com aparente intenção de ensinar, cujos letrados patinam no escorregadio pântano das opiniões pessoais, achismos que dizem combater, irrelevâncias e o óbvio.
Recentemente, um tolo bastante conhecido veio a público afirmar que certo atentado político, que abalou a nação, foi uma farsa criada pela maçonaria em conluio com determinado líder religioso. Paspalhices dessa monta circulam também em nosso meio, entre os “iniciados” nos augustos mistérios da “pura maçonaria”. Como não há estudo sério e poucos são os que consultam fontes (livros) de autores mundialmente reconhecidos, qualquer aventureiro pode dizer o que bem entende, pois em nossas fileiras não há quem os conteste pelo argumento.
“Maçons, alerta!, tende firmeza!” – diz a letra daquele hino maçônico.
Vivemos um tempo em que A EXTREMA LIBERDADE É TRANSFORMADA EM EXTREMA IRRELEVÂNCIA.
Movidos por intenções canhestras, “novas maçonarias” surgem do nada ministrando tautologias como, por exemplo:
“Compasso, em maçonaria, é um instrumento composto de duas hastes unidas por uma articulação móvel, que serve para traçar círculos”;
“Maço é a ferramenta, de madeira ou ferro, munida de cabo, que os pedreiros usam para bater, quebrar e entalhar pedras”;
“Coluna é um suporte vertical usado como como elemento de sustentação para as partes elevadas de um edifício”;
“Lewis é um apetrecho com encaixe e argola que os antigos pedreiros usavam, por fulcro e pivô, para erguer pedras enormes”...
... e outras preciosidades tão enormes quanto as tais pedras erguidas mediante lewis.
A extrema liberdade rebaixada à extrema irrelevância produz tais monstrengos; ignoram que as ferramentas simbólicas da maçonaria servem para provocar uma reflexão nos iniciados, e não para explicar o trabalho dos pedreiros de hoje ou da Idade Média.
A maçonaria é “um sistema de Moral, velado por alegorias e ilustrado por símbolos” – ouvimos essa instrução um trilhão de vezes nas Lojas; lemos isso um bilhão de vezes nos livros... e os neo-sábios vêm “explicar”, tautologicamente, o que é uma ferramenta num canteiro-de-obras. Explicações como essas (“compasso é um instrumento composto que serve para traçar círculos”) são plenamente sabidas por qualquer criança do ensino fundamental, entre os 6 e 14 anos de idade.
As alegorias e símbolos são VELADOS para que cada maçom cresça por si mesmo, REFLITA por si mesmo como fez na Câmara das REFLEXÕES, e desperte para outra realidade de vida. As alegorias e símbolos não foram colocados nos Templos e Rituais para que os gulosos de última hora agarrem seus Irmãos pelas mãos e os conduzam através do espinheiro. São cegos guiando outros cegos.
Portanto,
“... Maçons, alerta!, tende firmeza!,
Nobres intentos não morrem
Vencem do tempo a porfia
Há de os séculos afrontar
A pura Maçonaria.”
(Letra do Hino da Maçonaria, escrita por Otaviano Bastos, com música de Dom Pedro I).
(1) ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia: edição revista e ampliada. 5ª edição. São Paulo: Martins Fontes , 2007.
(Nota): A ilustração que acompanha este artigo, refere-se aos sete maçons belgas que, em 1943, fundaram a Loja “Libertè Chérie” em pleno campo de concentração Hut Emslandlager, na cidade de Esterwegen-Alemanha. Escolhi a imagem para honrar os verdadeiros maçons e a cadeia invisível de união que protege e enobrece a Maçonaria.
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