Rui Bandeira
Em todas as Lojas maçónicas regulares está presente, em todo
ou em parte do solo da sala onde ocorrem as sessões de Loja, um pavimento
mosaico, constituído por um conjunto de quadrados brancos e negros, colocados
alternadamente entre si.
O símbolo remete claramente para a dualidade - mas também
para a harmonia entre os opostos. Cada quadrado de uma das cores está rodeado
de quadrados da outra cor. É assim frequente referir-se ao recém-iniciado que o
pavimento mosaico representa a sucessão entre os dias e as noites, o bem e o
mal, o sono e a vigília, o prazer e a dor, a luz e a obscuridade, a virtude e o
vício, o êxito e o fracasso, etc.. Mas também a matéria e o espírito como
componentes do Homem. Ou, simplesmente, recordar que, como resulta da lapidar
equação de Einstein, a matéria é composta por massa, mas também por energia.
O dualismo provém de antigas tradições humanas. A
civilização suméria dotava os seus templos de piso em pavimento mosaico, que só
podia ser pisado pelo sacerdote no mais alto grau da hierarquia e só em dias de
eventos importantes. Convencionou-se que o Santo dos Santos do Templo de
Salomão teria um pavimento mosaico.
A filosofia pitagórica postulava que o UM se transformava em
DOIS refletindo-se a si próprio e separando-se, original e reflexo, sendo assim
o UM o princípio criador estático e o representando o DOIS a dinâmica da
Criação. A interação entre o UM e o DOIS gerou o TRÊS, a Criação. Esta
resultou, assim, da interação entre o estático e o dinâmico.
De onde resulta que a dualidade é fecunda, que é necessária
a presença da dualidade para haver criação. Mas resulta ainda mais do que isso:
não basta que exista dualidade, tem que haver interação entre os opostos para
que a criação aconteça. Não bastam dois opostos estáticos; é necessário que
esses dois opostos sejam dinâmicos e interajam entre si. Não basta, assim, a
dualidade, é necessária a polaridade.
O pavimento mosaico recorda-nos assim que a vida é feita de
contrastes, de forças opostas que se influenciam entre si, e que é através
dessa influência mútua que ocorre a mudança, o avanço, a evolução. No fundo, a
antiga asserção de que toda a evolução se processa através do confronto entre a
tese a a antítese, daí resultando uma síntese, que passa a constituir uma nova
tese, que se defrontará com outra antítese até se realizar uma nova síntese, que é um novo
recomeço, assim e assim sucessivamente numa perpétua evolução...
Assim sendo, o que tomamos por mal, por desagradável, o que
procuramos evitar, sendo-o assim, não deixa, porém, de ser necessário - pois é
do confronto desse mal com o bem, do que queremos evitar com o que gostaríamos
de conservar, daquilo que nos desagrada com aquilo que nos conforta, que
resulta avanço, mudança, tendencialmente progresso (tendencialmente, porque
nada se deve tomar como garantido: por vezes, a mudança mostra-se
retrocesso...).
Nesse sentido, o bem, por si só é estático e estéril. O bem
só evolui em confronto com o mal. É desse confronto entre ambos que resulta
algo, é esse confronto bipolar que é fecundo. Aliás, em bom rigor, só podemos
definir o bem em confronto com o mal, tal como necessitamos da sombra para bem
apreender o que é a luz... Se Adão permanecesse no Paraíso, ainda hoje Adão
seria Adão e nada mais do que Adão, feliz com sua nudez, mas inapelavelmente
boçal. Foi o mal da expulsão do Paraíso que obrigou Adão a deixar de ser mera
criatura e passar a ser homem; ou seja, a Humanidade só evolui porque sempre
necessitou de se confrontar com o perigo, com a fome, com a necessidade, em
suma, com o mal, e teve de superar todos os sucessivos obstáculos para atingir
sucessivos patamares de bem, de satisfação, sempre confrontada com novos
perigos, obrigando a novas superações. É ao superar os sucessivos obstáculos
com que se depara que o Homem se supera a si mesmo.
O Pavimento Mosaico não é um espaço estático. É um caminho,
com luzes e sombras, com espaços agradáveis e veredas desagradáveis, com
seguranças e perigos. Ficar num quadrado branco e dele não sair não leva a lado
nenhum... É necessário enfrentar a dualidade com que nos deparamos, suportar a
polaridade inerente a tudo o que nos rodeia e, afinal, inerente a nós próprios
e... fazer-nos à vida! Se tomarmos mais opções certas do que erradas, teremos
mais sínteses brancas do que negras e desbravaremos um caminho de avanço. Se ou
quando (porque é quase que inevitável que esse quando, muito ou pouco, cedo ou
tarde, sempre apareça...) enveredamos por opções erradas, acabamos por cair em
sombria síntese e deparar com retrocesso e não com o desejado progresso. Mas
ainda assim, a solução não é ficar onde se foi parar, com receio de novo
retrocesso: é prosseguir com nova síntese, efetuar nova opção, desejavelmente
que se revele boa, para melhor sorte nos caber. E assim, em perpétuo movimento,
em contínua progressão de inesgotáveis sínteses, o homem avança desde a sua
tese inicial até à sua derradeira síntese... que, do outro lado da cortina
descobrirá que não foi um fim, mas apenas um novo recomeço, uma nova tese para,
noutro plano, se confrontar com fecunda antítese...
Um simples pavimento mosaico serve de ponto de partida para
a mais profunda especulação. Basta atentar e meditar e estudar e trabalhar
dentro de si mesmo, juntando a intuição à razão (outra dualidade; ou melhor,
polaridade, de fecunda potencialidade...).
O Pavimento Mosaico, se atentarmos na sua perspetiva dinâmica, recorda sempre ao maçom que o principal do seu trabalho não se efetua na Loja, na execução do ritual, na realização de tarefas de Oficial, na discussão de pontos de vista. O principal do seu trabalho faz-se no confronto de si consigo próprio, no uso frequente e equilibrado das duas grandes ferramentas de que dispõe naturalmente, a sua Razão e a sua Intuição, para trilhar sozinho os seus caminhos (e descobrir que, afinal, encontra frequentemente outros nos cruzamentos a que vai chegando).
Por isso, o maçom deve reservar sempre uma parte do seu dia para efetuar a mais fecunda atividade que pode efetuar: pensar, meditar, especular. Tem as ferramentas. Só precisa de as usar. Dia a dia. E quanto mais as usar e quanto mais frequentemente as usar, mais fácil é esse uso, mais gratificante é o seu trabalho. Também dentro de cada um de nós há um pavimento mosaico, disponível para o percorrermos e nele ir tão longe quanto cada um quiser e puder!
O Pavimento Mosaico, se atentarmos na sua perspetiva dinâmica, recorda sempre ao maçom que o principal do seu trabalho não se efetua na Loja, na execução do ritual, na realização de tarefas de Oficial, na discussão de pontos de vista. O principal do seu trabalho faz-se no confronto de si consigo próprio, no uso frequente e equilibrado das duas grandes ferramentas de que dispõe naturalmente, a sua Razão e a sua Intuição, para trilhar sozinho os seus caminhos (e descobrir que, afinal, encontra frequentemente outros nos cruzamentos a que vai chegando).
Por isso, o maçom deve reservar sempre uma parte do seu dia para efetuar a mais fecunda atividade que pode efetuar: pensar, meditar, especular. Tem as ferramentas. Só precisa de as usar. Dia a dia. E quanto mais as usar e quanto mais frequentemente as usar, mais fácil é esse uso, mais gratificante é o seu trabalho. Também dentro de cada um de nós há um pavimento mosaico, disponível para o percorrermos e nele ir tão longe quanto cada um quiser e puder!
Fonte: A Partir a Pedra
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